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Audiência nos EUA nesta quarta debate se Brasil receberá mais tarifas e sanções comerciais

Investigação pela Seção 301 foi aberta em julho a pedido de Donald Trump

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, durante evento no Salão Oval (Saul Loeb/AFP)

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, durante evento no Salão Oval (Saul Loeb/AFP)

Rafael Balago
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 3 de setembro de 2025 às 06h01.

Nesta quarta-feira, 3, dezenas de advogados, empresários e representantes de associações participam de uma audiência que poderá impactar no futuro das relações comerciais entre Brasil e Estados Unidos. Entre eles, estarão representantes de empresas como Embraer WEG e de entidades de vários setores, como etanol, madeira e café

Esta audiência será realizada na USTR, o escritório do Representante de Comércio dos EUA, um órgão ligado à Casa Branca que trata do comércio internacional.

O evento é parte da investigação aberta pelos americanos com base na regra chamada de Seção 301, que investiga, a pedido do presidente Donald Trump, se o Brasil tem adotado práticas comerciais consideradas prejudiciais aos Estados Unidos. 

Esta investigação poderá levar os EUA a adotarem novas tarifas e sanções comerciais contra o Brasil, além das taxas já anunciadas por Trump, como as tarifas de 50% contra produtos brasileiros.

"Se sair uma conclusão de que deveria haver aplicação de sanções, como tarifas ou restrições quantitativas contra exportações brasileiras, tenderia a ser uma coisa mais duradoura", diz Lucas Spadano, sócio do escritório Madrona Advogados e que atuou na missão do Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC).

O processo foi iniciado formalmente em julho, e houve espaço para o envio de manifestações públicas, contra e a favor de medidas contra o Brasil. Foram enviadas 258 mensagens até o fechamento dessa etapa, em 18 de agosto. 

Na audiência desta quarta-feira, 3, haverá espaço para que os interessados defendam seus argumentos frente à USTR. Cerca de 40 empresas e entidades fizeram pedidos para falar. Com isso, esta etapa poderá se estender por dias. 

Não há prazo previsto para a conclusão da investigação. Analistas e pessoas que acompanham o processo avaliam que o processo ainda pode levar alguns meses. 

“Queremos um processo longo, que pode levar cerca de 12 meses, mas que a gente possa trilhar um caminho de convergências dos entendimentos", disse Ricardo Alban, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), que está em Washington.

A CNI será representada na audiência por Roberto Azevedo, ex-diretor-geral da Organização Mundial do Comércio. Alban disse que a entidade quer usar a audiência para “desmistificar” questões levantadas pelos EUA, como a de que o desmatamento estaria descontrolado e que o Pix gera problemas no mercado de pagamentos. 

"Queremos aqui é garantir uma porta de diálogo, garantir que uma mesa de negociação possa existir e que nessa mesa os argumentos técnicos, comerciais e econômicos possam ter preferência", diz Alban. 

Ele afirma, no entanto, que há risco de novas taxas. "Estamos vivendo um momento bem peculiar, onde se pode ter escalonamentos que tem a ver muito mais com as questões políticas e geopolíticas", afirma.

O andamento do julgamento de Jair Bolsonaro poderá ser usado por Trump como razão para novas taxas. O líder americano exige que a Justiça brasileira encerre o processo contra o ex-presidente, acusado de tentativa de golpe de Estaddo. 

Quem estará na audiência no USTR

Do lado brasileiro, estarão na audiência empresas como Embraer, Portobello America e Weg, além de diversas entidades, como a CNI, Amcham (Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos), Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), além de associações setoriais, ligadas a produtos como café, cana-de-açúcar, etanol de milho, pescados e madeira.

Entre representantes americanos, haverá entidades de diversos setores, sendo que parte deles sinalizou que irá falar a favor do Brasil, enquanto outros se juntarão às acusações.

Do lado da defesa do Brasil, estarão a National Coffee Association (NCA, de café) e a International Wood Products Association (madeira) e a US Chamber of Commerce (associação comercial). Em linhas gerais, elas defendem que a integração econômica entre os dois países traz prosperidade, e que o mercado americano será afetado se deixar de contar com produtos brasileiros. 

"Com tarifas americanas significativas sobre o café brasileiro, os torrefadores americanos de café serão severamente prejudicados. As importações de café do Brasil não podem ser facilmente substituídas, se é que podem, visto que o Brasil é de longe o maior produtor de café do mundo", diz William Murray, presidente da NCA, em carta à USTR. 

Ao mesmo tempo, várias entidades pedem que o Brasil seja punido, por representar, na visão delas, concorrência desleal. Entre elas, estão a National Pork Producers Council (carne suína), National Cattlemen's Beef (carne bovina), National Corn Growers Association (milho), a U.S. Beet Sugar Association (açúcar de beterraba), Renewable Fuels Association (combustíveis renováveis) e National Cotton Council of America (algodão).

"A moeda brasileira mais fraca e o menor custo de produção permitirão que o Brasil absorva a tarifa e continue a exportar carne bovina para o mercado dos EUA de forma relativamente inabalável", diz Kent Bacus, diretor da National Cattlemen’s Beef Association.

O que é a seção 301

A seção 301 é parte da Lei do Comércio dos EUA, de 1974. Essa lei autoriza o presidente a tomar medidas contra países que violem regras internacionais de comércio ou tome medidas para restringir o comércio com os Estados Unidos.

As investigações contra os países que podem ter descumprido regras são iniciadas pelo escritório do Representante Comercial dos EUA (USTR), ligado à Presidência. A regra determina que o USTR negocie com os países para que eles retirem as barreiras comerciais antes de aplicar medidas punitivas.

Caso não haja acordo, o governo americano pode levar a questão para órgãos internacionais, como a Organização Mundial do Comércio, ou impor sanções unilaterais contra o país.

Em 2001, por exemplo, a Ucrânia foi alvo de medidas por não respeitar direitos autorais em CDs de música.

Em 2018, a China foi alvo de uma investigação por desrespeitar propriedades intelectuais. Como resultado, o país recebeu tarifas mais altas em uma série de produtos, o que deu início à guerra comercial entre EUA e China.

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