Rio Xingu, onde será construída a usina: segundo o relatório da CDH, situação é preocupante (Paulo Jares/VEJA)
Da Redação
Publicado em 5 de maio de 2011 às 16h14.
Brasília - A Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado debateu hoje o relatório de diligência realizado em Altamira, no Pará, que ouviu as populações de risco que serão atingidas pela construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. O relatório de 21 páginas descreve os trabalhos realizados no dia 16 de abril em bairros de Altamira, que serão inundados com as obras no Rio Xingu. A comitiva também visitou o hospital municipal e a Companhia de Saneamento do Pará (Cosanpa).
A senadora Marinor Brito (PSOL-PA), que requereu a diligência, acusa o governo de omitir, nos relatórios oficiais, o impacto direto da obra nas comunidades indígenas, ribeirinhas e na população local. "É um crime, Belo Monte não é viável sob os aspectos social, econômico e ambiental. O governo deve paralisar a obra e retomar o processo de discussão com as comunidades atingidas para fazer uma projeção realista do seu impacto", defendeu.
Segundo Marinor, cópias do relatório serão encaminhadas à Organização dos Estados Americanos (OEA), à Procuradoria Geral da República, à Presidência da República e a entidades internacionais de direitos humanos. Ela acrescentou que o presidente da CDH, senador Paulo Paim (PT-RS), se comprometeu em insistir no pedido para que a presidente Dilma Rousseff receba lideranças das comunidades tradicionais locais, que serão atingidas pela obra.
Durante a audiência pública no Senado, o procurador da República no Pará, Bruno Valente, afirmou que a construção de Belo Monte "está sendo conduzida de forma errada, com a prática de uma série de irregularidades". Ele destacou a falta de infraestrutura, que expõe a riscos a população local. "É preciso dotar os municípios envolvidos de infraestrutura urbana que os prepare para receber o fluxo migratório de trabalhadores decorrente dos novos empregos", alertou.
Condições
O relatório de diligência descreve como "subumanas as condições de habitação" em Altamira, diante da completa falta de saneamento. O gerente local da companhia de abastecimento informou que a estação de tratamento não atende nem 30% dos 100 mil habitantes do município. "As águas do Xingu entram e saem dos tanques sem nenhuma filtragem ou adição de cloro ou flúor. Significa dizer que 100% da população de Altamira não recebe água potável em suas residências", diz o documento.
Na esfera da saúde, os médicos que atendem no hospital municipal disseram que o órgão já não suporta o fluxo provocado pela grande quantidade de famílias que se transferiu para Altamira em busca de emprego na construção da usina. O hospital recebe os moradores de Altamira e pacientes que residem em municípios próximos à Transamazônica, "estando com a capacidade de atendimento praticamente esgotada", diz o documento. Os médicos ouvidos denunciam, ainda, que cresce o número de corpos no necrotério do hospital sem que haja procura pelas famílias nem identificação dos mortos.
A diligência promovida pela Comissão de Direitos Humanos ouviu representantes de comunidades indígenas, quilombolas, agricultores familiares, ribeirinhos, moradores da periferia, e do Movimento Xingu Vivo. Participaram da diligência, além de Marinor Brito, o procurador da República Cláudio Amaral, o deputado estadual Edmilson Brito, lideranças comunitárias e técnicos da CDH.
O avanço da obra depende de emissão do licenciamento ambiental pelo Ibama, que divulgou uma lista ampla de condicionantes a serem atendidas previamente. A mineradora Vale ingressou recentemente no consórcio Norte Energia, responsável pela construção de Belo Monte, com a compra da fatia de 9% da Gaia Energia, empresa do grupo Bertin, que deixou o empreendimento.