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O que esperar do governo de Alberto Fernández

Macri é derrotado e Alberto Fernández vence as eleições da Argentina. Agora eleito, ele estará diante de desafios monumentais

Cristina Kirchner e Alberto Fernández: chapa kirchnerista/peronista derrotou o empresário Mauricio Macri no primeiro turno das eleições da Argentina (Amilcar Orfali/Getty Images)

Cristina Kirchner e Alberto Fernández: chapa kirchnerista/peronista derrotou o empresário Mauricio Macri no primeiro turno das eleições da Argentina (Amilcar Orfali/Getty Images)

Gabriela Ruic

Gabriela Ruic

Publicado em 27 de outubro de 2019 às 22h30.

Última atualização em 28 de outubro de 2019 às 11h50.

São Paulo – As eleições da Argentina terminaram na noite deste domingo (27) com a esperada vitória de Alberto Fernández e a ex-presidente Cristina Kirchner, que disputou o pleito na posição de vice-presidente, contra Mauricio Macri, que não conseguiu chegar ao segundo turno e se reeleger.

A notícia da vitória dessa chapa não é surpresa. Desde as primárias, realizadas em 11 de agosto de 2019, o cenário eleitoral indicava que a dupla conseguiria se eleger ainda em primeiro turno. Foi exatamente o que se observou nesta noite de domingo: com mais de 88% das urnas apuradas, Fernández tinha 47,8% dos votos, o suficiente para eleger-se o novo presidente da Argentina, enquanto Macri tinha 40,8%.

Fernández já foi ministro em mandatos de Cristina e seu marido, Nestor Kirchner. Embora sempre tenha se manifestado como um crítico de sua parceira de chapa, enfrentou acusações de que seria seu “fantoche” na disputa pela presidência.

Agora vitorioso, Fernández  estará diante de desafios monumentais. O principal deles, evidentemente, é resgatar o país das profundezas de uma gravíssima crise que poderá causar uma retração de 3% na economia em 2019. Abaixo, veja o que esperar da sua presidência em quatro pontos-chave.

Dívida com o FMI

Em junho de 2018, o governo de Mauricio Macri assinou um acordo de financiamento de 56,3 bilhões de dólares com o Fundo Monetário Internacional (FMI), o maior já negociado entre a Argentina e a entidade e foi muito mal recebido pela população, que temia o grau de rigidez dos ajustes que viriam.

A renegociação dessa dívida, explica a Denilde Holzhacker, professora de Relações Internacionais da ESPM, deverá constar como uma das prioridades do governo, já que os prazos de vencimento começam em 2021.

“Em 2020 será preciso rediscutir o modelo desse empréstimo”, nota a especialista. “O FMI geralmente prioriza a definição um déficit primário, que é algo que pode ir contra uma agenda de política social que, por sua vez, é uma bandeira importante de Fernández”. Na visão da professora, a dúvida é como ele irá equilibrar a discussão da dívida com as preocupações sociais.

O papel de Cristina Kirchner

A volta de Cristina Kirchner – que está no centro de escândalos de corrupção relacionados ao seu mandato – aos holofotes eleitorais na Argentina não aconteceu como o esperado. Em uma manobra surpreendente, ela se alinhou a Fernández na posição de vice-presidente. Muitos, no entanto, questionam o grau de influência que ela terá no governo.

“Essa união foi muito extravagante”, avaliou o diplomata José Botafogo Gonçalves, vice-presidente do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), “Foi feita na medida para derrotar Macri. Mas não acredito que Fernández vá seguir a agenda política e econômica do kirchnerismo”. Para ele, que foi embaixador do Brasil na Argentina, é preciso lembrar que, até há pouco tempo, Fernández era um peronista moderado, “e inimigo de Cristina”.

“Cristina atuou bem durante a campanha mobilizando os movimentos sociais – um resgate que favoreceu, e muito, a candidatura de Fernández”, analisa Denilde, da ESPM. “Mas ela exerceu esse papel com discrição”. Para a especialista, os escândalos de corrupção envolvendo Cristina devem contribuir para que ela tenha uma atuação limitada no governo.

A relação com o Brasil

Durante a campanha, a troca de farpas entre Alberto Fernández e o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, rendeu manchetes. Enquanto o primeiro fez uma visita ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Curitiba, o segundo, aliado de Macri, vociferava que a Argentina estaria “cada vez mais próxima da Venezuela”.

Com a vitória do peronista, contudo, a expectativa é a de que os ânimos se acalmem entre os líderes. “A Argentina não pode se distanciar do Brasil”, notou o embaixador José Botafogo. “São economias interligadas sobretudo no setor industrial. Mas a economia argentina é menor que a nossa. Os argentinos teriam mais a perder numa eventual divergência entre as políticas econômicas”, pontuou.

A situação do Mercosul

O Mercosul, bloco do qual Argentina e Brasil fazem parte, está negociando um acordo com a União Europeia, que caminha a passos lentos mas deu um salto significativo há poucos meses quando o documento foi efetivamente assinado. Na campanha, a retórica de Fernández era a de rediscutir o acordo.

No entanto, dizem os especialistas, esse é outro ponto no qual os governos brasileiro e argentino terão de convergir para seguir adiante. “Percebemos um pragmatismo muito importante em Fernández após as primárias e ele sabe da importância do Mercosul para a Argentina”, explica Denilde.

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