Primeiro-ministro de Israel Benjamin Netanyahu com o presidente americano Donald Trump, dia 15/02/2017 (Kevin Lamarque/Reuters)
EFE
Publicado em 4 de março de 2017 às 12h00.
Jerusalém -- O crescimento sem precedentes de incidentes antissemitas nos Estados Unidos preocupa Israel e, embora as autoridades do Estado judeu garantam que "confiam" na nova administração do presidente americano Donald Trump, aumentam as vozes que pedem que mensagens mais contundentes sejam direcionadas à Casa Branca.
Nas últimas semanas, dois cemitérios judeus foram profanados, cerca de 50 centros comunitários e colégios sofreram ameaças de bomba e foram evacuados, e se multiplicaram os incidentes antissemitas, como pichações no metrô de Nova York que diziam que "os judeus deveriam estar nos fornos".
Em Israel aumenta a sensação de que Trump olha para outro lado e minimiza o ocorrido e, embora exista o cuidado nas esferas oficiais de não acusar seu governo, eles acreditam cada vez mais que é preciso exigir maior firmeza.
"O aumento do antissemitismo nos EUA é um desenvolvimento da direita do espectro político. Os antissemitas na direita americana nunca desapareceram, só foram marginalizados", declarou à Agência Efe Carole Nuriel, diretora da Liga Antidifamação (ADL, sigla em inglês).
"Os supremacistas brancos, simpatizantes da KKK (Ku Klux Klan) e neonazistas sempre existiram, o que mudou é o impacto do nível de discurso que surgiu durante a campanha presidencial", afirmou Nuriel.
A diretora da ADL evitou acusar diretamente Trump e seu entorno, mas afirma que é "um caso clássico de abrir as comportas do antissemitismo, não apontando para os judeus, mas legitimando e não lutando contra o discurso de ódio de todo tipo", o que cria um clima no qual "aqueles que odeiam ganham coragem e se sentem com poder".
Segundo a ADL, a onda antissemita começou durante a campanha eleitoral, com assédio a judeus e retóricas incendiárias.
Trump denunciou esses atos e se declarou "o homem menos antissemita do mundo", mas foi reprovado em Israel por ter agido tarde e com cuidado excessivo, talvez para não gerar insatisfação na parte de seu eleitorado mais próximo da extrema-direita.
Quem também foi criticado foi o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, que nesta situação e depois, quando a Casa Branca não mencionou os judeus como vítimas do Holocausto em sua cerimônia internacional, parabenizou Trump por "manter uma posição firme contra o antissemitismo".
A imprensa criticou o presidente americano por evitar responder em duas ocasiões em entrevista coletiva a perguntas sobre o antissemitismo e por mandar um jornalista judeu se calar.
"(O problema) não é resultado das políticas ou atitudes da Administração Trump, mas há extremistas nazistas e racistas que subiram na crista da onda de sua eleição e agora sentem que têm poder para fazer coisas que não fariam antes", explicou à Efe Zalman Shoval, ex-embaixador israelense nos EUA nos anos 1990.
Diante de "incidentes diários", a Casa Branca não deve "limitar-se a fazer declarações e bons gestos, mas deve mobilizar toda a força da lei e da polícia contra grupos que realizam atos antissemitas ou racistas em geral", opinou Shoval.
O diplomata acrescentou que Israel deve distinguir entre as relações com os EUA e a firmeza na defesa dos judeus, dos quais 40% vivem nesse país.
Mais enfático é o correspondente e editor-chefe nos EUA do jornal "Haaretz", Chemi Shalev, que acredita que "o presidente Donald Trump escolheu fechar os olhos, no melhor dos casos, ou está sendo ajudado e instigado, no pior".
Para o jornalista, Trump se cercou de "apologistas, muitos deles judeus", que "lidam com os ataques superficialmente, ridicularizam a crescente apreensão judaica e absolvem Trump de toda cumplicidade" na "explosão de animosidade contra os judeus".
Shalev lembrou que Trump "esteve brincando com fogo antissemita desde que começou sua campanha presidencial" e "enviou mensagens subliminares" de tolerância aos que odeiam os judeus.
"Estamos preocupados. São incidentes graves, mas temos fé que as autoridades dos EUA encontrarão os culpados e lutarão contra isto. Trump declarou que não é antissemita e se posicionou contra essas ações", disse à Efe a porta-voz das Relações Exteriores de Israel, Michal Maayan.
O líder da oposição israelense, Isaac Herzog, advertiu que Israel deve se preparar para uma onda de imigrantes judeus que provavelmente deixarão EUA e França.
Um funcionário israelense que pediu anonimato declarou à Efe que há inquietação pelo fato de que algumas pessoas que cercam Trump "fazem parte de organizações preocupantes", mas ressaltou que seu entorno também tem influência da comunidade judaica, incluída a de seu genro e assessor, Jared Kushner.
Shalev advertiu que, se esta tendência continuar, "os antissemitas e os que odeiam os judeus podem se sentir encorajados, especialmente se continuarem percebendo, corretamente ou não, que há tolerância no mais alto escalão".