Brexit: a decisão deve ser aprovada em duas votações (Dylan Martinez/Reuters)
AFP
Publicado em 4 de setembro de 2019 às 14h25.
Última atualização em 4 de setembro de 2019 às 14h29.
O primeiro-ministro Boris Johnson entrou em uma nova queda de braço com o Parlamento britânico nesta quarta-feira (4), após a derrota humilhante na véspera em sua estratégia para o Brexit.
Após assumirem o controle da agenda parlamentar do Executivo ontem, os deputados britânicos adotaram nesta quarta uma proposta de lei que obriga o governo a solicitar um novo adiamento do Brexit, atualmente programado para 31 de outubro, em uma votação preliminar que deve ser confirmada durante a tarde.
O texto recebeu 329 votos a favor e 300 contra, infligindo um novo revés a Boris Johnson, contrário a qualquer nova extensão.
Se for aprovado, nos dois turnos, o projeto seguirá para a Câmara Alta, onde um grupo de Lordes pró-europeus já tentava impedir a possibilidade de um bloqueio por parte dos eurocéticos.
Enquanto isso, o ministro das Finanças, Sajid Javid, prometeu que o Reino Unido "vai virar a página" de uma década de austeridade, ao apresentar um orçamento que aumentará os gastos públicos em 13,8 bilhões de libras (16,8 bilhões de dólares), especialmente em educação e saúde.
Como já aconteceu recentemente, os manifestantes protestavam em frente a Westminster. E, desta vez, até as juventudes conservadoras foram reclamar contra a "radicalização" de seu partido e a ameaça de um Brexit sem acordo.
Depois de atingir na terça-feira seu nível mais baixo em três anos, hoje a libra esterlina subia mais de 1% frente ao dólar por volta de meio-dia (horário local). Os mercados antecipam que o texto será aprovado, já que a oposição conta com o apoio de 21 conservadores rebeldes. Ontem, eles votaram contra o governo para permitir a introdução do projeto de lei na Casa.
Em meio à confusão, os dissidentes foram expulsos da bancada parlamentar conservadora por Johnson, que respondeu pedindo a convocação de eleições legislativas antecipadas. Entre eles, estão Nicholas Soames, neto de Winston Churchill, ídolo de Johnson, e o ex-ministro das Finanças Philip Hammond.
Para antecipar as eleições - previstas para 2022 -, o governo precisa do apoio de dois terços da Câmara dos Comuns e, nesta quarta, parecia longe de alcançar este número.
Os britânicos decidiram sair da UE com 52% dos votos na consulta popular realizada em 2016.
Inicialmente previsto para ser concluído em março passado, o Brexit foi adiado duas vezes diante da rejeição do Parlamento ao Tratado de Retirada negociado pela então premiê Theresa May.
Johnson chegou ao poder em 24 de julho, com a garantia de que vai tirar o país da UE em 31 de outubro - com, ou sem, acordo.
Muitos deputados de todo espectro político temem as consequências de uma saída brutal do bloco, que deixará o país com escassez de alimentos frescos, medicamentos e outros produtos importados, ao mesmo tempo em que o fará perder milhões de dólares em exportações.
Determinados a conter Johnson, os legisladores da chamada "aliança rebelde" votarão sua proposta em três turnos consecutivos ainda hoje. Eles correm contra o relógio, já que o premiê anunciou que suspenderá os trabalhos parlamentares entre a segunda semana de setembro e 14 de outubro. E o texto ainda precisa ser aprovado pelos Lordes, a Câmara Alta do Parlamento.
Também nesta quarta, a mais alta instância judicial civil da Escócia declarou legal a suspensão do Parlamento decidida pelo primeiro-ministro.
"Do meu ponto de vista, não há infração da lei", disse o juiz, afirmando que se inscreve no "âmbito da política e não pode ser avaliada com critérios legais, mas apenas políticos". Outra ação será examinada em Londres, na quinta-feira.
A decisão da Justiça traz um pequeno alívio para Boris Johnson, depois de uma terça-feira infernal, na qual perdeu sua maioria absoluta. Por 328 votos contra 301, foi aprovada uma moção que permitiu aos deputados assumirem o controle da agenda parlamentar, normalmente da alçada do Executivo.
Nesta quarta de manhã, a maioria dos jornais britânicos afirmava que Boris Johnson "perdeu o controle" sobre o processo do Brexit.
Se os parlamentares dissidentes conseguirem impor um adiamento do Brexit, Boris Johnson submeterá à votação da Câmara uma moção para convocar eleições legislativas antecipadas.
Avaliando que um adiamento seria "uma capitulação", o primeiro-ministro desafiou o líder da oposição, Jeremy Corbyn, a apoiar a realização de eleições em 15 de outubro "para permitir ao povo deste país manifestar sua opinião".
"O nível de confiança em Boris Johnson é muito, muito baixo", declarou Keir Starmer, responsável pelo Brexit no Partido Trabalhista, principal sigla da oposição. "Queremos uma eleição geral", mas "não votaremos com Johnson hoje", disse ele à emissora ITV.
"A estratégia evidente para a oposição é deixar o governo cozinhar", avaliou o professor de Ciência Política John Curtice, da Universidade de Strathclyde. Segundo ele, é preciso esperar para ver "se Boris Johnson encontrará outros meios para organizar uma eleição".
De Bruxelas, a Comissão Europeia avaliou, nesta quarta, que "o pouco tempo restante e a situação política" aumentam o risco de uma saída sem acordo.