Avião: ltimo relatório, de dezembro de 2017, estimou que as "ações inadequadas na pilotagem manual" da tripulação levaram o Airbus A330 da empresa francesa a cair no mar (Roman Becker / EyeEm/Getty Images)
AFP
Publicado em 5 de setembro de 2019 às 13h33.
São Paulo — Dez anos após a morte de 228 pessoas no acidente do voo Rio-Paris, os juízes de instrução responsáveis pela investigação determinaram que as empresas Airbus e Air France não devem ser levadas a julgamento pelo caso, uma decisão que provoca revolta entre os familiares das vítimas.
A decisão a respeito da tragédia do voo AF447 difere do pedido da Promotoria, que havia solicitado um julgamento contra a Air France, o que já havia sido criticada pelas associações de vítimas.
Em 1º de junho de 2009, o voo AF447 que viajava entre o Rio de Janeiro e Paris caiu no Oceano Atlântico. Os 228 passageiros e membros da tripulação, de 34 nacionalidades, faleceram no acidente, o pior da história da Air France.
O elemento que desencadeou a tragédia foi o congelamento dos sensores localizados no exterior da aeronave, as sondas Pitot, o que provocou informações equivocadas sobre a velocidade e desorientou os pilotos, até a queda do avião no oceano.
Na investigação, iniciada há mais de uma década, as duas empresas foram indiciadas em 2011 por "homicídio culposo".
Em seu parecer de 189 páginas, assinado em 29 de agosto e consultado pela AFP, os juízes Nicolas Aubertin e Fabienne Bernard estimaram que o "acidente se deveu claramente a uma combinação de fatores que nunca haviam ocorrido antes e que, portanto, demonstrou os perigos que não podiam ser percebidos antes do acidente".
As investigações, que deviam determinar a possibilidade de atribuir uma responsabilidade indireta do acidente à companhia aérea e à fabricante, "não levaram a caracterizar uma decisão ilícita da Airbus, ou da Air France, em relação aos (...) erros de pilotagem que causaram o acidente", apontaram.
A principal associação de parentes de vítimas, a Entraide et Solidarité AF447, vai apelar da decisão por considerá-la ofensiva, afirmou à AFP seu advogado, Alain Jakubowicz.
"Como não pensar que esta decisão se deu por interesses econômicos que se sobrepuseram aos da Justiça?", denunciou o coletivo em um comunicado.
Procuradas pela AFP, Air France e Airbus não quiseram comentar a decisão.
Em 12 de julho, no documento de acusação, a Promotoria solicitou um julgamento contra a companhia aérea Air France e a retirada da Airbus do caso.
O Ministério Público considerou que a companhia aérea cometeu "negligência", ao não fornecer a seus pilotos informações suficientes sobre como reagir em caso de anomalias nas sondas que controlam a velocidade dos aviões, apesar de vários incidentes do tipo registrados nos meses anteriores à tragédia.
Contactado pela AFP, Olivier Morice, advogado de várias famílias de vítimas, disse estar "surpreso" com a decisão e anunciou sua intenção de recorrer.
Desde o início da investigação, os especialistas travam uma batalha sobre as responsabilidades na série de incidentes que levaram ao acidente.
As partes civis acreditam que ambas as empresas, Air France e Airbus, devem responder na Justiça.
Um primeiro relatório de 2012 apontou erros cometidos pela tripulação, problemas técnicos e falta de informações dos pilotos em caso de congelamento da sonda Pitot, apesar dos incidentes anteriores relatados à Airbus.
Após essa primeira perícia, a construtora aeronáutica solicitou uma nova avaliação que indicava que a tripulação reagiu "inadequadamente".
Os parentes das vítimas e a companhia aérea contestaram a avaliação, porém, considerando-a muito favorável à Airbus, e apelaram.
O tribunal de apelações de Paris ordenou então a anulação da avaliação e reabertura da investigação.
Um último relatório, de dezembro de 2017, estimou que as "ações inadequadas na pilotagem manual" da tripulação levaram o Airbus A330 da empresa francesa a cair no mar.
Em uma tentativa de convencer os juízes a levar Airbus e Air France à Justiça, os parentes das vítimas apresentaram um relatório aos tribunais franceses em 8 de agosto mostrando, segundo eles, que a Airbus sabia desde 2004 dos problemas de suas sondas que controlam a velocidade de seus aviões.