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Atenção é o 'novo petróleo', e Trump se deu bem por saber extraí-lo, diz novo livro de Chris Hayes

"The Siren's Call", escrito por âncora da TV americana, debate como a disputa por atenção virou um ponto central da economia e da política

Capa do livro "The Siren's Call", de Chris Hayes (Reprodução)

Capa do livro "The Siren's Call", de Chris Hayes (Reprodução)

Rafael Balago
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 15 de fevereiro de 2025 às 09h57.

Para o jornalista Chris Hayes, a atenção das pessoas é como se fosse o novo petróleo: a principal commodity buscada pelas empresas, capaz de movimentar diversos negócios. No entanto, ao contrário do petróleo, carvão ou outras riquezas, a atenção é algo que não pertence ao mundo externo, mas ao que se passa no interior de cada pessoa. "Extrair isso requer invadir nossas mentes", diz.

Hayes, conhecido âncora político da rede MSNBC, traz diversas reflexões sobre como a atenção se tornou um motor da economia, da política e da transformação da sociedade em seu novo livro, "The Siren's Call - How Attention Became the World's Most Endangered Resource" (O Chamado da Sereia - Como a Atenção se Tornou o Recurso Mais Ameaçado do Mundo), lançado no começo de fevereiro nos Estados Unidos.

O título da obra em inglês se aproveita de uma dubiedade. "Siren" pode ser tanto "sereia" quanto "sirene". O livro começa com um trecho da Odisseia, de Homero: para resistir ao canto das sereias que poderiam matá-lo, Ulisses pede para ser amarrado a um mastro de um barco e pede que os marinheiros coloquem bolas de cera nos ouvidos. Hoje, para Heyes, esse canto vem dos celulares, que chamam por nossa atenção o tempo todo, de um modo muitas vezes irresistível.

O livro faz alguns passeios pela história para debater se o que vivemos agora é algo realmente novo. Sócrates, na Grécia antiga, teria questionado se adotar a escrita reduziria a força da memória. Há cem anos, as pessoas pegavam o trem com a cara enfiada em jornais, como fazem hoje com os celulares, e a sociedade sobreviveu e evoluiu, argumenta.

O que Hayes vê de diferente agora é a transformação da atenção em mercadoria, de uma forma nunca vista: os celulares permitem capturar vários pequenos momentos de atenção por dia e vendê-los a empresas, que vivem de extrair esses segundos de atenção de cada ser humano e vendê-lo. Hayes vai mais além e argumenta que, em um mundo em que os produtos, sejam tênis, celulares ou carros, ficam cada vez mais padronizados, porque são feitos nas mesmas fábricas em países distantes, marcas capazes de chamar a atenção acabam tendo o maior diferencial e chance de venda.

O mesmo raciocínio valeria para a política: os candidatos que conseguem chamar a atenção ganham protagonismo e aumentam suas chances de vencer. Assim, a corrida pela atenção virou uma disputa selvagem, da qual o presidente Donald Trump se tornou o maior caso de sucesso.

"Trump é a figura política que mais soube explorar as novas regras da era da atenção", escreve Hayes. "Ele parece agir intuitivamente, por conta de sua experiência com os tabloides de Nova York e sua triste e selvagem necessidade de atenção."

Hayes acompanhou o governo Trump de perto. Ele é apresentador de um telejornal no horário nobre da TV americana MSNBC, há mais de dez anos. Para ele, o presidente funciona como um "sol da atenção": os outros políticos, mesmo os rivais, orbitam em torno dele e não conseguem se desprender. Afinal, mesmo ao criticá-lo, acabam chamando a atenção mais para Trump do que para si mesmos.

O autor faz ainda outras provocações: as pessoas dificilmente conseguem ficar quietas, consigo mesmas, e estão quase o tempo todo desejando atrair a atenção dos outros ou em busca de algo que as distraia. Ao mesmo tempo, escolher em que dar atenção acaba por definir os rumos da vida de cada um, ou mesmo de um país inteiro. Assim, ele defende, precisamos ter cuidado para que algo de dentro das nossas mentes deixe, aos poucos, de ser vendido como uma mercadoria qualquer.

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