Estreito de Taiwan: ilha é separada da China continental por distância de 130 km (Gallo Images/Getty Images)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 19 de dezembro de 2023 às 06h34.
No começo de 2024, uma eleição será acompanhada com extrema atenção pelo mundo: em 13 de janeiro, Taiwan escolherá seu novo presidente. O pleito pode ter consequências para o delicado equilíbrio que existe entre a ilha e a China continental. Caso o novo presidente dê passos mais firmes em direção à independência formal de Taiwan, isso poderia desencadear uma invasão chinesa, que daria início a um conflito que pode envolver as duas maiores potências econômicas mundiais.
A campanha eleitoral começou oficialmente na última sexta, 15. Uma ilha com 23 milhões de habitantes, Taiwan vive em uma situação insólita: o território tem um governo autônomo em relação à China. No entanto, o governo de Pequim considera Taiwan parte de seu território, e um avanço mais forte da ilha em direção à independência pode fazer a China apertar o cerco. No pior cenário, isso poderia levar a uma invasão militar.
Os Estados Unidos possuem um acordo com Taiwan, no qual se comprometem a ajudar o país a se defender em caso de confronto. Esse acordo não prevê o envio de tropas americanas. No entanto, Washington fornece armas e equipamentos de ponta para a ilha há décadas, em um movimento que incomoda Pequim.
Nesta segunda, 18, Wang Wenbin, porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China, condenou mais uma vez a atitude dos Estados Unidos, que anunciou mais uma venda de armas para a ilha. "A questão de Taiwan é inteiramente um assunto interno da China, e não toleramos interferência estrangeira", disse Wang, em entrevista coletiva. Ele acusa os Estados Unidos de criar uma tendência perigosa na região.
Em 1949, a Revolução Comunista tomou o poder na China. O antigo governo chinês, derrotado, se refugiou em Taiwan e tentou preservar sua legitimidade. No entanto, perdeu o controle do território continental e sua jurisdição se resumiu a Taiwan e algumas pequenas ilhas próximas. O governo em Taiwan manteve o nome de República da China, enquanto os revolucionários adotaram o nome República Popular da China, baseado em Pequim e que controla toda a China continental.
Muitos países, incluindo os EUA, demoraram décadas a reconhecer o governo comunista. No entanto, a partir dos anos 1970, as relações entre a China comunista e EUA foram normalizadas e, nos anos seguintes, os dois países criaram uma forte parceria comercial, com a China fabricando produtos para empresas ocidentais a preços baixos.
Em 1979, os EUA abandonaram um tratado de defesa mútua com a ilha, que foi substituído pelo Ato de Relações com Taiwan. O termo prevê que os americanos devem ajudar a ilha a se autodefender em caso de ameaças externas, como o envio de armas e treinamento. Ao mesmo tempo, os americanos contam com a indústria de Taiwan para produzir itens estratégicos, como microchips de ponta usados em computadores e outros aparelhos, que estão por trás de inovações como a inteligência artificial. A ilha produz mais de 60% dos semicondutores globais e mais de 90% dos mais avançados.
O governo de Pequim considera Taiwan como uma província rebelde, mas mantém em suspenso a possibilidade de retomar o controle da ilha à força. Assim, uma eventual invasão chinesa poderia gerar um conflito de grandes proporções. Com isso, a principal questão da eleição de janeiro é como o novo governo de Taiwan se relacionará com Pequim. Gestos mais fortes em relação à independência podem irritar o governo do continente e ampliar o risco de confronto armado.
A disputa em Taiwan tem três candidatos principais: Lai Ching-te, que lidera as pesquisas. Segundo levantamento da Economist Intelligente Unit, ele soma cerca de 35% dos votos. Em segundo, vem Hou Yu-ih, com 29%, na frente de Ko Wen-je, com 23%.
Concorrendo pelo partido DPP, Lai é o candidato do governo, chefiado pela presidente Tsai Ing-wen. Ela está no cargo desde 2016 e não pode se reeleger novamente. Ele foi deputado por mais de uma década, prefeito da cidade de Tainan e forte defensor da independência da ilha. No entanto, ele prometeu seguir a postura do governo atual: ao considerar que Taiwan já é independente, não seria preciso declarar isso oficialmente ou tomar novas medidas. Com isso, caso ele vença, a expectativa é que a China mantenha o ritmo de pressão atual.
Na segunda, 18, Lai disse, em um ato de campanha, que sua vitória significará uma redução do risco de guerra com a China continental. Ele prometeu "manter as vidas das 23 milhões de pessoas no coração e proteger sua segurança".
Em novembro, ele defendeu que Taiwan esteja aberta a "ser amiga da China" mas que a segurança nacional e a paz não podem depender apenas da boa vontade de Pequim nem custar a soberania da ilha.
Para a Economist Intelligente Unit, Lai é o favorito para vencer, mas "isso levará a um período de volatilidade nos laços de Taiwan com a China, dadas as falas pró-independência de Lai no passado". Uma vitória de Lai seria estimulada pelo distanciamento entre os partidos KMT, atualmente na oposição, e TPP, independente.
Já Hou, segundo colocado nas pesquisas, defende uma aproximação com Pequim, para negociar formas de acalmar as tensões. Ele fez carreira como policial, chegou a chefiar a Agência Nacional de Polícia e depois se elegeu prefeito de Nova Taipei, nos arredores da capital.
Em terceiro, vem Ko Wen-je, ex-prefeito da capital Taipei por dois mandatos, de 2014 a 2022. Ele tenta ser uma terceira via e se concentrar mais nas questões internas da ilha do que em se aproximar ou se afastar da China continental. Nas próximas semanas, os taiwaneses decidirão qual das formas de se relacionar com Pequim é a mais adequada, enquanto os outros países ficarão de olho nas consequências dessa escolha.