Mundo

Aproximação das igrejas católica e ortodoxa gera esperança

Enfrentando-se durante séculos, as igrejas vivem em Istambul um momento de harmonia, com esperança de reunificação


	Cruz: reunificação pode superar o cisma do cristianismo ocorrido há quase um milênio
 (Stock Xchng)

Cruz: reunificação pode superar o cisma do cristianismo ocorrido há quase um milênio (Stock Xchng)

DR

Da Redação

Publicado em 25 de novembro de 2014 às 09h47.

Istambul - Enfrentando-se durante séculos, as igrejas grego-ortodoxa e católica vivem em Istambul um período de harmonia, com a esperança de uma reunificação que supere o cisma do cristianismo ocorrido há quase um milênio.

Um cartaz com as imagens do papa Francisco e do patriarca ecumênico da Igreja Ortodoxa, Bartolomeu I, decora a entrada da igreja de Santo Antônio em Istambul, com a inscrição "Bem-vindos", em turco e em inglês.

A comunidade católica da metrópole do Bósforo está finalizando os preparativos para a reunião do bispo de Roma com o da histórica Constantinopla, que acontecerá no próximo fim de semana, um evento que os ortodoxos também esperam com grande expectativa.

Na igreja, situada na Avendia Istiklal, em pleno centro comercial de Istambul, são distribuídos cartõezinhos com uma foto dos dois líderes religiosos e no verso a oração que será pronunciada nestes dias.

"Senhor Santo, assim como rezaste pela unidade da tua Igreja "que todos sejam um", faz com que este encontro seja um passo decisivo para a unidade visível entre os teus filhos", diz um trecho do cartão.

E isso pode mesmo acontecer, como confirma em conversa com à Agência Efe o porta-voz da Igreja Ortodoxa de Istambul, a antiga Constantinopla, Dositheos Anagnostopoulos.

"Temos mais esperanças do que nunca que chegará um dia onde será realidade a reunificação das duas Igrejas. Este dia está se aproximando, se Deus quiser", assegurou.

O primeiro passo foi dado há justos 50 anos, com um encontro de Paulo VI e o patriarca Atenágoras em Jerusalém, em 1964. Passados três anos, ambos os líderes cristãos se visitaram em Roma e Istambul, um gesto que também realizaram os papas João Paulo II e Bento XVI décadas mais tarde.

"O diálogo entre as duas Igrejas teve altos e baixos, mas agora vivemos uma atmosfera muito positiva", opinou Anagnostopoulos.

O atual patriarca Bartolomeu contribuiu para isso, visitando Roma no dia da posse do papa Francisco no ano passado. De fato, foi a primeira vez na história que um arcebispo de Constantinopla participou da cerimônia de um Bispo de Roma.

"É tão importante assim? Sim. Mostra que um respeita o outro tanto ou, se me permite dizer, um ama o outro tanto que o acompanha no dia mais importante de sua vida. Teologicamente não significa grande coisa, mas do ponto de vista humano, cristão, sim é um grande passo", comentou o ortodoxo.

E talvez a chave do diálogo esteja nestes gestos, porque os dogmas das duas Igrejas não se diferenciam. A única questão fundamental da desunião é a da primazia papal. Esta questão de hierarquia foi o motivo do cisma de 1054, que levou à separação das duas Igrejas, com normas canônicas diferentes, mas sem maiores disputas teológicas.

"Entende-se como papa o representante de Jesus Cristo na Terra, ou seja, para todos os cristãos. Os ortodoxos aceitamos esta primazia, mas o vemos como o "primus inter pares", ou o primeiro entre bispos da mesmo categoria, não é o soberano absoluto da cristandade", destacou Anagnostopoulos.

Segundo ele, o patriarca ecumênico, por sua vez, nunca teve essa aspiração hegemônica e se considera unicamente o de maior categoria entre os prelados ortodoxos.

"A administração, para chamá-la assim, da cristandade é para nós coisa de um sínodo. A classificação neste sínodo seria, de fato, também para nós, o Bispo de Roma", concluiu o porta-voz da comunidade ortodoxa.

No domingo, 30 de novembro, o dia de Santo André, o padroeiro do patriarcado de Constantinopla, Francisco e Bartolomeu celebraram juntos uma missa na igreja ortodoxa. Um grande momento para a comunidade ortodoxa grega de Istambul, da qual restaram apenas três mil almas, após os "pogroms" e o assédio legal dos anos 40 e 50 quando havia mais de 100 mil, cerca de 10% da população de Istambul.

O próprio Dositheos Anagnostopoulos, nascido em Istambul, foi com sua família para a Alemanha e só voltou à Turquia depois de se aposentar, para colaborar no patriarcado.

Apesar de sua profissão ser de biólogo e matemático, Anagnostopoulos também celebra missa na falta de sacerdotes. É que não há mais a formação de teólogos locais porque o governo turco ainda não permite reabrir o seminário cristão ortodoxo da ilha de Heybeliada, perto de Istambul.

A Turquia vincula esta antiga reivindicação do patriarcado ao tratamento dos muçulmanos na Grécia, o que demonstra que apesar todas as boas palavras do governo, este segue considerando os cidadãos de fé ortodoxa como uma comunidade estrangeira.

Contudo, o pior, no sentido espiritual, é que católicos e ortodoxos não reconhecem mutuamente a comunhão administrada por seus sacerdotes, opinou Dositheos.

"Este ponto será resolvido facilmente uma vez que seja pactuada a questão da primazia", acrescentou.

Como lembra a oração católica citada, São Pedro e Santo André não foram apenas os dois primeiros apóstolos de Jesus Cristo. Eles foram mais do que isso. Eles foram irmãos.

Acompanhe tudo sobre:ÁsiaEuropaIgreja CatólicaMetrópoles globaisReligiãoRomaTurquia

Mais de Mundo

O que é PETN, químico altamente explosivo que pode ter sido usado em pagers do Hezbollah

Novo centro de processamento de minerais vai fazer com que o Canadá dependa menos da China

Biden diz a Trump que os migrantes são o "sangue" dos Estados Unidos