O presidente Raúl Castro tomou uma série de medidas para mudar a economia de Cuba (Str/AFP)
Da Redação
Publicado em 24 de março de 2011 às 09h53.
Havana - Os cubanos começaram nesta quarta-feira a discutir, em reuniões em seus trabalhos ou em plena rua, em cada bairro, as reformas econômicas propostas pelo governo de Raúl Castro, em um processo maciço de três meses que busca o aval popular às medidas.
Convocado pelo presidente, o debate popular se realiza em meio a uma intensa campanha de promoção das medidas com vistas ao VI Congresso do Partido Comunista (PCC, único), o primeiro desde 1997, que será celebrado em abril, com um atraso de nove anos.
"O povo é quem decide", intitulou na primeira página o jornal do PCC, Granma, ao pedir à população expor seu "critério", mas "dentro do âmbito da Revolução" porque "o que está em jogo é o futuro" do país.
O ponto de vista da discussão é um documento de 32 páginas com 291 temas considerados urgentes por Raúl Castro para tirar a ilha da prostração econômica e evitar que a Revolução fracasse, confrontada pela inevitável morte de seus líderes históricos, que estão na casa dos 80 anos.
O governo aposta em mudar, sem se voltar para o capitalismo, o modelo centralizado - herdado da antiga União Soviética - de um Estado que controla 90% da economia, desmontar o paternalismo estabelecido desde a vitória da Revolução, em 1959, que levou Fidel Castro ao poder, e colocar seu país a produzir.
O plano inclui medidas de corte de empregos no Estado - 500.000 até março do mais de um milhão previsto -, a abertura à iniciativa privada e ao capital externo, a descentralização da gestão econômica, a flexibilização do comércio, a eliminação de subsídios e o pagamento de impostos.
Apelando à unidade no PCC e no país, o general Raúl Castro, de 79 anos, sustenta que no projeto estão "as ideias" do seu irmão, Fidel, que lhe cedeu o comando em julho de 2006 quando caiu doente, embora continue sendo o primeiro-secretário do PCC.
Há alguns dias o ex-governante, de 84 anos, se disse satisfeito porque o país "está marchando" com "desafios pela frente" e evocou um histórico discurso no qual, há cinco anos, pediu para que fossem corrigidos "erros" para evitar a "autodestruição" do sistema político cubano.
Desafios enormes em um país que importa 80% dos alimentos, onde 50% da terra está sem cultivar, enquanto as colheitas se perdem porque não são feitas, onde há 8.000 pedreiros e 12.000 pessoas vigiando-os para que não roubem o cimento ou a pintura, ao mesmo tempo em que centenas de casas são erguidas com trilhos roubados da via férrea.
Encabeçada pelo jornal Granma, a imprensa cubana multiplicou seus apelos ao debate, pedindo uma "mudança de mentalidade" de que o "papai Estado" é obrigado a resolver tudo.
"Começamos a viver o processo de destruição da estatização da sociedade", expressou o influente cineasta Alfredo Guevara, amigo de Fidel desde a juventude.
Os cubanos querem mudança: melhores salários - média de 17 dólares -, mais comida, transporte e moradia, mas não querem perder subsídios como a "caderneta", com a qual recebem uma quota de alimentos a preços ínfimos, mas que não dá para duas semanas, nem inclui muitos produtos básicos.
"Estamos acostumados a isto. Não é culpa nossa. Esperamos que as mudanças sejam para o bem do povo. Embora com dúvida por causa dos impostos e dos controles que vejo chegar, vou abrir meu próprio restaurante", disse à AFP Javier, garçom de um destes pequenos restaurantes privados.
Para as pessoas, o interesse está centrado na concessão de 250.000 licenças para pequenos negócios - mais de 81.000 já as solicitaram - e na flexibilização da compra e venda de casas, proibida em Cuba.
"Não há reforma, é uma atualização do modelo econômico. Que ninguém pense que vamos ceder a propridade", disse o ministro da Economia, Marino Murillo.
Raúl Castro afirma que o modelo se "atualiza" sem copiar padrões de outros países, descartando alusões a uma via para a China e o Vietnã, mas seu programa busca oxigênio nas alianças com a Venezuela de Hugo Chávez e o gigante asiático.