Eduardo Bolsonaro, com boné da campanha de Donald Trump: filho do presidente Jair Bolsonaro pode ser o novo embaixador do Brasil em Washington (Paola de Orte/Agência Brasil)
Gabriela Ruic
Publicado em 3 de agosto de 2019 às 06h00.
Última atualização em 3 de agosto de 2019 às 06h00.
São Paulo – A embaixada brasileira em Washington já foi ocupada por nomes importantes da diplomacia nacional, uma das mais respeitadas do mundo. Primeira representação diplomática a ser designada como embaixada em 1905, a missão na capital dos Estados Unidos foi chefiada por Joaquim Nabuco, primeiro embaixador do país nos Estados Unidos, e por Oswaldo Aranha em 1934, um dos principais articuladores da Partilha da Palestina, que criaria o Estado de Israel.
Em 2019, a embaixada em Washington pode ganhar um novo embaixador: o deputado federal do PSL-SP, Eduardo Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro. Uma indicação que, evidentemente, não virou notícia sem causar polêmica nas altas rodas da política externa e da diplomacia brasileira.
“A embaixada em Washington é de uma importância extraordinária e é onde acontecem as interlocuções e os diálogos mais importantes”, afirmou a EXAME o embaixador Marcos Azambuja, que é conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI). “É onde está concentrada a maior parcela do poder global.”
Além de sede do governo norte-americano, o mais poderoso do planeta, em Washington também estão as sedes do Banco Mundial, do Fundo Monetário Internacional (FMI) e da Organização dos Estados Americanos (OEA). Sem falar, é claro, nas dezenas de representações diplomáticas de outras potências globais.
“Se o Brasil precisa saber a temperatura das tensões no Oriente Médio, é em Washington que o embaixador irá obter essas informações para então repassá-las ao governo brasileiro”, diz Matias Spektor, professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “E a força de um embaixador também depende do acesso pessoal que ele terá ao Palácio da Alvorada."
O papel de um embaixador, portanto, é não apenas o de representar os interesses brasileiros em outro país, mas também o de estar atento para os movimentos globais, observando o que está acontecendo em outros lugares do planeta. Reunir inteligência, dados e informações que permitam ao governo brasileiro tomar decisões estratégicas e a agir.
A indicação do deputado gerou polêmica no Brasil, com críticas sobre a falta de credenciais diplomáticas dignas da relevância da função e de nepotismo por parte do presidente ao indicar seu filho. A favor, Bolsonaro diz que a proximidade do filho com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, o qualifica para tanto.
A simpatia de Trump por Eduardo é evidente. Em março, durante uma visita oficial de Bolsonaro aos Estados Unidos, o deputado foi publicamente elogiado por Trump. Também acompanhou o pai em uma reunião fechada no Salão Oval, um dos principais da Casa Branca. Ernesto Araújo, chanceler do Brasil, ficou de fora desse encontro.
O professor Matias Spektor, que é pesquisador de política externa e diplomacia brasileira, nota que há outra competência de extrema importância para um embaixador: a sua capacidade de informar tanto o governo brasileiro quanto o americano sobre posições contrárias ao interesse de cada um deles.
“Eduardo está sendo nomeado pela afinidade com Trump, mas é preciso observar em que medida ele conseguirá informar o governo brasileiro sobre a situação no país, sem leituras enviesadas”, diz. E é aí que a tal proximidade pode se mostrar um desafio.
No ano que vem, os Estados Unidos realizam as eleições presidenciais, uma disputa que promete ser dura entre Trump e um rival democrata. Em razão da complexidade do cenário eleitoral que está por vir, explica Spektor, o embaixador terá de fazer “análises desapaixonadas, isentas e preparadas para o cenário mais plausível”, considerando uma vitória de Trump, mas também a sua derrota.
A questão da isenção do embaixador também é uma preocupação de Marcos Azambuja, que foi Secretário-Geral do Itamaraty e serviu como embaixador na França e na Argentina. “A relação com os Estados Unidos sempre foi boa. No entanto, há um imenso terreno de convergências e divergências”. Segundo ele, o Brasil não deve passar de uma posição de "amizade lúcida e crítica" para um alinhamento automático que desconsidera as diferenças entre os países.
Do lado dos Estados Unidos, Trump já mostrou entusiasmo com a ideia, mas ainda é necessária a formalização do agrément, nome do documento em que o país anfitrião manifesta a concordância com a indicação. No Brasil, Eduardo terá ainda que passar por uma sabatina na Comissão de Relações Exteriores do Senado. Se aprovado, enfrentará o plenário da Casa, na qual precisará da maioria dos 81 senadores.
Ainda tem chão pela frente para que Eduardo efetivamente assuma o posto, mas seu pai, o Jair Bolsonaro, já avisou: “Não temos pressa”.