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Com multa ao BNP, hegemonia do dólar volta a ser questionada

Uso da moeda obriga a cumprir a legislação norte-americana

Multa recorde deverá ser paga pelo banco francês BNP (Pascal Guyot/AFP)

Multa recorde deverá ser paga pelo banco francês BNP (Pascal Guyot/AFP)

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Da Redação

Publicado em 1 de julho de 2014 às 16h27.

Paris - A multa recorde que deverá ser paga pelo banco francês BNP por suas transações em dólares com países sob embargo nos Estados Unidos coloca novamente em discussão a hegemonia do dólar, que o uso obriga a cumprir a legislação norte-americana.

O BNP foi sancionado por operações que, apesar de serem legais na França e na Europa, entram na jurisdição americana por terem sido realizadas em dólar.

"A extraterritorialidade das normas dos Estados Unidos, relacionadas ao uso do dólar, precisa levar a Europa a se mobilizar para o progressivo uso do euro como moeda internacional", disse o ministro francês de Finanças, Michel Sapin, pouco depois de tomar conhecimento da multa de 8,9 bilhões de dólares aplicada ao banco.

Na segunda-feira, o BNP assumiu para as autoridades norte-americanas que havia realizado operações em dólar com Cuba, Irã e Sudão, três países sob o embargo de Washington, e aceitou sofrer a sanção para evitar um processo penal.

Em 1964, o ministro das Finanças francês, Valéry Giscard d'Estaing, que seria presidente dez anos mais tarde, lamentou o "privilégio exorbitante" dos Estados Unidos de ser o único país do mundo a poder se endividar na sua própria moeda, o que significa um poder de endividamento quase indefinido, graças à força do dólar.

Em 1971, o secretário norte-americano de Tesouro, John Connally, resumiu com uma frase a posição de seu país em relação às queixas europeias: "O dólar é nossa moeda, mas é problema de vocês".

Nos últimos 40 anos a situação não mudou e, de acordo com o Fundo Monetário Internacional, em 2013 61,2% das reservas dos bancos centrais do mundo eram em dólares.

Além disso, 87% de todas as operações de câmbio feitas em abril de 2013 foram em dólares, segundo o Banco de Pagamentos Internacionais (BPI). Em outubro do ano passado, a moeda foi usada em 81,08% das operações de financiamento comercial, segundo o cálculo da empresa belga SWIFT.

Para Jérôme Sgard, professor de Ciências Política da SciencesPo, em Paris, o que mudou foram as implicações jurídicas da hegemonia da moeda, por causa do chamado "sistema de compensação".

Cada vez que uma transação em dólares é feita no mundo, que se muda um lançamento contábil ou que se realiza uma transferência, essas operações ficam registradas em um sistema de informática americano chamado "de compensação", que em teoria garante a segurança dos intercâmbios. É esse registro que permite à justiça norte-americana verificar a legalidade das operações.

A grande maioria das operações de compra e venda de matérias-primas, de petróleo e de vários produtos, como aviões, é feita em dólares.

É o caso do grupo Airbus, que vende em dólares seus aviões de fabricação europeia para Rússia e China. Alguns países como o Irã tentam evitar o dólar e vendem seu petróleo em troca de ouro e outras divisas.

A China também já troca desde de abril de 2013 a sua moeda, o yuan, pelo iene japonês e acaba de anunciar uma câmara de compensação para sua moeda em vários países europeus.

No entanto, de acordo com especialistas, a moeda chinesa não poderá se impor enquanto Pequim não autorizar o câmbio flutuante. "Há muito tempo se fala em pagar o petróleo em yuanes ou os Airbus em euros, mas as coisas continuam iguais", lembra o professor Jérôme Sgard.

Usar sempre o dólar tem, entretanto, vantagens, como a de reduzir o número de operações e a de controlar melhor os preços.

Sgard afirma que só uma "ruptura" permitirá transformar a hegemonia atual do dólar e recorda que as duas guerras mundiais foram determinantes para pôr fim à preponderância da libra esterlina.

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