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“Autogolpe” na Venezuela? Entenda o que está acontecendo

A corte máxima do país assumiu os poderes da Assembleia Nacional e retirou a imunidade de seus parlamentares. No meio dessa crise, a população sofre

Crise na Venezuela (Carlos Garcia Rawlins/Reuters)

Crise na Venezuela (Carlos Garcia Rawlins/Reuters)

Gabriela Ruic

Gabriela Ruic

Publicado em 1 de abril de 2017 às 07h00.

Última atualização em 1 de abril de 2017 às 07h00.

São Paulo – A Venezuela está em chamas. Nesta semana, o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), corte máxima do país, assumiu os poderes da Assembleia Nacional, hoje dominada por opositores do presidente Nicolás Maduro.

Para essa oposição, o ato foi visto como um golpe de Estado, já que consideram que o TSJ atua em nome da presidência. O governo, por sua vez, negou essa alegação e celebrou a decisão da corte, dizendo que “as instituições adotaram corretivos legais para deter a desviada e golpista situação dos parlamentares opositores”.

Por sua vez, a Organização dos Estados Americanos (OEA), entidade regional que reúne os 35 países das Américas e que tem como um de seus objetivos garantir as instituições democráticas na região, enxergou a situação como um “autogolpe”.

O governo da Venezuela foi ainda criticado pelo Brasil, que classificou o incidente como “rompimento da ordem constitucional”. A União Europeia (UE) quer do país um calendário claro de eleições e que a Assembleia Nacional e seus parlamentares sejam respeitados. Já a Organização das Nações Unidas (ONU) pediu que a corte reconsiderasse sua posição.

O clima é de incertezas e a crise política que vinha tomando força desde o início do ano passado enfrenta o seu momento mais delicado. Abaixo, EXAME.com reuniu alguns dos pontos mais importantes em torno desse tema.

Como chegamos aqui?

Em janeiro do ano passado, a hegemonia chavista no legislativo chegou ao fim quando a maioria do Parlamento passou para as mãos da oposição. Na ocasião, o TSJ declarou os membros da Assembleia Nacional em “desacato”, por terem concedido a posse a três deputados acusados de fraude eleitoral.

Ainda em janeiro passado, Maduro chegou a decretar estado de emergência econômica por 60 dias, numa tentativa de contornar a grave crise que o país atravessa.

Críticos alegaram, no entanto, que esse “estado de emergência” ampliaria os poderes do presidente de forma exagerada. Desde então, embates entre a oposição e o governo são frequentes e a presidência estendeu o prazo dessa medida diversas vezes ao longo do ano passado.

A decisão de assumir as funções dos parlamentares veio na última quinta-feira, mas, dias antes, a justiça ainda retirou dos membros da casa a imunidade por prerrogativa de função e autorizou que Maduro prossiga com indiciamentos. Isso significa que os opositores podem ser agora acusados de diferentes crimes militares e até terrorismo.

A sentença também amplia os poderes do presidente, permitindo que adote medidas sem que seja necessário o aval parlamentar.

E a oposição?

Alguns meses depois, a oposição deu início a uma ofensiva. A ideia era a de realizar um referendo que pudesse ter o poder de revogar o mandato de Maduro.

Em outubro, a justiça anulou a coleta das assinaturas e invalidou o processo, rendendo ainda mais críticas de que a corte máxima estaria atuando em prol do presidente.

A crise política, aqui, retomou o fôlego, fazendo com que figuras como a União das Nações Sul-Americanas (Unasul) e até o Vaticano buscassem participar de negociações que pudessem dar fim aos desencontros.

A oposição tentou então pedir a antecipação das eleições, que ficaram marcadas para 2018. Já os pleitos estaduais foram adiados e ainda não se sabe quando, afinal, vão acontecer. Em dezembro, essas conversas mediadas foram suspensas pelos próprios opositores, que acusam o governo de não cumprir a sua parte. Além disso, o país foi suspenso do Mercosul.

O que esperar?

O cenário ainda é imprevisível. Na última sexta-feira, a procuradora-geral da Venezuela renunciou ao cargo, alegando que o governo teria “rompido com a Constituição” do país. A OEA solicitou uma reunião urgente entre seus membros para debater a situação e analisar a invocação da Carta Democrática Interamericana.

Esse documento é um instrumento jurídico que pode ser aplicado quando se notar uma ruptura das instituições democráticas em algum dos países membros da entidade, justamente numa tentativa de protegê-las de violações e levando em conta as diversas ditaduras que já se instauraram na região. Pode acarretar na suspensão da participação desse Estado na OEA.

Essa medida, entretanto, exige a aprovação de dois terços dos 35 países que fazem parte da organização. O Uruguai já se manifestou sobre o tema e disse que não votará pela aplicação dos preceitos da Carta.

Como está a vida na Venezuela?

Nesse ponto, poucas mudanças para a população: o país continua vivendo uma profunda crise econômica e seus efeitos tem sido devastador para os venezuelanos. Boa parte do problema do país é decorrência das quedas nos preços dos barris de petróleo, que vem caindo desde os idos de 2014.

A escassez de itens básicos, em grande parte causada pela fragilidade da indústria local, impactou duramente a Venezuela. Estima-se que a economia tenha retrocedido quase 12% só no ano passado e que, em 2017, a inflação chegue a 1.660%.

Falta de tudo no país (de papel higiênico até comida, passando até por medicamentos) e a violência urbana tomou novas e sérias proporções. Só em 2016, a taxa de homicídios na Venezuela foi de 91,8 mortes para cada 100 mil pessoas.

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