O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (Ethan Miller/Getty Images)
Ana Laura Prado
Publicado em 29 de janeiro de 2017 às 08h15.
Última atualização em 30 de janeiro de 2017 às 09h34.
São Paulo – Com postagens que variam de política internacional a alfinetadas a celebridades, o perfil de Donald Trump no Twitter tem se mostrado quase um espetáculo.
Desde antes de sua posse, o agora presidente dos Estados Unidos causava alvoroço ao tratar de temas complexos de uma maneira...pouco convencional.
A polêmica mais recente envolve a construção do muro na fronteira com o México. Em seu perfil, Trump distribui críticas ao país e detalha seu plano de impor a ele os gastos envolvidos na obra.
Nem mesmo os órgãos americanos têm escapado de sua intempestividade. Com seu nome envolvido nas investigações da CIA sobre a Rússia, ele desmereceu a agência e chegou a levar uma bronca de seu diretor.
A língua solta de Trump, em teoria, tem muito a ver com a proposta de uma rede como o Twitter. Mas a situação ganha novas proporções quando se trata de uma figura cujas palavras têm, agora, relevância mundial.
A ampla presença de um líder mundial no Twitter não é nenhuma novidade. Em 2011, essa modalidade de diplomacia ganhou o nome de Twiplomacy, com a popularização da mídia entre figurões da política.
Há quem diga que foi Barack Obama quem intensificou essa tendência. Em 2007, quando ainda era senador, ele criou uma conta na rede social, que, no ano seguinte, teve um grande papel em sua campanha para presidente.
Outro prolífico usuário da rede foi o venezuelano Hugo Chávez, que tuitava de tudo, de decisões do seu mandato até detalhes da sua vida cotidiana.
O caso de Trump é um pouco diferente. O empresário, ativo na rede desde 2009, passou a usar sua conta pessoal parar tratar de temas políticos e internacionais. Sua postura e personalidade também não foram deixadas de lado nas novas investidas.
“Ele utiliza uma linguagem muito particular do mercado imobiliário, que é muito truculento”, analisa o consultor político Gilberto Musto. “Essa avidez ao falar e postar foi o que fez com que o Twitter, pela limitação de caracteres, fosse a melhor ferramenta para ele”.
Musto destaca que, durante a campanha, a postura de Trump se mostrou muito útil para atrair a atenção dos eleitores e da própria imprensa – já que, para se pronunciar, bastavam alguns poucos clicks.
Quando o assunto é diplomacia, porém, essa aparente espontaneidade pode não ser assim tão bem-vinda. Ameaças mais graves, como as envolvendo a Coreia do Norte, são um grande exemplo.
O país busca constantemente pressionar os EUA com seu desenvolvimento nuclear e, no início do ano, anunciou o desenvolvimento de um novo míssil. Em resposta – e no Twitter –, Trump provocou o país ao subestimar sua capacidade de colocar em risco a segurança dos EUA.
“No passado, líderes e seus conselheiros valorizavam a capacidade de considerar assuntos sensíveis em privado antes de anunciá-los ao público”, explica o professor de relações internacionais da FGV James Cameron.
Segundo ele, esse comportamento – que já se vê ameaçado pelo ritmo de produção e consumo de informação na internet – pode ser ainda mais prejudicado pelos pronunciamentos efusivos do líder.
Principal crítico do governo de Obama, Trump usou e abusou do Twitter para criticar seu legado como líder dos EUA. O desafio, agora, tornou-se outro.
“Falar sobre os males do governo e o péssimo estado da Nação não funciona tão bem uma vez que você é a pessoa encarregada do governo”, destaca Tammy Vigil, especialista em comunicação política da Universidade de Boston.
Para ela, Trump deve se adaptar a partir de agora se quiser ganhar um segundo mandato.
“Ele se convenceu de que é muito popular e amado e que é isento de erros, então não tem motivação para moderar neste momento”, explica.
O fato de Trump ter assumido a conta oficial da Casa Branca, @POTUS, também pode favorecer o status quo de sua postura. Com ela, sobram oportunidades para que ele alterne seus posicionamentos oficiais e pessoais entre as duas contas.
Contudo, nada o impede de comentar os temas oficiais, à sua forma, em seu próprio perfil – coisa que, como no caso do muro do México, ele continua fazendo.
Os riscos dessa interferência, segundo o professor da FGV, não são nada pequenos. Acostumada a essas reações imediatas, a própria população passa a pressionar o governo por posicionamentos ágeis.
“Essas possíveis pressões e as intervenções públicas de Trump podem aumentar a probabilidade de um mal-entendido a respeito da posição dos EUA em uma situação complexa”, detalha Cameron. “O perigo é que ele prejudique a presidência e, em última instância, os interesses dos Estados Unidos e do mundo inteiro”.