Iêmen: cerca de 85 mil crianças morreram no país desde 2015, diz ONG (Mohamed al-Sayaghi/Reuters)
AFP
Publicado em 21 de novembro de 2018 às 12h44.
O enviado das Nações Unidas Martin Griffiths chegou a Sanaa, nesta quarta-feira (21), para reativar os esforços de paz no Iêmen, onde a batalha para assumir o controle da estratégica cidade portuária de Hodeida ameaça causar uma "fome em massa" - advertem especialistas.
Griffiths não falou com a imprensa em seu desembarque no aeroporto internacional de Sanaa.
Ele deve se reunir com dirigentes da rebelião que controla a capital iemenita para tratar das negociações de paz. O enviado espera conseguir continuar esse diálogo na Suécia em "umas semanas", para pôr fim a uma guerra que já dura mais de três anos e mergulhou o país na pior crise humanitária do mundo.
Nem o programa nem a duração da visita de Griffiths foram divulgados pela ONU, que também não especificou se ele vai, ou não, reunir-se com representantes do governo iemenita.
O Iêmen está praticamente dividido em dois: as forças pró-governo controlam o sul e uma boa parte do centro, enquanto os rebeldes dominam Sanaa, o norte e amplas faixas do oeste.
Para favorecer os esforços de paz, os rebeldes huthis, apoiados pelo Irã, disseram estar dispostos a suspender as hostilidades, se a coalizão liderada por Riad, aliada do governo do presidente Abd Rabbo Mansur Hadi, puser fim a seus ataques.
O governo de Hadi já anunciou sua participação nas negociações de paz, mas a data ainda não foi marcada.
Em Hodeida, crucial para o fornecimento de ajuda humanitária, houve, porém, uma segunda noite de combates entre os rebeldes huthis, que controlam a cidade e seu porto, e as forças pró-governo.
Depois de um dia de relativa calma ontem, explodiram violentos confrontos à noite nos bairros do sul e do leste da cidade, segundo um correspondente da AFP e vários moradores.
Na noite anterior, os combates, os mais violentos desde que a tensão se reduziu em 14 de novembro, concentraram-se no leste.
Hodeida, por onde passam três quartos da ajuda humanitária do país, é um ponto-chave deste conflito que já deixou cerca de 10.000 mortos e levou 14 milhões de pessoas a viverem com fome, segundo a ONU.
O Conselho de Segurança da ONU tem de se pronunciar, em uma data ainda a ser definida, sobre um projeto de resolução apresentado pela Grã-Bretanha para reivindicar uma trégua imediata na cidade.
Em um estudo publicado nesta quarta, o International Crisis Group (ICG) considerou que a comunidade internacional se encontra frente a um "grave" dilema em Hodeida.
"A eleição é difícil, mas simples: impedir uma batalha destruidora para Hodeida, ou assumir uma parte da responsabilidade, por inação, em uma fome em massa" no Iêmen, afirmam os autores do informe.
Estes especialistas destacam a determinação dos rebeldes para manter o controle da cidade, para onde enviaram as temidas tropas "Kataeb al-Mawt" (os "Batalhões da Morte"), assim como a fraqueza das forças pró-governo.
"Para os huthis, perder este porto seria um importante golpe, mas podem sobreviver, pelo menos por enquanto", considera o International Crisis Group.
Mas, "para a população, já à beira da fome, isso representaria algo pior, visto que novas perturbações no fornecimento de produtos de base podem ser catastróficas", acrescentou.
Em um estudo publicado na quarta-feira, a ONG Save The Children estimou em cerca de 85.000 as crianças mortas por fome, ou por doenças, desde a intensificação da guerra no país em 2015.