Menino refugiado encontrado morto na costa da Turquia: chanceler alemã, Angela Merkel, mencionou "cotas obrigatórias" (REUTERS)
Da Redação
Publicado em 4 de setembro de 2015 às 07h33.
A União Europeia, chocada com a foto do corpo de um menino sírio em uma praia turca, tentava nesta quinta-feira superar suas divisões em meio aos apelos de solidariedade e firmeza ante a aceleração da crise humanitária dos migrantes.
Em um contexto de crescentes tensões entre os países europeus, a Alemanha e a França decidiram tomar medidas com o lançamento de uma iniciativa conjunta para "organizar a recepção dos refugiados e sua distribuição equitativa na Europa".
A chanceler alemã, Angela Merkel, mencionou "cotas obrigatórias", enquanto o presidente francês, François Hollande, evocou um "mecanismo permanente e obrigatório" para tratar da questão dos imigrantes.
Trata-se também de "assegurar o regresso de migrantes ilegais aos seus países de origem" e ajudar os "países de origem e de trânsito", segundo a presidência francesa.
O primeiro-ministro britânico, David Cameron, criticado por sua falta de envolvimento na crise, se mostrou "profundamente comovido" com a tragédia e deve anunciar o recebimento de "milhares" de refugiados sírios na Grã-Bretanha.
Os quatro candidatos às primárias do Partido Trabalhista pediram que a Grã-Bretanha faça "muito mais", em seu último debate na TV, na noite desta quinta-feira.
Os ministros de Relações Exteriores da Europa se reúnem nesta sexta, em Luxemburgo, para analisar propostas.
Em Bruxelas, ante os líderes europeus, a Hungria culpou a Alemanha pelo fluxo maciço de requerentes de asilo. Ela denunciou um "problema alemão", ao invés de um europeu, e rejeitou as críticas sobre a cerca de arame farpado erguida em sua fronteira com a Sérvia.
Enquanto a imagem de Aylan Kurdi, de 3 anos, deitado sem vida em uma praia em Bodrum, na Turquia, continuava nesta quinta-feira a provocar forte emoção e raiva, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, acusou os países europeus de ter transformado o Mediterrâneo em "cemitério de migrantes".
O vice-presidente da Comissão Europeia, Frans Timmermans, considerou se tratar de "uma crise humanitária e política sem precedentes" na Europa, e apelou para "encontrar respostas europeias para um problema que não pode ser resolvido por Estados individualmente".
Ante o choque, os líderes europeus ressaltaram a "urgência de agir" e reclamaram medidas fortes dentro da UE.
Mais 120.000 refugiados
Uma distribuição equitativa dos refugiados entre os países europeus é uma prioridade da Comissão Europeia, que deve apresentar em 9 de setembro perante o Parlamento em Estrasburgo novas propostas.
A Comissão quer um mecanismo de alocação permanente, mas dada a urgência vivida por países como a Hungria, Itália ou Grécia, seu presidente Jean-Claude Juncker vai "pedir aos Estados membros para distribuir em caráter emergencial 120.000 refugiados dentro da UE", indicou nesta quinta-feira uma fonte europeia à AFP.
O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, também pediu aos países europeus para "redobrarem os seus esforços de solidariedade", dividindo a recepção de "pelo menos 100.000 refugiados".
Portugal já manifestou a sua disponibilidade para acolher "um número bem mais significativo" de refugiados dos que os 1.500 propostos até agora.
Mas a tarefa não será fácil, dada a forte relutância de muitos Estados depois de uma solicitação anterior da Comissão quer que os países da UE compartilham os 40.000 requerentes de asilo na Grécia e Itália.
Donald Tusk não escondeu sua preocupação com a "divisão entre o Leste e o Oeste da União Europeia".
"Alguns Estados pensam apenas em conter a onda de migrantes, o que é simbolizado pela polêmica cerca na Hungria, enquanto outros querem mais solidariedade", lamentou.
Ilustrando essas divisões, o primeiro-ministro húngaro Viktor Orban, na defensiva, disse que "não era um problema europeu, mas sim alemão", enquanto que o presidente do Parlamento, Speaker Martin Schulz, acabara de apelar a uma resposta Europeia.
"Ninguém quer ficar na Hungria, Eslováquia, Estônia, Polônia. Todo mundo quer ir para a Alemanha. Nosso trabalho é apenas registrá-los e vamos registrá-los", disse Orban, para quem o fluxo maciço de imigrantes ameaça as "raízes cristãs" da Europa.
Hungria na linha de frente
Na parte da manhã, na Hungria, centenas de migrantes invadiram a principal estação ferroviária de Budapeste, que acabara de ser reaberta pela polícia em meio ao caos, antes do anúncio de que nenhum trem internacional partiria.
Um comboio que transportava mais de 200 migrantes acabou partindo para a Áustria, mas foi parado quarenta quilômetros depois, com as autoridades forçando seus passageiros a irem para um campo de refugiados vizinho.
Como a Hungria, a Áustria também criticou Berlim, que decidiu parar de devolver os requerentes de asilo sírios para o país de entrada na UE.
A questão de uma mudança nos acordos de Dublin, que regulam, em princípio, os cuidados de refugiados na UE, deve ser tratada em uma reunião de ministros europeus do Interior em 14 de setembro, em Bruxelas.
Na quarta-feira, antes do anúncio da iniciativa franco-alemã sobre a divisão dos refugiados, Paris e Berlim se juntaram à Roma, em uma carta de seus ministros das Relações Exteriores, pedindo uma revisão do direito de asilo na Europa.
Mais de 230.000 migrantes chegaram na Grécia por mar desde o início do ano, contra cerca de 17.500 no mesmo período em 2014, segundo indicou nesta quinta-feira o vice-ministro grego da Marinha Mercante, Nikos Zois.
"Mais de 80%" destas chegadas, registradas pela Guarda Costeira do país, "são de refugiados", disse ele.
A chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, apelou nesta quinta-feira para reforçar a luta contra as redes de tráfico humano, exigindo que a operação naval da União Europeia se concentre mais diretamente nos traficantes de migrantes "nas próximas semanas".