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Agonizando na crise, praias caribenhas da Venezuela estão desertas e sujas

A minutos de carro, do outro lado da El Ávila, a cordilheira que se eleva acima de Caracas, praias eram uma fuga do caos da vida urbana

Praia de La Guaira, na Venezuela, vazia: localizado nas proximidades da capital Caracas, balneário já foi muito popular (Adriana Loureiro Fernandez/Bloomberg/Getty Images)

Praia de La Guaira, na Venezuela, vazia: localizado nas proximidades da capital Caracas, balneário já foi muito popular (Adriana Loureiro Fernandez/Bloomberg/Getty Images)

Gabriela Ruic

Gabriela Ruic

Publicado em 2 de novembro de 2018 às 06h00.

Última atualização em 2 de novembro de 2018 às 06h00.

Era uma coisa espontânea, uma ligação na manhã de um sábado, uma mensagem de texto do outro lado da sala de aula, um olhar induzido pelo álcool na pista de dança. Era hora de ir a La Guaira.

A apenas 45 minutos de carro, do outro lado da El Ávila, a cordilheira verde-esmeralda que se eleva acima de Caracas (Venezuela), essas praias públicas eram uma fuga do caos da vida urbana. No caminho, o ar seco se tornava doce e pesado, sinalizando que o Caribe logo estaria à vista.

Essa mudança ainda acontece, claro, mas quando eu fui a La Guaira com um amigo há algumas semanas, o trajeto deveria ter servido de aviso: até mesmo uma simples excursão foi arruinada pelo pesadelo econômico do país. A estrada era um labirinto de buracos, o acostamento estava cheio de carros que os donos, sem esperanças de encontrar peças de reposição, abandonaram à ferrugem no lugar onde enguiçaram. Não havia jovens universitários atravessando os túneis com as janelas abertas e buzinando, nem lojas na beira da estrada vendendo biquínis e baldinhos de plástico baratos.

La Guaira atraía todos, de todas as partes de Caracas, de todas as classes. Os baladeiros faziam o trajeto vertiginoso após saírem dos clubes de Las Mercedes para ver o nascer do sol com os olhos cansados e os dedos dos pés na areia. Os pais embalavam cercadinhos e baldes de plástico e saíam cedo para garantir lugares distantes dos SUVs, que entravam de ré na areia e faziam a festa com o porta-malas aberto e chacoalhando com a batida do reggaeton. Com trajes de banho no fundo da mochila, os jovens cabulavam aula e se amontoavam em carros cheios de garrafas de rum, licor de anis com coco e caixas de cerveja.

Quando chegamos à praia, havia agitação, mas só porque as pessoas que alugavam cadeiras e guarda-sóis que ainda tentavam sobreviver lutavam desesperadamente para nos atender. Devido à hiperinflação, não havia muitos clientes; é possível gastar o equivalente a meio salário mínimo nacional em algumas empanadas, um saco de gelo para manter as bebidas frias e um lugar confortável para sentar. Nós nos arrastamos para a areia e escolhemos o lugar com melhor vista em meio a pequenas pilhas de lixo, tampas de garrafas, sacolas plásticas, pontas de cigarro e folhas mortas.

O que mais doeu, creio, foram as lembranças do que tornou La Guaira tão especial, tão venezuelana. Os vendedores de coquetéis de frutos do mar que prometiam qualidades afrodisíacas, as crianças carregando doces coloridos de coco e açúcar, os sinos dos carrinhos de raspadinha, os hippies vendendo tornozeleiras feitas de conchas ou tatuagens de henna.

O passeio não era a praia em si mesma; o mar agitado desta faixa da costa não tem nada a ver com os paraísos tropicais que estão a leste e a oeste: Puerto La Cruz, Mochima e Morrocoy, onde a areia é branca como açúcar e a água, de tons espetaculares de turquesa. O objetivo era fugir, mas não para muito longe, para um lugar onde você sempre se encontraria alguém conhecido, onde você nunca se cansaria observar as pessoas. Naquele dia não havia nada, nem ninguém, para ver. E nós arrumamos as malas e voltamos para Caracas muito antes de o sol se pôr.

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