Campo de desabrigados em Porto Príncipe: pouco mais de 170.000 haitianos continuam vivendo em acampamentos, em condições precárias e, às vezes, sob a ameaça de serem expulsos (AFP)
Da Redação
Publicado em 5 de novembro de 2013 às 19h45.
Porto Príncipe - Há quase quatro anos, Widlène Gabriel, uma menina de oito anos, vive com seus pais em um campo de deslocados erguido após o devastador tremor de terra de janeiro de 2010, que deixou mais de 200.000 mortos e 1,5 milhão de pessoas desabrigadas no Haiti.
Pouco mais de 170.000 haitianos continuam vivendo em acampamentos, em condições precárias e, às vezes, sob a ameaça de serem expulsos, como acontece com os ocupantes do terreno onde vive a pequena Widlène, em uma barraca na beira de uma avenida que liga o centro de Porto Príncipe a Pétion Ville, no subúrbio da capital.
"O teto da minha casa caiu nas nossas cabeças. Não aconteceu nada comigo, mas deixamos a nossa casa destruída e viemos para cá", recorda.
Widlène nunca foi à escola e passa seus dias observando os veículos na avenida Canapé vert.
"Aqui todas as crianças estão na mesma situação. Todos os dias são parecidos para elas. Vivemos sem esperança e nos sentimos abandonados", acrescenta Manette Nazius, mãe de seis crianças.
"Bendito seja o Eterno, bendito seja o Eterno", canta um grupo de mulheres reunido na tenda n°15, que serve de igreja na entrada do campo. Não são mais de dez as pessoas que repetem incansavelmente os versículos bíblicos.
O pastor, um homem de mais de 60 anos, está de pé na entrada, mas os fiéis hesitam em entrar. "Nós os apoiamos com orações. São pessoas abandonadas pelas autoridades. Não têm nada. Mas Deus não castiga duas vezes", afirma o pastor Pierre.
Mas isso não impede que os jovens que vivem nestes campos de deslocados sintam-se desesperançosos e desamparados.
"Não há vida"
A partir de 2011, o governo conseguiu realojar mais de 60.000 famílias e recuperar prédios públicos com auxílios-aluguel ou abrigos provisórios, mas 171.974 pessoas ainda vivem em 306 campos, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM).
"Aqui não nos oferecem alternativa alguma", dizem os moradores do campo de Canapé Vert.
Bladimir e Fénol, ambos com cerca de 30 anos, vivem neste local e fazem diferentes bicos para sobreviver. "Vivemos como irmãos e irmãs. Nós nos ajudamos mutuamente, mas não esperamos nada do governo", diz o mecânico Bladimir.
O sentimento é o mesmo no "Campo da embaixada da Itália", um amontoado de barracas erguidas sobre uma antiga propriedade da missão diplomática italiana. "As autoridades nos esqueceram e as organizações internacionais já não vêm até aqui", reclama Donald Duvert.
"Às vezes somos tomados por um sentimento de raiva. Mas, como somos bons cidadãos, não saímos às ruas para atacar os mais ricos. Vejam como vivemos aqui", afirma, enquanto mostra as barracas que servem de moradia para 150 famílias no campo.
"Antes a vida era difícil para nós. Agora, não há vida. Só Deus sabe quando sairemos disto... ou aqueles que governam", acrescenta Jospeh Gino, sob um sol escaldante.
"A esta hora do dia ninguém pode ficar dentro das barracas. As crianças sofrem com o calor dentro das tendas", diz uma mulher que mostra seu filho de quase quatro anos, nascido no campo. "Este menino nunca dormiu em uma cama, nem em um quarto de verdade", lamenta.
Longe de se resignar, Fabienne, de 18 anos, se apega aos seus estudos. "Estou um pouco atrasada, mas estudar é a única alternativa que tenho", conclui.