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Eleições nos EUA: eleitores latinos têm aumento recorde nos EUA, e republicanos ganham terreno

Economia e valores conservadores são razões apontadas por especialistas para avanço de Trump sobre estrato que votou em peso em Biden em 2020

Biden x Trump: latinos são um grupo-chave na disputa pela Casa Branca (Scott Olson/Getty Images)

Biden x Trump: latinos são um grupo-chave na disputa pela Casa Branca (Scott Olson/Getty Images)

Agência o Globo
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Agência de notícias

Publicado em 19 de março de 2024 às 07h02.

Última atualização em 19 de março de 2024 às 10h21.

Segundo eleitorado que mais cresce nos Estados Unidos, os latinos são um grupo-chave na disputa pela Casa Branca entre o presidente, Joe Biden, 81 anos, e o ex-presidente Donald Trump, 77. E se no primeiro duelo entre os dois, em 2020, a preferência de 70% dos latinos foi fundamental para a vitória do democrata, o embate que se desenha para a eleição deste ano está longe de qualquer certeza.

Nesta terça-feira, as primárias na Flórida (republicana) e no Arizona (dos dois partidos) — dois estados com grande população de origem hispânica e com histórico de resultados imprevisíveis — podem servir como uma espécie de termômetro para as campanhas (re)calcularem suas rotas até novembro, num pleito em que imigração e economia estão no centro do debate.

Neste ano, o número de eleitores registrados da comunidade latina atingiu o recorde de 36,2 milhões, uma fatia de quase 15% do eleitorado — um crescimento de 153% em comparação a 2000, quando o estrato representava apenas 7,4% do total, ou cerca de 14,3 milhões de pessoas.

E se em outros anos este cenário seria uma ótima notícia para o Partido Democrata, agora é mais um motivo de preocupação para Biden, que na maioria das pesquisas aparece atrás de Trump a oito meses da eleição. Em dezembro, uma consulta da CNBC apontou uma vantagem inédita de 5 pontos percentuais para Trump contra Biden entre os latinos — três meses antes, consulta idêntica conduzida pela rede de TV tinha Biden à frente, com vantagem de 7 pontos percentuais no grupo.

Neste mês, com o cenário Trump x Biden praticamente definido nas primárias, pesquisa New York Times/Siena College, em universo de 980 pessoas, mostrou que 46% dos latinos preferiam Trump, contra 40% para Biden.

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Mudança de lado

Outro estudo, da Universidade Internacional da Flórida (FIU, na sigla em inglês), conduzido com eleitores latinos, indicou que um em cada cinco já considerou mudar sua afiliação partidária — a maioria deles (38%) para os republicanos. Para Joshua Scacco, diretor do Centro de Democracia Sustentável da Universidade do Sul da Flórida (USF), diferentes fatores explicam o fenômeno: de falhas na comunicação dos democratas à conexão de Trump com parcela mais conservadora do eleitorado.

— Muitas vezes, os democratas tratam o voto latino como se fosse uma coisa só, e não é. Adaptar a mensagem às diferentes preocupações das diásporas hispânicas é fundamental. — analisa Scacco, destacando que republicanos têm visado diferentes comunidades latinas com discursos pautados pelo "medo do comunismo" e dos males da imigração ilegal. — Isso está funcionando particularmente com homens jovens latinos, que também respondem bem ao apelo do Trump à masculinidade.

É o caso de Carlos (nome fictício), um garçom porto-riquenho de 27 anos que trabalha em Tampa, no sul da Flórida. Apesar de ter votado em Biden em 2020, a percepção de que a economia piorou e a idade avançada do presidente o afastaram do voto democrata este ano. Ele conta que o atual presidente "não fez nada pela gente e está muito velho, então desta vez eu vou votar no Trump". Mesmo com bons indicadores econômicos, a inflação alta registrada após a pandemia ainda impacta a popularidade do presidente especialmente no eleitorado latino. A pesquisa da FIU mostra que o custo de vida é o maior problema do país para estes eleitores, seguido pela pobreza e, em, seguida, a imigração.

Imigrantes bons x maus

A retórica anti-imigração é, inclusive, uma das grandes apostas de Trump. Em meio ao recorde da entrada de pessoas não-documentadas nas fronteiras americanas no fim do ano passado, ele tem aumentado o volume da receita de 2016 e 2020, que inclui declarações xenofóbicas, afirmando que os imigrantes estão "sujando o sangue" do país. Na segunda-feira, o ex-presidente afirmou, em um discurso improvisado em Ohio, que não se deve chamar imigrantes de "gente", referindo-se a eles como "animais".

Embora parte do eleitorado latino seja originalmente imigrante ou a primeira geração nascida nos EUA, o discurso do republicano tem conquistado apoio de fatia importante desse estrato, mostram as pesquisas.

— Seria de se esperar que os latinos defendessem [quem cruza a fronteira]. Contudo, muitas vezes, ao se tornarem cidadãos americanos, passar a ver quem está atravessando a fronteira (sem documentos) como pessoas que não contribuirão para o país — diz Evelyn Pérez-Verdía, estrategista política e fundadora da We Are Más, organização de combate à desinformação na comunidade latina.

Há 25 anos nos Estados Unidos, a professora panamenha Ariadne Miranda destaca que há muitas informações falsas circulando na comunidade latina. E que elas reforçam a desumanização dos imigrantes que cruzam a fronteira e associam o Partido Democrata "ao comunismo".

— Muitos acreditam que somente latinos "ruins" vêm para o país [pela fronteira], e isso simplesmente não é verdade — afirma Miranda. — Conversei com muitos latinos que acreditam que Trump é a resposta, já que os democratas seriam "próximos do socialismo". E se você vem de Cuba ou Venezuela, por exemplo, esse é um medo.

Desinformação contra-ataca

Segundo Pérez-Verdía, o uso equivocado de determinados símbolos em peças de campanha têm contribuído para a associação dos democratas com o socialismo, por parte do eleitorado latino.

— Muitos chegam aqui cercados de medos, traumas e transtornos de estresse pós-traumático — analisa Pérez-Verdía. — E os democratas mostram o punho cerrado no ar ou a palavra "progressista", o que, para parte destes imigrantes, tem ligação com governos de extrema esquerda.

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Em uma eleição na qual o voto não é obrigatório, a capacidade de engajar eleitores a comparecer de fato às urnas e o combate a notícias falsas sobre a legitimidade do próprio pleito podem de fato definir os rumos do país. E, no caso dos latinos, é central a popularidade de redes sociais como o WhatsApp e o Telegram, que não têm a mesma adesão nos EUA como no Brasil, mas são amplamente usadas pelo grupo para se comunicar com parentes distantes, como mostra relatório da Universidade Brown em parceria com a Universidade do Texas e a We Are Más.

O documento destaca uma pesquisa com eleitores de origem cubana na Flórida, em 2021, que apontou que 40% deles não acredita nos resultados da última eleição presidencial, em que Biden derrotou Trump. Uma análise da ONG Media Matters revelou que 40% dos vídeos em espanhol no YouTube sobre o pleito de 2020 continham informações falsas, incluindo indicações de que cédulas fraudulentas vindas do México e da China seriam usadas nos EUA.

Neste ano, a estratégia de desinformação contra a comunidade latina vai, dizem os especialistas, além: nega-se até a existência da própria eleição. Em dezembro de 2023, uma campanha ativa de supressão do voto, tendo como alvo comunidades de língua espanhola no sul da Flórida, começou a circular, com rumores alegando que "a eleição de 2024 não acontecerá" ou que "será fraudulenta", aponta o estudo da Brown.

— Muitas vezes, os 'maus atores' não estão apenas tentando suprimir a democracia, mas também (especificamente) os votos dos latinos — conclui Pérez-Verdía. — É mais uma forma de criar apatia.

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