Michelle Bachelet: ela se tornou a primeira presidente eleita democraticamente duas vezes (Rodger Bodch/AFP)
Da Redação
Publicado em 22 de dezembro de 2014 às 16h47.
Santiago - O ambicioso programa de reformas com o qual Michelle Bachelet voltou à presidência do Chile em março deste ano atravessa sérias dificuldades devido à desaceleração econômica, a divisão do governo e a oposição empresarial.
Em 15 de dezembro de 2013, Bachelet teve uma arrasadora vitória nas urnas (62% contra 37% da candidata direitista Evelyn Matthei) e se tornou a primeira presidente eleita democraticamente duas vezes.
Bachelet retornou ao Palacio de la Moneda com a promessa de iniciar mudanças estruturais que acabassem com a desigualdade e a exclusão social em um país onde a saúde, a educação e a previdência estão passando para as mãos do setor privado e os cidadãos estão cansados de viver com uma frágil proteção do Estado.
A reforma tributária, a mudança de modelo educacional e uma nova Constituição foram os pilares de seu programa eleitoral.
A contundente vitória e sua indiscutível liderança na Nova Maioria deveriam ser as ferramentas para implementá-las.
Pela primeira vez desde o retorno da democracia, em 1990, o Chile tem um governo com a maioria necessária no Congresso para aprovar projetos legislativos sem necessidade da oposição.
Mas, neste ano, a economia chilena, que vinha crescendo em ritmo vigoroso, sofreu um severo arrefecimento.
A um entorno macroeconômico desafiador, a queda do preço do cobre e o fim dos projetos de investimento na grande mineração se somam os problemas entre o governo e a patronal - que teme os efeitos de uma reforma tributária que aumente a pressão fiscal sobre o setor privado - e as dificuldades para levar adiante a complexa reforma educativa, um dos pilares básicos do programa de governo.
Assim como outros países da região, o Chile viu 2014 esfriar a atividade econômica por causa da queda do preço das matérias-primas, com a consequente redução nas receitas fiscais, que no caso do cobre representam 20% do total exportado pelo país.
Para este ano a estimativa é que o PIB cresça 1,8%, muito abaixo da expansão média de 5,4% dos últimos quatro anos. É por isso que o governo dispôs para 2015 um orçamento público fortemente expansivo.
Para responder às demandas da emergente classe média chilena, em seu primeiro ano de governo Bachelet impulsionou uma ampla bateria de reformas. Necessárias e oportunas, segundo o governo. Excessivas e desestabilizadores, de acordo com a oposição e os empresários.
As mudanças projetadas pelo Executivo (66 projetos nos primeiros sete meses) vão desde as reformas tributária, educativa e constitucional até a transformação do modelo sanitário, da previdência, dos bancos, da matriz energética, do sistema eleitoral, além do financiamento dos partidos, do casamento, do aborto e da lei antiterrorista.
Entre as iniciativas econômicas se destacaram os investimentos no setor energético, que chegaram a US$ 650 milhões, um plano de infraestrutura de sete anos baseado em uma aliança público-privada que alcança os US$ 28 bilhões e a orientação para os ministros de apressar ao máximo a execução orçamentária de 2014.
Além disso, pela primeira vez em 12 anos, o Chile saiu aos mercados internacionais de dívida para buscar recursos frescos com a emissão de dois bônus soberanos de US$ 2,044 bilhões para compensar a queda na arrecadação tributária e iniciar medidas contracíclicas, como já fez na crise de 2009.
Junto com os problemas da economia, o impacto da reforma tributária e a polêmica reforma educacional é preciso somar os desencontros no seio da Nova Maioria entre os democratas-cristãos e a ala mais à esquerda da coalizão governista.
O resultado foi uma forte queda na popularidade da presidente, que atualmente tem 38% de aprovação.
Bachelet não acredita que o lento caminhar da economia se deva às reformas estruturais e defendeu que o arrefecimento obedece - em boa medida - a fatores exógenos que afetam toda a América Latina e as outras economias emergentes
Mas se à presidente vai mal nas pesquisas, a oposição está ainda pior. A grande maioria dos chilenos considera que a direita está bloqueando reformas que considera indispensáveis, embora mal executadas, e critica a falta de propostas alternativas.
Os partidos conservadores se debatem entre a dispersão e o imobilismo.
Enquanto a União Democrata Independente se mantém fiel aos postulados políticos do pinochetismo, a Renovação Nacional - mais moderada - sangra pouco a pouco com a cisão de setores que trabalhar para a formação de uma grande força política de centro.
Oposição, empresários e um crescente setor da população se mostram insatisfeitos com o desempenho do governo. Inclusive a própria presidente Bachelet chegou a dizer publicamente que os ministros deveriam trabalhar mais.
É por isso que muitos analistas dão por certo um iminente ajuste no gabinete para impulsionar a agenda reformista e superar as tensões internas em uma coalizão tão ampla no social como heterogênea no político.