Agência de notícias
Publicado em 15 de setembro de 2024 às 16h18.
A economia do México entrou em um caminho desconhecido e incerto para negócios e crescimento, após a aprovação de uma reforma que torna o país da América do Norte o primeiro a eleger todos os seus juízes por voto popular.
Agências de classificação como a Moody's, analistas e empresários alertam que a emenda constitucional pode enfraquecer a solidez e as finanças da 12ª maior economia do mundo, ao "erodir" o equilíbrio entre os poderes e enfraquecer suas instituições.
O presidente de esquerda Andrés Manuel López Obrador, para quem a reforma era necessária para combater a corrupção, desconsidera esses alertas e afirma que seu governo atraiu números "recordes" de investimento estrangeiro.
Mas o que implica a mudança constitucional para o investimento, o comércio e o crescimento?
O núcleo das preocupações é o temor de ver um Judiciário deteriorado como contrapeso ao Executivo e ao Legislativo, alerta um relatório da Moody's.
"A nova lei pode politizar as decisões da Suprema Corte", além de "comprometer a independência do sistema", disse a agência.
Investidores alertam que, com juízes dependentes de eleições, "haveria uma tendência a tomar decisões baseadas no que ressoe bem entre os eleitores", diz Jason Marczak, vice-presidente do centro Adrienne Arsht para a América Latina, parte do think tank Atlantic Council.
Durante o mandato de López Obrador, sentenças da Suprema Corte e de outros tribunais frearam o impacto sobre empresas de outra iniciativa legislativa que buscava ampliar o controle estatal sobre o setor elétrico.
"O sistema judicial já bloqueou anteriormente mudanças legais radicais", destaca a Moody's, que mantém o México com nota Baa2, dentro do grau de investimento, e perspectiva estável.
A reforma, no entanto, representa um "impacto negativo alto" para a classificação soberana, segundo a agência.
As mudanças poderiam alterar o marco legal do comércio exterior mexicano, altamente concentrado nos Estados Unidos e no Canadá, seus parceiros do T-MEC, com os quais o país trocou mercadorias no valor de cerca de 750 bilhões de dólares (R$ 4,18 trilhões na cotação atual) em 2023.
A regulamentação rigorosa que o tratado estabelece para setores como o automotivo ou para resolver conflitos trabalhistas poderia ser afetada por juízes mais preocupados com os eleitores do que com as leis.
Preocupa que "os juízes não considerem apenas a legislação mexicana e os acordos com os Estados Unidos e o Canadá como parte do T-MEC", acrescenta Marczak.
A reconfiguração do Judiciário também pesará em uma revisão do T-MEC, prevista para 2026.
"Já seria uma revisão muito polêmica, mas se adicionarmos essa enorme reforma (...) isso fará com que o México se torne muito mais vulnerável", aponta Carlos Ramírez, sócio da consultoria Integralia.
As mudanças no sistema judicial "seriam particularmente prejudiciais" para futuros investimentos de relocalização de empresas da Ásia para o México, alerta a Moody's.
Essa tendência, conhecida como "nearshoring", busca aproveitar as melhores condições logísticas e geopolíticas que o México oferece para abastecer o mercado americano e se apresenta como uma grande esperança para impulsionar o crescimento a longo prazo.
Embora seja improvável que esses fluxos de investimento parem completamente, especialistas consideram que a reforma poderia esfriar o entusiasmo de muitas companhias.
"As reformas trarão um nível adicional de questionamentos nos conselhos de administração" das empresas, preocupados com a certeza jurídica de seus investimentos, disse Marczak.
López Obrador minimiza essas previsões e afirma que 2024 será "o ano com mais investimento estrangeiro na história do México".
Possíveis prejuízos ao investimento e ao comércio afetariam, finalmente, o crescimento esperado do PIB, que antes da reforma já foi reduzido pelo Banco do México (central), de 2,4% para 1,5% para este ano e de 1,5% para 1,2% para 2025.
"É muito possível, por causa da reforma ao Poder Judiciário, que a economia mexicana entre em um longo estancamento" e não se descarta uma "recessão", disse na rede social X Gabriela Siller, diretora de análise do banco Base.
Como prenúncio, o peso mexicano atingiu as mínimas em dois anos justo antes da aprovação parlamentar, mas se valorizou na sequência com a realização de lucros.
A consultoria Oxford Economics aponta que, embora a reforma não reduza imediatamente o crescimento, esfriará o investimento privado, que pode cair até 12% abaixo do previsto, arrastando o PIB com ele.
A Moody's, por sua vez, concorda que "um choque prolongado de confiança" frearia o investimento empresarial e reduziria o crescimento após 2025.