Mundo

Documentos revelam tensão entre EUA e ditadura argentina

Centenas de páginas revelam em detalhes casos de detidos, torturados e desaparecidos, a partir de informações obtidas pela embaixada americana em Buenos Aires


	Argentina: a questão dos direitos humanos foi um dos dois únicos temas discutidos no encontro na Casa Branca, em setembro de 1977
 (Wikimedia Commons)

Argentina: a questão dos direitos humanos foi um dos dois únicos temas discutidos no encontro na Casa Branca, em setembro de 1977 (Wikimedia Commons)

DR

Da Redação

Publicado em 10 de agosto de 2016 às 08h50.

Arquivos liberados pelos Estados Unidos sobre a ditadura argentina publicados nesta segunda-feira revelam a tensão entre o então presidente, Jimmy Carter, e o regime militar, quando o governo americano promovia uma política externa com prioridade para os direitos humanos.

A questão dos direitos humanos foi um dos dois únicos temas discutidos no encontro na Casa Branca, em setembro de 1977, no qual Carter confrontou o ditador argentino Jorge Videla com base em denúncias de prisões irregulares.

Segundo um memorando da conversa, Carter citou as detenções do editor Jacobo Timerman e de membros da família Deutsch, e perguntou se era "habitual" não informar à Justiça sobre os detidos e as acusações que enfrentavam, repercutindo denúncias de organizações dos direitos humanos sobre a prisão de até 3 mil pessoas.

Timerman e alguns membros da família Deutsch, que Videla vinculou a "grupos terroristas" em uma posterior carta a Carter, foram posteriormente libertados, revelam os documentos.

Carter também pressionou o ditador para que permitisse a visita da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), o que de fato ocorreu dois anos depois, em 1979.

"Carter se envolveu pessoalmente em obter junto aos altos escalões das forças armadas argentinas a libertação de presos específicos e a desaceleração das violações dos direitos humanos que ocorriam", destacou Peter Kornbluh, analista do Arquivo de Segurança Nacional da Universidade George Washington.

Em carta enviada a Videla após a reunião em Washington, Carter expressou sua disposição de "ter a melhor relação" com a Argentina, mas denunciou "sérias violações dos direitos humanos".

"Guerra burocrática"

Centenas de páginas revelam em detalhes casos de detidos, torturados e desaparecidos, a partir de informações obtidas pela embaixada americana em Buenos Aires.

Ao menos 30 mil pessoas despareceram durante a chamada "guerra suja", o período a partir da segunda metade da década de 70, e que se aprofundou de forma dramática após o golpe militar de 1976.

"Os documentos realmente permitem constatar a tentativa de Jimmy Carter de implementar uma nova política externa com enfoque nos direitos humanos", declarou Kornbluh à AFP.

Mas os memorandos e notas também evidenciam o debate interno no governo americano entre os defensores dos direitos humanos e setores mais preocupados com a aliança contra o comunismo.

"Quando tomamos ações contra a Argentina, que são interpretadas como punitivas, não apenas encolerizamos os ideólogos de direita, mas também agitamos o setor de negócios e a imprensa nos Estados Unidos", escreveu o então assessor de segurança da Casa Branca, Zbigniew Brzezinski, em um memorando de março de 1979 enviado ao secretário de Estado, Cyrus Vance.

Os documentos também revelam o antagonismo pessoal entre Brzezinski e Pat Derian, a subsecretária de Estado e principal ativista de Carter a favor dos direitos humanos.

"Ela me critica em tudo", diz Brzezinski em um memorando.

"Se nota uma sensação de guerra burocrática", destaca Kornbluh.

Acompanhe tudo sobre:América LatinaArgentinaDireitos HumanosDitaduraEstados Unidos (EUA)Países ricos

Mais de Mundo

Trump nomeia Keith Kellogg como encarregado de acabar com guerra na Ucrânia

México adverte para perda de 400 mil empregos nos EUA devido às tarifas de Trump

Israel vai recorrer de ordens de prisão do TPI contra Netanyahu por crimes de guerra em Gaza

SAIC e Volkswagen renovam parceria com plano de eletrificação