A cidade de Taxco, no estado mexicano de Guerrero, relembra crimes que permanecem sem esclarecimento (Leandra Felipe/ABr)
Da Redação
Publicado em 21 de novembro de 2014 às 12h55.
Iguala - O envolvimento da polícia e de setores do crime organizado no desaparecimento de pessoas no México – como o ocorrido no final de setembro com 43 estudantes de Ayotzinapa – não é um fenômeno novo e sinaliza a grave crise humanitária que o país atravessa, analisam especialistas em direitos humanos.
“O problema do desaparecimento forçado no México, internacionalmente visibilizado agora por causa do desaparecimento dos estudantes, é recorrente no país e também se trata de um mecanismo usado por autoridades estatais para frear os protestos sociais”, destaca à Agência Brasil, Chasel Colorado, coordenadora da organização não governamental (ONG) Anistia Internacional no país.
No México, os desaparecidos são geralmente raptados e mortos pelo crime organizado ou por forças policiais, mas como os corpos nunca são achados as vítimas não entram nas estatísticas de homicídio.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) no México tem registrados, entre 2006 e 2014, 22.322 casos de pessoas desaparecidas – número que, segundo a Anistia Internacional, não representa a totalidade uma vez que nem todas as denúncias são acatadas e porque não são todos os estados mexicanos que têm o crime de desaparecimento forçado tipificado na legislação.
“Somente 16 dos 32 estados do país têm tipificado, no Código Penal, o crime de desaparecimento, por isso muitos casos não são registrados de maneira correta e chegam como sequestro, pela ausência de tipificação”, explica Chasel.
Além disso, diz ela, o uso do desaparecimento como instrumento de terror e intimidação por autoridades do Estado, especialmente policiais e militares, acaba por diminuir as estatísticas, uma vez que casos envolvendo o Exército ou a polícia não são investigados.
A comerciante Maria Guadalupe Arozco, 60 anos, diz que já perdeu a esperança de descobrir o paradeiro do filho, que desapareceu em março de 2010. Francis Alejandro García, 32 anos, proprietário de uma casa noturna, fazia um evento na noite em que desapareceu.
As imagens gravadas pelo circuito de segurança de um estabelecimento comercial em frente ao local em que foi capturado mostra o momento em que ele e mais quatro pessoas foram levadas, supostamente por membros do Exército mexicano.
Apesar dos testemunhos, inclusive o da irmã de Francis, que viu o momento em que homens saíram das caminhonetes e sequestraram os jovens, o Ministério Público não acatou a denúncia. “O funcionário do Ministério Público falou que, se a ação havia sido realmente do Exército, era melhor desistir porque não íamos conseguir nada”, relata a comerciante.
María Guadalupe diz que não acredita que o caso seja esclarecido. “Não tivemos direito a registro nem a investigação”, conta. “Aqui no México a única justiça confiável é a que não é terrena. Aqui confiamos na justiça de Deus”, lamenta.
A Anistia Internacional disse que há muita dificuldade de ter o apoio da população, com informações e denúncias, quando o tema é o desaparecimento forçado. “Há ainda um problema de confiança. Se você não acredita que um caso será julgado e se vê os próprios entes do Estado envolvidos, você não procura o Estado”, argumenta Chasel.
O desaparecimento também é usado como arma de coerção por integrantes de cartéis de drogas e grupos criminosos.
“Um criminoso vê uma pessoa e pensa que ela pode servir ao sistema. Só que a pessoa é honesta e diz que não quer entrar nesse esquema. O que eles fazem? Pressionam pelo medo, envolvem o cidadão com ameaças à família”, diz um militar que não quis se identificar.
“Você diz não à corrupção por ser honesto, mas talvez possa dizer sim quando ameaçam sua família. Fazer com que pessoas desapareçam é muito fácil”, diz, apontando em direção às montanhas, local para onde acredita que sejam levados os corpos.