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Argentina chora, inconsolada, a perda de seu "Deus Maradona"

Em um país onde futebol é religião, a notícia tem impacto total no ânimo dos argentinos, já duramente atingidos pela pandemia do coronavírus

Fã de Maradona escreve mensagem para seu ídolo no lado de fora da Bombonera em 25 de novembro de 2020 (AFP/AFP)

Fã de Maradona escreve mensagem para seu ídolo no lado de fora da Bombonera em 25 de novembro de 2020 (AFP/AFP)

FS

Fabiane Stefano

Publicado em 25 de novembro de 2020 às 19h04.

Última atualização em 25 de novembro de 2020 às 19h56.

A descrença e o mal-estar tomaram conta da Argentina nesta quarta-feira (25) com a morte de Diego Maradona, considerado por muitos um "deus", que dessa vez ele não conseguiu driblar a morte que tantas vezes o cercou. 

"Não acredito, é uma coisa inacreditável, a gente acha que (ídolos como Maradona) podem passar por todos os obstáculos, mas vimos que não, eles acabam sendo todos mortais. Estou digerindo, me sinto em um pesadelo. Sinto que é um piada. Quero acreditar que é uma piada", desabafou Francisco Salaverry, 28 anos, à AFP em Buenos Aires.

Muitos restaurantes, bares e lojas ostentam uma imagem de "el Diego", como era conhecido familiarmente. Alguns painéis municipais, que costumam alertar sobre acidentes de trânsito, dizem "Obrigado, Diego". A bandeira argentina foi pendurada em várias varandas.

A notícia tem impacto total no ânimo dos argentinos, já duramente atingidos pela pandemia do coronavírus e pela crise, em um país onde futebol é religião. "Tremenda notícia, outra dor para esse 2020 de merda", disse Isabel Puente, 70.

Pessoas se reúnem para lamentar a morte da lenda do futebol argentino Diego Maradona em Buenos Aires

Pessoas se reúnem para lamentar a morte da lenda do futebol argentino Diego Maradona em Buenos Aires (Magali Druscovich/Reuters)

"Hoje é um dia ruim, um dia muito triste para todos os argentinos", resumiu o presidente Alberto Fernández em entrevista ao canal TyC Sports, depois de decretar luto de três dias e suspender todas as suas atividades na quinta e na sexta-feira.

A Igreja Maradoniana, formada por seguidores do "deus" Maradona, convocou um comício em sua homenagem às 18h00 no Obelisco, tradicional ponto de encontro das festas do futebol em Buenos Aires.

"Não posso falar agora. Vou ao Obelisco hoje", disse Guillermo Rodríguez, fã que no dia 30 de outubro, para comemorar os 60 anos de Maradona, fez a décima tatuagem de seu ídolo, o "d10S", uma combinação de letras e números que soa como a palavra deus. Rodríguez, aos 42 anos, chora. Ele não poderá realizar seu maior sonho de abraçar o camisa 10.

Gabriel Oturi, 68 anos, diz estar "totalmente chocado, dolorido". "Vou ser franco, acho que ele era um grande cara que não teve boas relações ao seu redor, que se aproveitavam muito dele".

Em cada uma de suas quedas e recaídas, consequências do uso de drogas ou do excesso de álcool, muitos apontavam para o "entorno" de Maradona. Nesse ambiente, sempre respondiam que ninguém conseguia lidar com ele. Em sua última hospitalização após uma operação na cabeça no início de novembro, ele teve que ser sedado para evitar que fosse embora do hospital.

O ex-astro do futebol argentino Diego Maradona fuma um charuto antes do início da partida de futebol da Primeira Divisão argentina entre o Boca Juniors e o San Lorenzo de Almagro no estádio La Bombonera em Buenos Aires 19 de fevereiro de 2006. REUTERS / Marcos Brindicci / Foto de arquivo

O ex-astro do futebol argentino Diego Maradona fuma um charuto antes do início da partida de futebol da Primeira Divisão argentina entre o Boca Juniors e o San Lorenzo de Almagro no estádio La Bombonera em Buenos Aires 19 de fevereiro de 2006 (Marcos Brindicci/Reuters)

A DOR DO PAÍS

"A dor do país. Fim de uma era", resumiu Julia, 57 anos, em uma rua de Buenos Aires. O estilo provocador e rebelde do ex-capitão da seleção argentina no México-1986, e também comandante da Alviceleste na África do Sul-2010, agregou admiradores e torcedores, mas também inimigos, contra os quais soube usou sua língua afiada.

"Tchau, Diego! Obrigado, Diego!", escreveram as Mães da Praça de Maio-Linha Fundadora no Instagram com a foto de um encontro entre Maradona e a líder do movimento, Taty Almeida.

Nos arredores de La Bombonera, o mítico estádio do Boca Juniors do qual Maradona foi jogador e torcedor, alguns torcedores choram e se abraçam.

Desde que o camisa 10, que ergueu a taça na Copa do México em 1986, e deslumbrou o mundo com o pé esquerdo, ele não parou de despertar paixões no seu país. Não foi apenas uma conquista esportiva, o segundo título mundial do Alviceleste, mas também se tornou um símbolo do desafio ao poder estabelecido. 

Ninguém na Argentina esquece seus dois gols contra a Inglaterra nas quartas de final (2-1) daquela Copa do Mundo no México: o primeiro, a famosa "mão de Deus", como ele mesmo batizou seu gol, marcado com a mão, e o segundo após uma corrida prodigiosa com a bola presa ao pé que costuma ser descrita como o melhor gol da história da Copa do Mundo.

"Poucas vezes na minha vida senti a dor que hoje me invade, poucas vezes senti tantas alegrias como naquele 29 de junho de 1986 quando tocamos o céu com as mãos, o mesmo céu que hoje escurece e nos enche de lágrimas", escreveu. Mauricio Passadore, um fã de Maradona, lembrando aquela partida histórica.

Ele era "um deus errante, sujo e pecador. O mais humano dos deuses", escreveu um anônimo cujo texto se tornou viral nas redes sociais.

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