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“Banir a sacolinha não vai tornar o Brasil uma potência verde”

Para o presidente da Plastivida, Miguel Bahiense, o grande vilão ambiental do país é o desperdício, associado a um sistema de coleta seletiva que deixa muito a desejar

Miguel Bahiense, da Plastivida: "Não uso ecobag porque sei que é pior" (Vanessa Barbosa)

Miguel Bahiense, da Plastivida: "Não uso ecobag porque sei que é pior" (Vanessa Barbosa)

Vanessa Barbosa

Vanessa Barbosa

Publicado em 24 de maio de 2011 às 10h42.

São Paulo – A sacolinha plástica está no banco dos réus. Na semana passada, São Paulo, a maior capital brasileira, proibiu a distribuição da embalagem pelo comércio. Em março, Belo Horizonte já havia aprovado uma lei semelhante. O movimento é endossado por argumentos ambientalistas contrários aos efeitos supostamente negativos que a sacolinha teria sobre a natureza – entre eles, o fato de ser feita com uma resina do petróleo e demorar até quatro séculos para se decompor.

Mas há controvérsias. “A Ciência já comprovou que a sacolinha de plástico é sustentável e faz bem para o meio ambiente”, defende Miguel Bahiense, presidente da Plastivida e do Instituto Nacional do Plástico (INP). Engenheiro químico por formação, ele tem se posicionado contra o banimento e em favor do consumo responsável das sacolinhas.

Em entrevista à EXAME.com, Bahiense diz que o problema ambiental do Brasil chama-se desperdício, que a lei da sacolinha não tem nada de ‘verde’ e que alternativas como o plástico biodegradável, feito de milho, estão longe de ser a solução. Confira

EXAME.com – Nos últimos anos, a sacolinha virou um vilão ambiental. Como o setor de plástico tem acompanhado essa questão?

Miguel Bahiense –
Nós entendemos que o problema não é do produto em si, mas do desperdício. Há muito tempo, as sacolinhas eram fabricadas com uma espessura que suportava de 6 a 7kg. Até que, na tentativa de reduzir os custos de produção para a indústria e baratear a compra pelo comércio, ela foi ficando mais fina e frágil. Com o tempo, o consumidor começou a colocar uma sacola dentro da outra para reforçar. Aí surgiu um negócio que não existia: o desperdício. Chegamos a um momento em que a profusão de sacola era tamanha que começou a chamar muita atenção. Sem um destino certo, um plástico descartado em um rio, não afunda, ele boia e fica bem visível. A partir daí o discurso ambiental contra sacolinha ganhou força.

EXAME.com –
A Plastivida esteve à frente de um campanha pela redução do uso de sacolinhas em 2008. Não é contraditório que o setor estimule o uso consciente? Afinal, para o fabricante é interessante vender sempre mais... 

Miguel Bahiense – Quando o programa foi implementado, havia um aumento crescente da opinião pública sobre o que se via no mercado. A indústria enxergou esse problema e pensou: ‘ou a gente passa a trabalhar de forma correta ou o nosso negócio vai acabar, porque a cobrança ambiental é crescente’. Através do INP, reavaliamos a norma técnica para fabricação de sacolas de forma que ela tivesse uma resistência maior.

Em paralelo começamos a educar os fabricantes para que produzissem sacolas dentro da norma. Aos varejistas, mostramos que se optassem por um produto de qualidade, eles ajudariam a reduzir o desperdício. O resultado foi significativo. Em 2008, eram fabricadas 17,9 bilhões de sacolas. Em 2010, foram 13,9 bilhões. A estimativa até o final de 2011 é reduzir em mais 700 milhões de sacolas.

EXAME.com – Restringir o uso da sacolinha por lei não ajuda a solucionar o problema do desperdício?

Miguel Bahiense – A lei da sacolinha não tem nada de sustentável. Sustentabilidade é um tripé, que só se mantém se os três pilares (o econômico, o social e o ambiental) forem atuantes. Leis como a de São Paulo não atendem à nenhum deles. Do ponto de vista ambiental, os estudos mostram que a sacola não é o problema, ela, ao contrário tem o melhor desempenho ambiental quando comparada a outras alternativas.


Segundo um estudo inglês, de nove categorias ambientais avaliadas, a sacolinha teve o melhor desempenho em oito delas. E em segundo lugar, ficaram as ecobags de plástico. Então o plástico se mostrou um produto essencial do ponto de vista ambiental.

EXAME.com – O Brasil sediou a ECO-92, ano que vem teremos a conferência do clima, a RIO+20, e em paralelo há uma política nacional de resíduos sólidos sendo implementada. Será que o banimento das sacolinhas não iria acontecer mais cedo ou mais tarde num país que quer se tornar uma potência ambiental?

Miguel Bahiense –
Banir a sacolinha não vai tornar o Brasil uma potência verde. É muito fácil culpar algo específico do que olhar o próprio umbigo e reconhecer a sua parcela de culpa no problema. De um lado, a indústria errou por ter fabricado o que o supermercado pedia – uma sacola sem qualidade, mas barata para o cliente e de baixo custo de produção. Do outro lado, o varejo agiu errado ao demandar uma sacola fora da norma.

E acima disso tudo, tem o poder público incapaz de reconhecer as suas falhas, de não oferecer uma simples coleta de lixo eficiente, muito menos uma coleta seletiva eficaz em todo país. Apenas 4% dos municípios têm algum tipo de coleta seletiva. Como você espera que um produto – seja ele saco plástico, copo, garrafa de vidro – seja reciclado por aqui? Hoje, apenas 20% do plástico produzido no Brasil é reciclado. Temos uma indústria de reciclagem ociosa.

EXAME.com –
Afinal, qual a parcela de culpa das sacolinhas plásticas na questão ambiental? Considerando que ela vem de uma resina feita de petróleo e demora quase 400 anos para desaparecer...

Miguel Bahiense –
Mas que bom que ela demora todo esse tempo. Que ótimo. Tudo o que é fabricado traz um impacto ambiental, tem uma pegada de carbono. Quando eu produzo uma sacolinha, o carbono do petróleo virou um produto e esse produto não se degrada, porque o carbono está aprisionado ali, ou seja, ele não contribui em absolutamente nada para o problema do efeito estufa. Sobre a origem fóssil, apenas 4% de todo o petróleo extraído do mundo é aplicado na produção de plásticos.

Aliás, essa é a aplicação mais inteligente do petróleo que existe, pra fazer plástico. Pior são os 88% de petróleo extraídos do mundo e usados para calefação em países frios e no transporte. Essas são as aplicações mais estúpidas do petróleo, porque extrai o carbono da terra, e durante a queima, emite o carbono para a atmosfera.



EXAME.com –
Agora há outros tipos de plástico, considerados mais sustentáveis, como o de milho, o verde de cana-de-açúcar, o oxidegradável...Qual o de menor impacto ambiental?

Miguel Bahiense – O plástico comum tem como matéria-prima o petróleo, não renovável. O de cana de açúcar tem, ao final de sua vida, as mesmas características do plástico comum, mas sua origem é renovável. Esse saco tem ainda uma característica curiosa, enquanto a cana tá crescendo ela está tirando CO2 da atmosfera, ela tem uma contribuição ambiental importante do ponto de vista da pegada ambiental. Mas ainda trata-se de um produto novo, com tecnologia em desenvolvimento e de custo elevado.

Já o oxidegradável é um plástico de petróleo ou de cana que recebe um aditivo que acelera o processo de degradação. O plástico biodegradável, de milho, por exemplo, tem esse processo de retirada de carbono, mas em determinado momento se a biodegradação ocorre ele emite o carbono, coisa que não acontece nos outros dois.

EXAME.com – Quer dizer que o saco comum é melhor que o biodegradável?

Miguel Bahiense – Hoje a ciência mostra que um plástico biodegradável tem um desempenho ambiental muito pior que o de petróleo, o que parece um absurdo, mas é verdade. Vejamos o saco biodegradável feito de amido de milho, matéria-prima renovável e que demora 180 dias para se decompor. De fato, temos uma melhora significativa na mudança de fonte. Mas essa sacolinha também emite gás, CO2 ou metano, dependendo do meio.

Mas num aterro sanitário não existem condições pra que a biodegradação aconteça, seria preciso uma usina de compostagem pra fazer isso.    Imagine se 70% do volume de lixo gerado em são Paulo, de 11 mil toneladas/ dia, fosse biodegradado todo dia. Seria tão nocivo para a questão do aquecimento global, como a emissão de gás metano pela população mundial de vacas.

EXAME.com –
O senhor usa Ecobag?

Miguel Bahiense –
Eu não tenho ecobag porque sei que é pior. A sacola comum, fabricada dentro da norma, é melhor que uma ecobag de pano. Eu gostaria que as pessoas tivessem o mesmo nível de entendimento que tenho pra entender isso. Sem a sacola comum, a segunda melhor opção é a ecobag de plástico, e se eu não tiver nenhuma dessas duas, realmente não sei qual a melhor opção. Não é porque sou presidente de uma entidade que defende a sacola. É porque tenho a informação de que essa é a melhor opção do ponto de vista ambiental, social e econômico.

Veja bem, dependendo de como for usada a sacola plástica também pode ser considerada uma ecobag, que nada mais é do que uma sacola reutilizável, que você usa várias vezes. Se eu tenho uma sacola plástica com qualidade que aguante 6kg, será que a sacolinha plástica, hoje vista como vilã, não viraria uma ecobag, não seria retornável?

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