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Ataque de Trump ao Irã pavimentou caminho para o renascimento político de Netanyahu

O bombardeio pode causar uma escalada ainda maior, mas para os israelenses, já é visto como uma vitória para o país e para o premier

Para muitos israelenses, o governo obteve um sucesso capaz de restabelecer sua reputação como guardião da segurança do país (Oliver Contreras/AFP)

Para muitos israelenses, o governo obteve um sucesso capaz de restabelecer sua reputação como guardião da segurança do país (Oliver Contreras/AFP)

Agência o Globo
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Agência de notícias

Publicado em 23 de junho de 2025 às 08h50.

Há 20 meses, logo após o ataque do Hamas contra Israel, em outubro de 2023, a carreira do premier israelense, Benjamin Netanyahu, estava à beira do precipício. Ele estava no poder durante o pior erro militar da história do país, abalando suas credenciais de segurança e afundando o apoio a seu governo.

O ataque dos EUA contra o Irã, neste fim de semana, somado à recente ofensiva israelense contra o país, pôs Netanyahu no caminho para sua redenção política. Por décadas, ele sonhou em golpear o programa nuclear iraniano, apresentado como a maior ameaça ao futuro de Israel, e cuja destruição era sua maior prioridade militar.

Agora, ele está mais perto do que nunca de atingir seu objetivo. Para muitos israelenses, o governo obteve um sucesso capaz de restabelecer sua reputação como guardião da segurança do país, elevando suas chances de reeleição e, a depender das próximas semanas, gravando seu legado histórico.

"Essa noite (madrugada de domingo) marca o maior êxito de Netanyahu desde a primeira vez em que chegou ao poder, em 1996", disse Mazal Mualem, biógrafo de Netanyahu.

"Da perspectiva da população, ele obteve uma vitória contra aquele que é considerado a maior ameaça a Israel desde sua fundação".

No Irã, as consequências de curto prazo dos ataques americanos ainda não surgiram. Não está claro se os mísseis destruíram completamente seus alvos. E mesmo que o tenham, Israel pode continuar a atacar o Irã, buscando desestabilizar o governo local.

Os iranianos lançaram mais uma série de mísseis contra Israel no domingo, e muitos temem que possa retaliar contra bases, embaixadas e interesses americanos.

Isso pode levar a novas ações dos EUA e de Israel, ampliando a guerra. Contudo, se a resposta iraniana for limitada, o governo israelense pode reduzir o ritmo da ofensiva, satisfeito por ter obtido a maior parte de seus objetivos, e consciente de que um conflito mais longo seria um risco ao próprio sistema de defesa aérea.

"A bola está no campo iraniano", disse Amos Yadlin, ex-chefe da inteligência militar israelense.

"Se o Irã continuar disparando mísseis, Israel também seguirá atacando e buscando novos feitos, atingindo os lançadores de mísseis e fábricas de mísseis, a indústria petrolífera e a liderança civil iraniana".

Aconteça o que acontecer no Irã, o sucesso de Netanyahu já mudou a cena política em Israel. Após o início dos bombardeios contra o território iraniano, há pouco mais de uma semana, pesquisas de opinião mostraram que sua coalizão atingiu o maior nível de apoio desde o início da guerra contra o Hamas em Gaza, no final de 2023.

No domingo de manhã, seus maiores críticos aplaudiram o premier, incluindo ter convencido o presidente dos EUA, Donald Trump, a se juntar à batalha e destruir alvos que os aviões israelenses não conseguiriam.

"Não tenho problemas com ele aproveitar o momento", disse Yair Lapid, líder da oposição, em entrevista a uma rádio local neste domingo.

"Esse é um sucesso para Netanyahu, para Trump e para o mundo livre. Isso era o que precisava acontecer".

Incentivado pelo golpe contra o Irã, Netanyahu pode demonstrar maior flexibilidade nas negociações por uma nova trégua e pela libertação de reféns em Gaza, dizem analistas.

Durante a maior parte da guerra, o premier evitou um acordo que permitisse ao que restou da liderança do Hamas continuar a exercer influência sobre o território.

Os membros de extrema direita de sua coalizão ameaçaram deixar o governo se a guerra terminasse sem a derrota completa do grupo palestino.

E com o partido de Netanyahu patinando nas pesquisas, ele parecia pouco afeito a concessões que pusessem sua aliança política em risco, como ocorreu na última rodada de conversas, em maio.

Agora, Netanyahu tem opções. Ao obter uma vitória militar contra o Irã, maior apoiador do Hamas, o premier poderá persuadir sua coalizão a concordar com conversas diretas com o grupo, de acordo com seu ex-conselheiro Nadav Shtrauchler.

"Em breve nós poderemos dizer 'Mudamos o Oriente Médio. Agora precisamos ser mais flexíveis em outras frentes, em Gaza e sobre os reféns'" disse Shtrauchler.

"Não acontecerá amanhã, mas uma janela de oportunidade foi aberta".

Se concordar com um cessar-fogo em Gaza, isso por outro lado elevará as chances de Netanyahu obter outro objetivo de longa data: a normalização das relações com a Arábia Saudita, o mais poderoso país árabe.

Em conversas com diplomatas americanos no ano passado, afirmam fontes, a Arábia Saudita expressou sua disponibilidade para tal acordo, desde que a guerra chegue ao fim em Gaza e que Netanyahu concorde com a soberania palestina.

O primeiro item ainda é um plano de longo prazo, e o segundo é ainda menos provável, dada a resistência de Netanyahu a um Estado palestino. Mas agora que depende menos de seus aliados de extrema direita, o premier pode ter mais espaço de manobra.

"Agora é mais fácil para ele avançar com grandes gestos diplomáticos, como um acordo com os sauditas", disse Shtrauchler.

"Se ele tiver tempo hoje, fumará um grande charuto. Mesmo se ainda não tiver chegado ao fim, ele cumpriu uma das missões de sua vida, e está no caminho para cumprir outras".

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