#NiñasNoMadres: hashtag ganhou força depois de menina de 11 anos ser submetida à uma cesárea sem seu consentimento ou de seus pais (Instagram/Reprodução)
Tamires Vitorio
Publicado em 28 de fevereiro de 2019 às 17h18.
Última atualização em 28 de fevereiro de 2019 às 19h06.
São Paulo — Lúcia, uma menina de 11 anos, foi abusada sexualmente pelo namorado de sua avó em Tucumán, na Argentina, e entrou com um pedido para a realização de um aborto. No país, o procedimento é legal em algumas condições, como má formação do feto, se a gravidez colocar em risco a saúde da mãe ou (como aconteceu com Lúcia) em casos de estupro.
A gravidez foi descoberta quando estava perto de completar cinco meses. A família então entrou com o pedido formal para a realização do aborto no fim de janeiro, mas ele demorou cerca de três semanas para ser acatado. "Eu quero que tirem o que o velho colocou em mim", teria dito ela ao juiz do caso.
No entanto, nesta quarta-feira (27) (quando o procedimento deveria acontecer), a médica Cecília Ousset desistiu de realizar o aborto e, em vez disso, fez o parto por cesárea na criança alegando que "seria arriscado abortar", mas que não havia como a menina completar a gestação porque seu "corpo não estava pronto para uma gravidez de 23 semanas" e que ela "não estava em condições psicológicas por conta dos abusos que sofreu".
Mesmo assim, o bebê prematuro veio ao mundo. Nem a menina e nem a mãe dela foram consultadas previamente. Os médicos afirmaram que as chances de o neném sobreviver são bastante baixas e que o estado de saúde dele é grave.
O estuprador, que tem 65 anos, está preso. A advogada da família afirmou que "a vontade da menina deveria ter sido levada em conta".
Grupos feministas da Argentina se posicionaram contra o caso e afirmaram que os profissionais da área da saúde de Tucumán demoram para acatar pedidos de aborto para que, com a gestação avançada, eles não consigam realizar o procedimento — que é previsto por lei desde 2012.
Também nesta quarta, um grupo de mulheres se organizou para protestar contra a situação. A hashtag #NiñasNoMadres ("Meninas, não mães") está repleta de relatos de meninas que passaram por situações parecidas e tiveram que ter os bebês frutos de estupro mesmo tendo o aborto garantido como direito.
En plaza Independencia se leyó el documento en repudio a Manzur, Chahala, Vigliocco y los cómplices que torturaron a una niña de 11 años violada. Al frente, un grupo de antiderechos rezaban. #NiñasNoMadres pic.twitter.com/7LiNbw3wMH
— La Palta (@LaPalta___) February 27, 2019
A "Campanha Pelo Aborto Legal" pede a investigação e a expulsão dos profissionais envolvidos no caso e afirma que Ousset foi responsável por "torturar" a menina de 11 anos.
No começo de 2019, outro caso parecido esteve no centro do debate sobre o aborto na Argentina e suas implicações: uma menina de 12 anos, que havia sido estuprada por um homem de 60 na província de Jujuy, também foi submetida a uma cesária sem seu consentimento ou de seus pais.
No ano passado, uma proposta de lei que pretendia legalizar totalmente o aborto até a 14ª semana de gestação (cerca de três meses) foi aprovada pela Câmara dos Deputados da Argentina, mas rejeitada pelos senadores.
O novo ano parlamentar argentino se inicia nesta sexta-feira (1) e pode trazer novamente à tona o debate sobre a legalização do aborto.