Igreja: China e Vaticano parecem avançar na aproximação (Kevin Frayer/Getty Images)
EFE
Publicado em 9 de dezembro de 2016 às 14h31.
Pequim - O padre Wang (nome fictício para proteger sua identidade) não exerce um sacerdócio normalmente. Ele celebra missas dentro da casa de alguns chinenes, às vezes na sua casa, mas nunca em igrejas.
A última vez em que deu uma missa no altar foi detido. Desde então, faz parte do grupo de católicos clandestinos da China, uma comunidade que pratica sua fé em silêncio.
Às vezes ele tem muitas missas para fazer em um mesmo dia, em outros, nenhuma. Aos domingos, ele faz apenas uma celebração em seu apartamento alugado. Padre Wang acode quando é chamado e acolhe quando pedem os seus serviços.
"Minha porta está sempre aberta", diz à Agência Efe.
O religioso enfrenta o trabalho com resignação e admite que sonha em poder dar uma missa na igreja, mas acredita que isso não acontecerá em um futuro próximo, mesmo que China e Vaticano assinem, como vem sendo comentado, um acordo sobre a ordenação de bispos, grande empecilho para suas relações.
"A situação difícil dos católicos na China não tem muito a ver com as relações diplomáticas, mesmo que sejam restabelecidas não melhoraria", afirma.
Ele se refere às várias informações que apontam a que o governo chinês e o Vaticano estariam perto de fechar uma "concordata", como definiu em recente conversa com jornalistas em Pequim o sinólogo italiano Francesco Sisci.
Segundo o estudioso, a negociação tem "amplo espectro" e não inclui apenas a unificação da nomeação de bispos - cerca 100 na China, parte aprovada pelo regime comunista, parte, pelo Vaticano e o resto admitida por ambos -, mas, "pela primeira vez, o governo em Pequim reconheceria que não tem autoridade sobre a religião católica".
Seria o maior passo para melhorar - mas não reestabelecer, pois para isso o Vaticano teria que romper com Taiwan - as relações entre Pequim e a Santa Sé desde que romperam os laços diplomáticos em 1951, depois que o papa Pio XII excomungou dois bispos designados pela China, dando lugar a duas "igrejas": a "patriótica" e a clandestina.
Os aproximadamente 10 milhões de católicos chineses se dividem entre ambas: a primeira controlada pelo regime comunista e a segunda obedecendo às regras do Vaticano e assediada para que se una à Associação Patriótica Católica Chinesa, dirigida pelo Partido Comunista e não reconhecida pela Santa Sé, segundo o padre Wang.
"O governo sempre tenta fazer com que nos registremos", acrescenta o padre, descrevendo algum "métodos" utilizados pelas autoridades para persuadir, como o caso de um amigo sacerdote que conseguiu fugir antes de ser detido graças à ajuda dos fiéis, mas que ninguém mais teve notícia.
Ou como o dele próprio, que acabou em prisão domiciliar por mais de um ano ao dar sua primeira missa depois ser ordenado por um bispo não reconhecido por Pequim, mas sim por Roma.
"Eu não sou da igreja clandestina, fizeram com que eu me tornasse parte dela", defende ele, que antecipa que um acordo com o Vaticano "não protegeria" os católicos, já que não existe "qualquer demonstração" do governo de que renunciaria ao controle.
Diferentemente do padre Wang, um sacerdote de uma igreja autorizada de Pequim oficia a missa dominical em uma imponente igreja, abarrotada de fiéis e cheia de eventos comemorativos do Natal.
Após a liturgia, o padre Li (que também pediu para não ter seu nome real revelado) diz à Efe que "não existe divisão na China, apenas pequenos problemas, diferentes pontos de vista".
Assim como o padre Wang, ele está a par das negociações entre Pequim e a Santa Sé, mas, diferentemente do "padre clandestino", ele acredita que o acordo "seria bom para os católicos da China e do mundo".
"China e Vaticano são como um casal: se casaram, se separaram, mas nunca se divorciaram. Agora, tem a reconciliação", tenta explicar.
Enquanto, China e Vaticano parecem avançar na aproximação, na semana passada a Diocese de Chengdu comemorou a ordenação do bispo Joseph Tang Yuange com a autorização de ambas as partes, o que foi interpretado como sinal do bom andamento das negociações.
O padre Wang defende que vai continuar evangelizando de casa em casa, pois, mesmo que consiga realizar seu sonho de dar missas na igreja, se aceitar as condições do governo e se registrar vai abrir mão dos seus princípios.
"Não deveria ser assim. O catolicismo é universal", argumenta ele, emendando que, aconteça o que acontecer, "tudo vai depender das políticas do governo chinês sobre as religiões. Não existe liberdade verdadeira".