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Equador envia militares para Guayaquil após morte de promotor e em meio à guerra contra tráfico

País vive caos após a fuga de Fito, líder da maior facção criminosa do Equador; ação ocorre em meio ao estado de "conflito armado interno"

A onda de violência iniciada há oito dias começou com a fuga de dois dos mais importantes líderes criminosos do país (Rodrigo Buendia/AFP)

A onda de violência iniciada há oito dias começou com a fuga de dois dos mais importantes líderes criminosos do país (Rodrigo Buendia/AFP)

Estadão Conteúdo
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Agência de notícias

Publicado em 18 de janeiro de 2024 às 13h06.

Em meio ao estado de "conflito armado interno", e um dia após o assassinato de um promotor antimáfia, as Forças Armadas equatorianas informaram que centenas de militares e policiais entraram em um presídio do complexo penitenciário de Guayaquil, nesta quinta-feira. O país tem experimentado uma onda de violência após a fuga do criminoso mais perigoso do país, José Adolfo Macías Villamar, o Fito, e posteriormente de Fabricio Colón Pico, membro do Los Lobos, logo nos primeiros dias de janeiro. Guayaquil, a mais atingida pela violência, é o centro da guerra do governo contra as gangues de traficantes de drogas.

As forças de segurança "realizam uma nova intervenção no Centro de Privação de Liberdade #Guayas, controlando o perímetro externo e interno do centro penitenciário", afirmaram as Forças Armadas em sua conta na rede social X (antigo Twitter).

Também em uma publicação no X, a polícia equatoriana informou que a ação tem como objetivo "registrar objetos proibidos e manter o controle no interior do estabelecimento prisional".

Segundo a imprensa local, a operação ocorre no Centro de Reabilitação Social de Guayas, nº 4, também conhecido como Penitenciária Regional. Junto com a Penitenciária do Litoral, são as prisões mais populosas do Equador. São dez mil presos, mais de um quarto da população carcerária do país sul-americano. Repórteres da AFP registram tanques e esquadrões fortemente armados ao redor da prisão.

A operação começou por volta de 06h30 (horário local). Minutos antes, o comandante da Polícia, o general César Zapata, havia comunicado a apreensão de dois homens supostamente implicados no assassinato do promotor Carlos Suárez, que conduzia as investigações do ataque cometido por homens armados ao canal público de televisão TC em 9 de janeiro.

Suárez estava encarregado de determinar qual grupo criminoso estava por trás da ação. Sua morte foi confirmada pela procuradora-geral Diana Salazar em vídeo postado no X (antigo Twitter). "Diante do assassinato do nosso colega César Suárez (...) serei enfática: grupos do crime organizado, criminosos e terroristas não impedirão nosso compromisso com a sociedade equatoriana", disse Salazar.

Na terça-feira, o Exército já havia enviado militares para as unidades penitenciárias, em uma operação que começou no fim da semana passada. Foram libertadas mais de 150 pessoas que permaneciam como reféns, incluindo guardas e pessoal administrativo. Ao menos um funcionário foi morto durante as operações, que foram concluídas sem um banho de sangue generalizado.

As prisões equatorianas

A fuga de Fito fez o mundo colocar os olhos sobre o frágil controle do sistema penitenciário, onde confrontos entre facções já deixaram mais de 460 detentos mortos desde 2021. Foram identificadas sete organizações criminosas que têm poder dentro das prisões, e pelo menos quatro pontos explicam como o sistema terminou sob seu poder e o regime que esses grupos têm imposto dentro — e até fora — delas.

O primeiro deles é a existência de uma aliança entre detentos e alguns policiais. A troca de informação por privilégios nas prisões quebrou códigos da máfia como o de não delatar, o que acirrou ainda mais as rivalidades entre facções. Esses locais também estão rodeados de luxo: suítes, boates, piscinas, galos de briga e até venda de frango assado.

Outro ponto frágil seria a transferência de poder a uma polícia corrupta no controle dos acessos às penitenciárias. Um dos casos mais emblemáticos é o "Metástase", que evidenciou os vínculos entre o narcotraficante Leandro Norero - assassinado em 2022 em uma prisão — com políticos, juízes, policiais, promotores e um ex-diretor do órgão responsável pelas prisões (SNAI).

Superlotação, lentidão da Justiça e, principalmente, a necessidade de vincular-se a uma facção para sobreviver também fazem parte desse conjunto de fatores. Soma-se a isso a militarização de prisões e bairros pobres. Noboa, frequentemente comparado ao presidente de El Salvador, Nayib Bukele, planeja construir de duas prisões de segurança máxima e supermáxima, como as que o líder salvadorenho fez em seu país.

Entenda a crise

A onda de violência iniciada há oito dias começou com a fuga de dois dos mais importantes líderes criminosos do país: Fito, líder de Los Choneros, e de Fabricio Colón Pico, membro do Los Lobos. Seguiu-se uma cadeia de ataques com os quais o crime organizado tentou subjugar as autoridades.

Em um dos eventos mais emblemáticos, homens encapuzados atacaram o canal público TC Televisión, ameaçando jornalistas com armas e explosivos durante uma transmissão ao vivo. O propósito dessa ação é um mistério. Dezena de agressores, jovens, renderam-se assim que a polícia chegou ao local, sem oferecer resistência.

O presidente equatoriano, Daniel Noboa, declarou estado de conflito armado interno, o que implica a suposição de que há uma guerra dentro do país. Foi estabelecido toque de recolher, das 23h às 5h, e o Exército patrulha as ruas. Até terça, segundo dados oficiais, havia mais de 1,5 mil detidos, incluindo 158 acusados ​​de “terrorismo”.

Noboa decretou que as gangues sejam vistas como organizações terroristas, o que agrava as penas e oferece mais margem para as autoridades enfrentá-las. Além disso, foram realizadas 41 operações contra esses grupos, durante as quais morreram cinco supostos criminosos e foram libertadas 27 pessoas sequestradas.

A Presidência equatoriana, em comunicado, assegura que as operações continuarão em todo o território nacional “com um objetivo claro” de ser implacável com aqueles que "assustaram e tiraram vantagem dos cidadãos.”

O Equador foi durante muitos anos um país livre do tráfico de drogas, mas se transformou em um novo bastião do crime para os Estados Unidos e a Europa, com gangues lutando pelo controle do território e unidas em sua guerra contra o Estado, especialmente em Guayaquil.

Nos últimos cinco anos, a taxa de homicídios por 100 mil habitantes passou de 6 para 46 em 2023 e a guerra interna atingiu o fundo do poço como aconteceu na Colômbia no século passado, mas com um ingrediente adicional: queimar prisões.

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