Kamala Harris (à esq.), Biden e Nancy Pelosi: em discurso no Congresso, presidente reforçou os princípios de maior participação estatal do "Bidenomics" (Michael Reynolds/Pool/Reuters)
Estadão Conteúdo
Publicado em 2 de maio de 2021 às 17h03.
Joe Biden chegou aos 100 dias no comando da Casa Branca com mais promessas cumpridas do que crises. Os próximos 100 dias, no entanto, são mais arriscados para o democrata, que tenta concretizar propostas de transformação do Estado e emplacar uma agenda progressista em uma corrida contra o calendário eleitoral.
Nos primeiros meses, Biden se propôs a vacinar americanos e aprovar um pacote de socorro econômico em meio à pandemia. A primeira meta de imunização foi considerada pouco ambiciosa por especialistas quando lançada, dado o número de doses que já se sabia de antemão que os EUA teriam disponíveis no primeiro semestre.
Já o pacote para reaquecer a economia contou com apoio de todos os democratas no Senado - algo mais difícil nos outros projetos propostos pelo presidente, como a reforma da infraestrutura, que deve custar US$ 2,3 trilhões, ou a ideia de controlar o acesso de armas.
Acumular mais conquistas, portanto, parece mais difícil nos meses que seguem. Mesmo o ritmo da vacinação diminuiu. Depois de imunizar mais da metade dos adultos, Biden enfrenta agora o ceticismo de um terço da população que segue resistente à imunização.
Além de tirar do papel os pacotes já apresentados - o de infraestrutura e o plano de apoio a famílias, que envolve saúde e educação -, ele quer aproveitar a popularidade em torno de 55% e o bom momento político para pressionar o Senado a avançar em uma agenda há muito defendida pela esquerda, como imigração, ampliação no direito de voto e a Lei George Floyd, que daria início a uma reforma policial.
Biden sabe que o tempo não está a seu favor. Ele precisa do Congresso para implementar seus projetos, mas o partido no poder tende a perder cadeiras nas eleições legislativas que acontecem na metade do mandato presidencial nos EUA.
“Desde a Guerra Civil americana, o partido no poder perdeu cadeiras nas eleições de meio de mandato, com apenas três exceções. Supondo que esse padrão se mantenha em 2022, os democratas perderão cadeiras - e eles já não têm muitas. O cenário é: dois anos para uma agenda ambiciosa. Depois disso, podem cancelar todas as apostas”, afirma Vincent Hutchings, especialista em ciência política e professor da Universidade de Michigan.
O calendário político das próximas eleições legislativas, marcadas para novembro de 2022, pressiona Biden no curto prazo. Ele não quer que o pacote de infraestrutura seja postergado para o segundo semestre deste ano. Seus assessores dizem que estender as negociações com os republicanos no primeiro ano de mandato do presidente Barack Obama, em busca de soluções bipartidárias, deu à oposição a chance de veicular seus argumentos entre eleitores e ganhar musculatura para a disputa legislativa em 2010.
“Biden aprendeu com os erros de Obama, que buscou o bipartidarismo e quase enterrou o Obamacare. Ele não vai permitir que as negociações se arrastem para sempre”, afirma Gary Nordlinger, professor da George Washington e especialista em estratégia política.
A busca do democrata por consenso, na época em que foi senador e vice-presidente, era apontada como uma possível fragilidade do seu governo. Mas ele não hesitou em deixar a oposição para trás e avançar no seu primeiro pacote econômico proposto (e único aprovado) sem nem um voto sequer dos republicanos. Numa tentativa de redesenhar o conceito de bipartidarismo, a Casa Branca argumenta que os eleitores conservadores apoiaram o plano econômico.
Biden quer resultados nas negociações do pacote de infraestrutura até o fim de maio. Para questões que envolvam orçamento, a Casa Branca pode contar com a manobra conhecida como “reconciliação”. O mecanismo permite que um projeto seja aprovado com maioria simples.
Foi assim em março. Com um Senado dividido entre 50 cadeiras para republicanos e 50 para democratas, Biden precisa ter a seu favor todos os senadores do seu partido. O voto de desempate é da vice, Kamala Harris.
Para temas em que não há discussão orçamentária, como controle de armas, a oposição pode obstruir a votação - o instrumento chamado de “filibuster”. Com isso, o governo precisaria de 60 dos 100 votos no Senado para aprovar projetos.
Parte dos democratas defende o fim da regra que permite obstruir uma votação, o que só depende de 51 votos no Senado. Sem a mudança, argumentam, não será possível discutir questões importantes da agenda progressista. Nos próximos 100 dias, Biden precisa decidir se o governo apoia ou não a mudança na regra, e se consagra como capaz de empreender uma agenda progressista. “Biden está fazendo coisas grandes, mas pode abrir mão de aprovar tudo para conseguir aprovar alguma coisa”, afirma Hutchings.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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