(Getty Images/Exame)
Editor de Macroeconomia
Publicado em 11 de janeiro de 2024 às 13h34.
Última atualização em 11 de janeiro de 2024 às 13h48.
Nesta terça-feira, 9, a China confirmou o "lançamento bem-sucedido" de um satélite espacial de última geração, publicando um relatório em sua mídia estatal. Por sua vez, 180 quilômetros a leste, o satélite provocou uma série de alertas em Taiwan e renovou preocupações sobre tentativas de interferência nas eleições. O episódio ilustra o clima de desconfiança no qual os taiwaneses vão às urnas no sábado, 13, para escolher seu presidente.
O lançamento chinês coincidiu com uma coletiva de imprensa do ministro das Relações Exteriores de Taiwan, Joseph Wu, para alertar sobre as ameaças de interferência da China nas eleições presidenciais. Veio, então, uma onda de alertas de emergência via smartphone no salão de festas do Regent Hotel de Taipei, onde mais de 100 jornalistas estrangeiros estavam reunidos. Com o título de "Alerta Presidencial", a mensagem avisava aos 24 milhões de habitantes de Taiwan, em inglês e chinês, que um foguete chinês havia acabado de sobrevoar o sul de Taiwan.
O governo da ilha, porém, cometeu um erro na mensagem em inglês: alterou a classificação para "Alerta de ataque aéreo", avisando sobre um "sobrevoo de míssil". Em inglês, o termo "rocket" pode significar tanto foguete quanto míssil.
Em poucos minutos, o Ministério da Defesa de Taiwan esclareceu aos repórteres por mensagem de texto que o lançamento envolveu um satélite, e não um míssil. Horas depois publicou um pedido público de desculpas. A China envia regularmente satélites para o espaço em trajetórias acima de Taiwan - embora quase sempre com altitude suficiente para evitar o acionamento de alertas de ataque aéreo.
De todo modo, as autoridades presentes na coletiva de imprensa atribuíram o lançamento a um sinal de interferência nas eleições taiwanesas.
Wu realizou diversos comentários pedindo que a população ainda compareça às votações e criticando ações da China consideradas como tentativas de interferir no pleito, afirmando que os chineses deveriam começar "suas próprias eleições democráticas, se estão tão interessados".
Entretanto, pouco antes da meia-noite em Taipei, mais de oito horas após o lançamento, uma porta-voz do gabinete presidencial de Taiwan disse que as autoridades haviam descartado um motivo político para o lançamento do satélite, após uma análise da equipe de segurança nacional da ilha.
A disputa em Taiwan, que acontece no sábado, 13, tem três candidatos principais: Lai Ching-te, que lidera as pesquisas — segundo o agregador de pesquisas eleitorais da Economist Intelligence Unit, ele soma cerca de 36% dos votos — Hou Yu-ih, com 31%, na frente de Ko Wen-je, com 24%.
Abaixo, entenda o perfil e as bandeiras de cada candidato:
Em novembro, ele defendeu que Taiwan esteja aberta a "ser amiga da China" mas que a segurança nacional e a paz não podem depender apenas da boa vontade de Pequim nem custar a soberania da ilha.
Para a Economist Intelligence Unit, Lai é o favorito para vencer, mas "isso levará a um período de volatilidade nos laços de Taiwan com a China, dadas as falas pró-independência de Lai no passado". Uma vitória de Lai seria estimulada pelo distanciamento entre os partidos KMT, atualmente na oposição, e TPP, independente.
Ko Wen-je: ex-prefeito da capital Taipei por dois mandatos, de 2014 a 2022, ele tenta ser uma terceira via e se concentrar mais nas questões internas da ilha do que em se aproximar ou se afastar da China continental.
Depois que o Partido Comunista assumiu o controle da China continental em 1949, no final de uma guerra civil, os nacionalistas do Kuomintang fugiram para Taiwan, causando um impasse político.
Entretanto, quando a ilha passou de uma autocracia para a democracia na década de 1990, os sentimentos da população, que tinha sido inicialmente educada na identidade chinesa, tornaram-se mais centrados em Taiwan.
As gerações mais velhas consideram a "unificação da China inevitável", disse à AFP Liu Wen, especialista em história e etnologia da Academia Sinica. "Eles respondem passivamente às intrusões e exercícios militares chineses porque acreditam que eventualmente (...) Taiwan e a China se unirão", explicou.
Mas este imaginário não é o mesmo entre as gerações mais jovens.
Em 1992, um quarto da população da ilha se identificou como chinesa. Atualmente este número é inferior a 3%, de acordo com pesquisas realizadas pela Universidade Nacional Chengchi de Taiwan nos últimos três anos. As mesmas pesquisas mostraram que 18% se identificaram como "somente taiwanês" em 1992. Agora, essa proporção cresceu para 63% da população.
As eleições na ilha acontecem em meio a um clima de afirmação identitária nacional e receio de possíveis reações da China — um movimento que poderia fazer os Estados Unidos entrar em rota de conflito com o gigante asiático e redesenhar o mapa geopolítico global.
É por isso que essa eleição tem movimentado o noticiário e a comunidade internacional. Para a consultoria de risco político Eurasia, caso Lai vença a eleição presidencial de Taiwan, Pequim tomará "medidas militares e econômicas agressivas para desencorajar suas ambições pró-independência". Por sua vez, os EUA tenderão a responder com demonstração de apoio a Taiwan.
Assim, avalia a consultoria, o incômodo status quo no Estreito de Taiwan será em breve testado se Taiwan eleger Lai.
"Enquanto Biden se oporá a quaisquer movimentos de independência de Lai, a política doméstica da questão de Taiwan impedirá o presidente dos EUA de se opor aos passos menores, simbólicos, em direção à autonomia de fato que Lai provavelmente tomará", pondera a Eurasia em sua publicação que mapeou os maiores riscos geopolíticos de 2024.
"No entanto, mesmo estes serão suficientes para provocar uma resposta militar sem precedentes de Pequim, como violar o espaço aéreo ou as águas de Taiwan ou realizar inspeções de navios. Biden será forçado a responder à agressão chinesa com uma demonstração de resolução em apoio a Taipei que poderia colocar em risco o degelo entre EUA-China e arriscar um ciclo perigoso de escalada."
A Eurasia acrescenta que o impulso chinês para afirmar seus interesses regionais continuará a produzir "encontros próximos com ativos militares dos EUA no Estreito de Taiwan e do Mar do Sul da China".
Pivô da situação, o lançamento do satélite Einstein Probe foi comemorado pela mídia chinesa. Seu uso de uma nova tecnologia de raios X que supostamente imita as características oculares das lagostas, com o objetivo de avançar na compreensão de eventos cósmicos pouco conhecidos, como colisões de estrelas de nêutrons.
Lançada do sudoeste da China em um foguete Longa Marcha 2C, a sonda deveria ter sido enviada ao espaço no final do ano passado e não está claro o que levou ao atraso, embora o momento de tais lançamentos seja comumente afetado por fatores como o clima.