Vista de Gaza: casamento entre adolescentes, prática comum em outras regiões com poucos recursos econômicos, não costuma ser frequente na Faixa de Gaza (Getty Images)
Da Redação
Publicado em 2 de outubro de 2013 às 13h27.
Faixa de Gaza - Um recente casamento entre dois primos de 15 e 14 anos em Beit Lahia levantou diferentes pontos de vista na Faixa de Gaza, já que a legislação islâmica permite esse tipo de relacionamento intrafamiliar e entre pessoas tão jovens, mas duas questões deste caso não bem vistas na região.
Ahmed, de 15 anos, se casou na semana passada com a prima Tamara, de 14, na cidade de Beit Lahia, no norte de Gaza, em uma cerimônia que reuniu pais, irmãos, parentes e amigos dos noivos.
O casamento entre os adolescentes, prática comum em outras regiões com poucos recursos econômicos, não costuma ser frequente na Faixa de Gaza, e gerou polêmica entre a população, além de ter provocado a rejeição de ativistas de direitos humanos.
Tanto Ahmed como Tamara são membros do clã Sobeh, moradores de uma zona rural onde a tradição e a pobreza se misturam em iguais proporções.
A história do jovem casal de Beit Lahia se espalhou e em poucos dias despertou um debate em Gaza, território sob o controle do grupo islâmico Hamas desde uma ação violenta em junho de 2007.
"O casamento de crianças é um fenômeno que tinha desaparecido há muito tempo. Acho que os pais dos dois adolescentes não receberam boa educação", afirmou Salma Abu Hajjar, uma palestina de 52 anos e mãe de cinco filhos com idades entre 20 e 30 anos.
Enad Sobeh, pai do menino de 15 anos que se casou com a prima, disse se sentir feliz em ver seu primogênito casado tão cedo.
"Queria ver meu filho se casar, e apesar de vivermos em uma situação muito difícil, vendi dois burros para conseguir o dinheiro para o dote e também para custear os convites da cerimônia", afirmou.
A Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinos (UNRWA), que presta assistência aos refugiados na Faixa de Gaza, região com 1,8 milhão de habitantes, anunciou recentemente em comunicado que mais de um milhão de palestinos vive abaixo da linha da pobreza.
Para Hassan al-Joujo, presidente do Conselho de Legislação Islâmica em Gaza, sob controle do Hamas, o casamento entre Ahmed e Tamara é legal e está de acordo com legislação islâmica implementada na Cisjordânia e na faixa desde 1993.
"Ahmed nasceu em fevereiro de 1998, portanto sua idade é completamente legal, e sua esposa Tamara nasceu em janeiro de 1999, e a legislação islâmica também permite que se case", garantiu Joujo, que disse que a ausência de documento de identidade pelos noivos não é motivo suficiente para impedir o matrimônio.
A legislação palestina permite a união entre adolescentes a partir de 15 anos, mas a sociedade de Gaza considera o caso de Ahmed e Tamara bastante excepcional já que a maioria das meninas se casa após completar 18 anos e os homens após os 22.
A diretora do Centro para a Pesquisa e Estudo da Mulher em Gaza, Zeinab al-Ghuneimi, condenou o casamento entre os adolescentes e ressaltou as consequências negativas destes casos nos aspectos psicológico, social e médico, especialmente para as meninas.
"Este casamento é um caso raro. O fenômeno tinha sido esquecido em Gaza devido ao desenvolvimento do nível educacional da população", explicou Zeinab, que também destacou que o aumento da pobreza e da ignorância entre os cidadãos locais se deve ao bloqueio imposto ao território por Israel.
"Os matrimônios entre jovens causam problemas de saúde a ambos devido à falta de experiência nas relações sexuais, além da carga psicológica e das dificuldades enfrentadas pelas meninas após se tornarem mães", ressaltou.
Em Gaza, a maioria das mulheres prefere concluir os estudos até o ensino médio, e até mesmo entrar para a faculdade antes de estabelecer uma vida a dois, e a pobreza e o desemprego se tornaram motivos para deixar o casamento para depois.
Apesar de a legislação islâmica permitir, grupos de direitos humanos em Gaza questionam a legalidade e moralidade do matrimônio entre adolescentes.
Khalil Abu Shamala, diretor do Centro de Direitos Humanos em Gaza, negou que exista uma legislação islâmica sobre o assunto e, em uma rede social, afirmou que se trata de "um crime insuportável que ninguém pode aceitar facilmente".