Mundo

Derrota de Morales o obriga a mudar estratégia política

No domingo, a Bolívia votou e rejeitou em referendo a reforma constitucional promovida pelo presidente para poder se candidatar a um quarto mandato


	Evo Morales: o voto rural e camponês, que foram os últimos apurados, chegou a manter viva a esperança de Morales em uma reviravolta
 (David Mercado / Reuters)

Evo Morales: o voto rural e camponês, que foram os últimos apurados, chegou a manter viva a esperança de Morales em uma reviravolta (David Mercado / Reuters)

DR

Da Redação

Publicado em 24 de fevereiro de 2016 às 09h57.

Com sua primeira derrota eleitoral desde a sua chegada ao poder, em 2006, o presidente boliviano, Evo Morales, agora terá que rever sua estratégia, para garantir seu projeto político para depois de 2020, quando terminar seu atual mandato.

No domingo, a Bolívia votou e rejeitou em referendo a reforma constitucional promovida pelo presidente de origem indígena para poder se candidatar a um quarto mandato (2020-2025).

Segundo a contagem oficial do Organismo Eleitoral Plurinacional (OEP) boliviano, após a apuração de 99,72% dos votos, o "não" venceu com 51,30%, contra 48,70% para o "sim". A tendência é irreversível.

Morales, que ainda mantém incólume seu poder com um domínio pleno do Congresso, o que permite seguir com suas reformas, deverá administrar esta derrota, avaliar os danos e buscar junto a seu partido MAS (Movimento ao Socialismo) um discurso que recupere a confiança e alcance consensos, de acordo com analistas políticos.

O voto rural e camponês, que foram os últimos apurados, chegou a manter viva a esperança de Morales em uma reviravolta.

O resultado do referendo levou as pessoas às ruas para festejar em cidades como La Paz e nos redutos opositores de Sucre, Potosí e Santa Cruz.

"Hoje, o país está dividido, mas é temporário. Também vai depender da liderança de Morales, do partido do governo e da oposição para que esta polarização seja apenas conjuntural", considerou o professor de Ciência Política Carlos Cordero.

Para o líder opositor boliviano Samuel Doria Medina, a derrota de Evo Morales deixa como mensagem para a oposição a urgência de se unir.

"A principal mensagem a extrair é a da unidade, ou seja, que o caminho da unidade é o que a Bolívia necessita", afirmou, insistindo que "a principal mensagem que a população nos deu é que, se trabalharmos unidos, teremos resultados".

Doria Medina perdeu duas vezes para Morales - consecutivamente e por uma ampla diferença - na disputa pela Presidência do país.

Em sua conta no Twitter, o ex-presidente liberal Jorge Quiroga comemorou: "Bolívia diz NÃO ao autoritarismo. NÃO à corrupção. NÃO ao Chavismo. NÃO ao narcotráfico. NÃO ao desperdício".

Mais cedo, a Missão de Observação Eleitoral da Organização dos Estados Americanos (OEA) pediu às autoridades que aceitem e respeitem os resultados do referendo de domingo, o que Morales disse que fará.

Grande derrota

Morales, 56 anos, começou a governar em 2006 depois de obter nas urnas 54% dos votos, e revalidou o cargo duas vezes consecutivas, em 2010, com 64%, e em 2015, com 61%.

A Constituição aprovada em 2009, impulsionada pelo próprio Morales, criou a figura da reeleição por uma única vez de maneira contínua, por períodos de 5 anos, ou seja, para dois períodos seguintes, 2010-2015 e 2015-2020.

Para uma nova candidatura, Morales precisava mudar a lei fundamental, só que dessa vez não conseguiu. Trata-se de sua primeira grande derrota depois de dez anos no poder. Faltando três anos para acabar seu mandato, ele detém recorde de presidente com maior tempo no poder na Bolívia.

"O governo deveria converter esta derrota em vitória. Como? Sentando-se à mesa com todos para elaborar uma agenda anticrise econômica, levando em conta o que aconteceu na Venezuela, que não fez isso e está como está agora", considerou sociólogo Iván Arias.

Golpe ao socialismo

O revés de Morales se soma a outros sofridos por seus colegas de ideologia, que buscavam se perpetuar no poder, como no caso dos Kirchner na Argentina e da derrota do governo na Venezuela, nas eleições legislativas de dezembro passado.

"É uma nova derrota para o chamado 'Socialismo do Século XXI', que irrompeu na região há 18 anos, sob a liderança de Hugo Chávez", avalia o analista peruano Francisco Belaunde.

Nas últimas semanas, a situação se complicou para o presidente indígena, acusado de favorecer a empresa chinesa CAMC, na qual sua ex-companheira, Gabriela Zapata, trabalha como gerente comercial. A empresa conseguiu contatos públicos de 560 milhões de dólares e o caso é investigado pelo Congresso. Morales nega as acusações.

Também se viu atingido por um escândalo que envolve camponeses, alguns ligados a ele, investigados por uma fraude de 2,5 milhões de dólares de um fundo de investimento.

Vulnerável, mas forte

Para a consultora de risco político Eurasia Group, Morales continua sendo relativamente popular e tem tempo suficiente para escolher um sucessor ou tentar, de novo, uma nova reforma constitucional.

Para isso deverá aglutinar seu partido MAS e evitar uma disputa para a sua sucessão.

Morales conta a seu favor o fato de impulsionar o crescimento do país, depois da estatizar os hidrocarbonetos em maio de 2006, o que avolumou o impostos.

"Com estes resultados, o governo não vai cair, mas o presidente terá de fazer uma avaliação de temas que precisam de atenção, como os contratos (de gás) com o Brasil, a demanda marítima (contra o Chile), questões em que o país ainda confia na liderança de Morales", considerou cientista político Cordero.

Acompanhe tudo sobre:América LatinaBolíviaEvo MoralesPolíticosReferendo

Mais de Mundo

Putin sanciona lei que anula dívidas de quem assinar contrato com o Exército

Eleições no Uruguai: Mujica vira 'principal estrategista' da campanha da esquerda

Israel deixa 19 mortos em novo bombardeio no centro de Beirute

Chefe da Otan se reuniu com Donald Trump nos EUA