Usina hidrelétrica no Brasil. (Cemig/Divulgação)
Bloomberg
Publicado em 4 de outubro de 2021 às 21h31.
Por Peter Millard e Mark Chediak, da Bloomberg
A crise de energia global está prestes a atingir a América do Sul, onde a seca histórica leva a região a buscar alternativas para o colapso na geração hidrelétrica.
O Brasil está à beira de um racionamento de energia e grandes apagões, e precisará se apoiar muito na importação de suprimentos do Uruguai e da Argentina ao longo do próximo mês, até o início da estação chuvosa e reabastecimento das represas. Isso deve sobrecarregar todo o continente, pois países como Chile também esperam contar com o gás argentino para enfrentar a própria crise hídrica.
A América do Sul, em muitos aspectos, tem estado em vantagem no que diz respeito à transição energética. O Brasil se apoia em usinas hidrelétricas há décadas e normalmente usaria a fonte para mais de 60% da eletricidade do país. Mas a mudança climática interfere nessa dinâmica à medida que secas prolongadas e cada vez piores atingem a região, tornando a energia hidrelétrica cada vez menos confiável.
Agora o continente terá que competir pelo gás natural como combustível alternativo, da mesma forma que muitos países, com Europa e China também diante da escassez de energia.
Com o aumento da demanda de exportação, os preços do gás dispararam. Os contratos futuros negociados em Nova York mais do que dobraram este ano. Na Ásia, os preços do gás natural liquefeito, que é exportado ao redor do mundo, multiplicaram por cinco vezes desde abril, para um recorde.
O momento não poderia ser pior. A América do Sul ainda tenta superar o choque econômico da pandemia, e o aumento das despesas com alimentos e eletricidade pode agravar a pobreza e acelerar a emigração para os Estados Unidos e outras nações ricas. A crise de energia se tornou uma grande dor de cabeça política para o presidente Jair Bolsonaro, cuja popularidade despenca antes das eleições no próximo ano.
“Pode haver uma corrida populista” para baixar os custos, disse Schreiner Parker, vice-presidente para a América Latina da consultoria Rystad Energy.
O nível dos reservatórios de hidrelétricas nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, que representam quase três quartos da capacidade instalada do Brasil, caiu para 17% da capacidade em meio à pior seca em 91 anos. O volume de geração de energia da Itaipu Binacional está no patamar mais baixo desde 1993 em uma base anualizada.
Ainda assim, a situação energética da América Latina não é uniforme. Enquanto no Brasil e Chile a crise é mais acentuada, a Colômbia tem energia de sobra. Devido ao evento climático La Niña, que aumentou o volume de chuvas no nordeste da América do Sul, o nível das represas colombianas subiu para uma máxima histórica de 86%, quase o dobro do registrado há um ano. A geração hidrelétrica responde por até três quartos da matriz energética do país.
“Isso significa que o preço da eletricidade tem sido basicamente zero nos últimos três meses no mercado à vista à vista”, disse o ministro de Minas e Energia da Colômbia, Diego Mesa, em entrevista na quinta-feira na sede da Bloomberg em Nova York.
Mas, para o Brasil e outros países, a situação pode ficar ainda mais desafiadora.
O La Niña deve atrasar a estação chuvosa no cone sul do continente e tornar 2022 um ano ainda mais difícil para a energia hidrelétrica. Há mais de 70% de probabilidade de que o La Niña, causado por variações nas temperaturas da superfície do oceano, se forme no Pacífico Equatorial entre novembro e janeiro, disse o Centro de Previsão do Clima dos EUA no início de setembro.
Isso quase certamente significaria outro período de seca tanto para o oeste dos Estados Unidos, quanto para o sul do Brasil e Argentina. As regiões foram atingidas por um La Niña no final de 2020 e início de 2021.
“Esta é minha maior preocupação”, disse Gabriel Dufflis, analista-chefe da equipe de pesquisa para o setor elétrico do Brasil da Wood Mackenzie. “Se isso acontecer, começaremos mal a estação seca de 2022.”
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