Mursitpinar - A Turquia acolheu em seu território dezenas de milhares de refugiados curdos da Síria, mas, apesar disso, é acusada de manter relações ambíguas com os jihadistas do Estado Islâmico (EI), cuja ofensiva provocou este êxodo maciço.
Há três dias, Ibrahim Binici passa a maior parte de seu tempo no posto fronteiriço turco-sírio de Mursitpinar.
Rodeado por cercas de arame farpado, este deputado do Partido Democrático Popular (HDP) pró-curdo tenta facilitar a passagem de seus "irmãos" que fogem dos combates na cidade síria de Ain al-Arab, localizada a uma curta distância.
Binici está revoltado com o governo islamita e conservador turco.
"Quando os loucos do Daesh (o grupo Estado Islâmico) saíram de Mossul (no Iraque) para atacar Ain al-Arab (Koban em curdo), teriam bastado dois aviões para impedi-los, mas nada foi feito", se queixa.
"As autoridades turcas são em parte responsáveis por esta situação. Protegem Daesh, que é uma organização terrorista", prossegue Binici. "Hoje impedem os jovens curdos de retornar à Síria para defender seu território", explica.
Segundo o deputado, muitos jovens curdos entraram na Turquia para acompanhar suas famílias e deixá-las a salvo, e depois tentaram retornar à Síria para prosseguir com seu combate contra o EI.
O Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) renovou nesta segunda-feira seu apelo aos curdos da Turquia para que lutem contra o EI.
Mas as forças de segurança turca se opõem ao retorno dos refugiados à Síria. "Razões de segurança", alegam os oficiais do posto fronteiriço.
No domingo, ocorreram nesta fronteira violentos confrontos entre a polícia turca e militantes curdos procedentes do sudeste da Turquia. Estes militantes consideram que o governo turco, no poder desde 2002, tem um comporamento duplo.
Nesta segunda-feira voltaram a ocorrer mais confrontos entre a polícia e jovens curdos, perto da pequena localidade turca de Suruç, localizada próxima à fronteira.
Apoio aos loucos de "Daesh"
"O poder não quer que defendamos nosso território", acusa o jovem curdo Mehmed Eminakma, proveniente de Cizre, no sudeste turco. "Apoia os loucos do Daesh, e não as populações sírias", afirma.
Na mesma linha, 10.000 pessoas se manifestaram no domingo em Istambul, carregando cartazes nos quais se lia: "Estado Islâmico assassino, AKP (o partido político no poder na Turquia) cúmplice".
Os curdos são um povo indoeuropeu que habita a zona do Curdistão, que envolve regiões de Turquia, Síria, Iraque e Irã.
Sob a ameaça dos jihadistas do EI, Feyad Bekir teve que deixar seu povoado em Kule, na Síria, para se refugiar na Turquia. Ele também critica o governo do país que o acolhe.
"Os turcos dizem que não podem fazer nada devido aos seus reféns, mas agora que estão livres que venham nos ajudar, mas não, seguem apoiando-os às escondidas", afirma.
A Turquia obteve no sábado a libertação de 46 de seus cidadãos, reféns do EI desde a tomada do consulado geral do Iraque em Mossul, em junho, quando os jihadistas iniciaram sua ofensiva no Iraque.
O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, explicou que esta libertação foi alcançada graças a negociações diplomáticas e políticas, reforçando, assim, a ideia de um acordo com os sequestradores, embora não tenha fornecido detalhes sobre a negociação.
Embora negue com firmeza, Erdogan é acusado de ter apoiado, inclusive armando-os, os grupos rebeldes sírios mais radicais - entre eles o EI - para acelerar a queda do regime de Bashar al-Assad.
Ismail Emer Ziravek, que deixou a Síria há dois dias, tem sua própria explicação sobre a atitude ambígua do governo turco. "Seu medo é que haja em seu território um Curdistão, como já ocorre no Iraque (o Curdistão iraquiano é autônomo). Estão dispostos a tudo para evitar isso, inclusive apoiar o Daesh", afirma.
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1. Longe de casa
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1/15 (Muhammad Hamed/Reuters)
São Paulo –
Mais de dois milhões de pessoas saíram da
Síria em direção a campos de refugiados da Organização das Nações Unidas em países vizinhos desde que a guerra civil começou, dois anos atrás. A situação não é inédita no mundo. De acordo com a agência da
ONU responsável por refugiados, mais de 32 milhões de pessoas deixaram seus países por causa da situação política ou social da região em que viviam. Em áreas próximas a zonas de conflito e instabilidade, a ONU constrói centros (complexos, campos ou vilas) para abrigar aqueles que, por fome,
guerra ou doenças, tiveram de escapar de seu país natal. Alguns campos de refugiados chegam ao tamanho de cidades: o maior deles, localizado no
Quênia, abriga mais de 400 mil pessoas. A pedido de
EXAME.com, a Agência de Refugiados da ONU (UNHCR, na sigla em inglês) levantou informações sobre os maiores campos de refugiados do mundo. Embora esses sejam os dados mais atualizados, a cada dia os números podem mudar – especialmente em regiões onde o conflito ainda é intenso, como nas proximidades da Síria, onde
a guerra civil já matou mais de 110 mil pessoas. Clique nas fotos e veja os maior campos de refugiados do mundo.
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2. 1. Dadaab, Quênia
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2/15 (Getty Images)
Localização: nordeste do Quênia, próximo à fronteira com a Somália, na África
Habitantes: 402,361 pessoas
Contexto: um complexo de cinco campos abriga pessoas que fugiram da guerra civil na vizinha Somália.
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3. 2. Dollo Ado, Etiópia
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3/15 (Giro 555/Flickr)
Localização: sudoeste da Etiópia
Habitantes: 198,462 pessoas
Contexto: complexo de cinco campos abriga somalianos que fugiram das condições precárias (fome e seca) de seu país
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4. 3. Kakuma, Quênia
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4/15 (Zoriah/Flickr)
Localização: noroeste do Quênia, próximo à fronteira com o Sudão do Sul
Habitantes: 124,814 pessoas
Contexto: o campo abriga somalianos e sudaneses que fugiram das guerras e condições precárias em seus países de origem
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5. 4. Za’atri, Jordânia
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5/15 (Getty Images)
Localização: norte da Jordânia, próximo à fronteira com a Síria
Habitantes: 122,723 pessoas
Contexto: abriga refugiados sírios que escaparam da guerra civil em seu país
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6. 5. Jabalia, Faixa de Gaza (Palestina)
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6/15 (Getty Images)
Localização: faixa de Gaza, na Palestina
Habitantes: cerca de 110,000 pessoas
Contexto: abriga palestinos desde o fim da guerra árabe-israelense, em 1948
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7. 6. Sahrawi, Argélia
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7/15 (Getty Images)
Localização: sudoeste da Argélia
Habitantes: cerca de 90 mil pessoas
Contexto: um complexo de cinco campos abriga africanos do oeste do deserto do Saara desde o conflito com forças marroquinas por questões territoriais na década de 1970
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8. 7. Yida, Sudão do Sul
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8/15 (Getty Images)
Localização: norte do Sudão do Sul
Habitantes: 70.095 pessoas
Contexto: sudaneses que fugiram da guerra civil que separou o Sudão e agora tentam escapar de condições de miséria vivem no campo
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9. 8. Mbera, Mauritânia
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9/15 (Cyprien Fabre/Creative Commons)
Localização: sudeste da Mauritânia, quase na fronteira com Mali
Habitantes: 69.676 pessoas
Contexto: a maioria dos refugiados fugiram do conflito no país vizinho Mali, que sofreu um golpe militar em 2012, após dez anos de relativa estabilidade. Disputas com rebeldes separatistas no norte levaram a um intervenção francesa no país e eleições foram instauradas. O novo presidente tomou posse nesta quarta-feira.
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10. 9. Nakivale, Uganda
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10/15 (Stephen Luke/Creative Commons)
Localização: sul da Uganda, próximo à fronteira com a Tanzânia
Habitantes: 68.996 pessoas
Contexto: abriga refugiados de Ruanda desde a guerra civil e genocídio na década de 1990
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11. 10. Nyarugusu, Tanzânia
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11/15 (Anduze traveller/Creative Commons)
Localização: noroeste da Tanzânia, próximo à fronteira com Burundi
Habitantes: 68.197 pessoas
Contexto: criado no fim da década de 1990, abriga milhares de congoleses que fugiram da guerra civil no país
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12. 11. Tamil Nadu, Índia
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12/15 (EC/ECHO Arjun Claire)
Localização: sudeste da Índia
Habitantes: 66.700 pessoas
Contexto: um complexo com 112 campos abriga refugiados da guerra no Sri Lanka, onde guerrilheiros de uma minoria étnica lutam pelo separatismo há mais de quinze anos. Na região, ainda mais 34 mil cingaleses vivem fora dos campos de refugiados
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13. 12. Vila da Panian, no Paquistão
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13/15 (Reprodução/Google Maps)
Localização: nordeste do Paquistão
Habitantes: 56.820 pessoas
Contexto: uma vila onde refugiados afegão vivem há mais de 30 anos, fugidos de regimes fundamentalistas e guerras em seu país
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14. 13. Vila de Shamshatoo, Paquistão
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14/15 (UN Photo/Eskinder Debebe)
Localização: nordeste do Paquistão, próximo à fronteira com o Afeganistão
Habitantes: 53.537 pessoas
Contexto: uma vila onde refugiados afegãos vivem há mais de 30 anos, fugidos de regimes fundamentalistas e guerras em seu país
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15. Agora, veja imagens do ataque que deixou centenas de refugiados na Síria
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15/15 (REUTERS/Nour Fourat)