Marketing

O que as marcas não conhecem sobre a alimentação nas ruas

Comer na rua é uma realidade para 50% dos brasileiros das classes C e D. Com uma estimativa de gastos de R$ 9 bilhões, empresas ainda estão cegas para criar iniciativas

Praça de alimentação em shopping de São Paulo: pesquisa indica que a alimentação fora do lar chega a movimentar R$ 9 bilhões anualmente (Nina Jacobi/ Divulgação)

Praça de alimentação em shopping de São Paulo: pesquisa indica que a alimentação fora do lar chega a movimentar R$ 9 bilhões anualmente (Nina Jacobi/ Divulgação)

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Da Redação

Publicado em 2 de agosto de 2012 às 09h26.

Rio de Janeiro - A facilidade e a praticidade de comer na rua já se tornaram parte da vida de 50% dos brasileiros das classes C e D. As marcas, no entanto, não abriram os olhos para o potencial deste mercado. O Brasil é um dos países da América Latina onde os consumidores menos se alimentam na rua, com um índice de 36%, incluindo todas as classes sociais. No Peru, pelo menos 46% da população come fora e, na Argentina, o índice é de 44%. Ainda assim, por aqui, o setor é representativo: uma estimativa feita pela agência WMcCann indica que alimentação fora do lar chega a movimentar R$ 9 bilhões anualmente.

Os dados são parte da primeira pesquisa do projeto “Truth about street” (ou “A verdade sobre a rua”), da WMcCann, sobre consumo e comportamento dos latino-americanos. As formas que se relacionam com o comércio alimentício foram estudadas em 25 cidades de 18 países da América Latina com 12 mil consumidores. No Brasil, foram 4,5 mil pessoas ouvidas no eixo Rio-São Paulo.

A falta de investimento das empresas no setor reflete diretamente na invisibilidade delas e o conceito de marca é quase inexistente: 20% dos brasileiros não se lembram de nenhuma empresa relacionada a bebidas e 26% não se recordam de nenhuma marca de comida associada à saúde. Mesmo quando lembradas, os índices de reconhecimento são baixos. A Danone com 14%; a Unilever com 4%; a Bimbo com 2,5%, e a Kellogg’s e a Kraft Foods empatadas com 1,5%. Os 12% restantes são de marcas locais. A Nestlé, citada por 37% dos entrevistados, aparece como uma exceção.

“Ver para enxergar”

O quase desaparecimento das empresas também gera confusão e muitos consumidores se atrapalham na hora de separar marcas e categorias de produtos. Um das causas do conflito se deve à inexistência de exposição de itens ou ações nos pontos de venda. A invisibilidade é a primeira “verdade” em um ranking de 10 definições feitas pelo estudo do que o consumidor espera do comércio de rua e, por consequência, o que as marcas poderiam fazer para melhor ser relacionar com ele.


Usando o termo verdade como sinônimo de valorização dos consumidores em relação às marcas, a pesquisa confirmou a percepção anterior à apresentação dos resultados. “A rua é um lugar repleto de oportunidades, tanto do ponto de vista do posicionamento das marcas quanto das cifras movimentadas pelo mercado de alimentação. O grande problema é que as empresas veem, mas não enxergam e estamos falando de 63 milhões de pessoas economicamente ativas de duas classes sociais emergentes comendo fora de casa”, avalia Aloísio Pinto, vice-presidente de planejamento da WMcCann e um dos responsáveis pela pesquisa no país.

A cegueira em relação à praticidade na hora de comer e à fidelização que pode ser gerada entre a marca e o cliente também são comuns na visão dos consumidores. Juntas, elas formam as verdades “Mover-se é preciso, comer é acessório” e “Intimidade gera confiança”. “Mesmo sabendo que todo mundo tem pressa e o convívio quase diário aproxima comprador e vendedor não há muitas ações para criar vínculo. A intimidade gera confiança no produto consumido e propicia a fidelização dos clientes”, afirma o vice-presidente.

O gosto da comida de rua

Mais do que ser saudável, a comida de rua precisa ser prática e agradar o paladar. No Brasil, 78% dos pontos de venda são quiosques, de acordo com a pesquisa, e alternativas como os combos são vistas como incentivo à compra, o que gera a quarta verdade “A oferta deve ser simples e conveniente”. “A compra casada ajuda a ‘empurrar’ a bebida e dá uma sensação de bom negócio para o consumidor e mais lucro ao comerciante”, avalia Pinto.

A falta de alimentos saudáveis não é um problema e “O que os olhos não veem o estômago não sente” é a quinta verdade. Segundo o estudo da WMcCann, tanto no Rio de Janeiro como em zonas periféricas de São Paulo, as condições dos locais estão em segundo plano. A cobrança é maior dentro de casa em relação a alimentos saudáveis e higiene.


Outro ponto é que o consumidor acredita no mito “A rua tem um tempero diferente”. A sexta verdade representa a rua como um universo gastronômico próprio, com sabores que não se encontram em casa. “Uma hipótese é que essa valorização ajuda a diminuir a culpa de trocar uma alimentação nutritiva por algo mais gostoso, o que seria menos perdoável dentro de casa”, afirma o executivo.

A culpa, no entanto, vem como sétima verdade paradoxal, intitulada de “Culpa (in) consciente”. Apesar da preocupação com a saúde existir no discurso dos entrevistados, quando estimulada, ela parece não fazer parte do processo de escolha. “No Rio, a pressa é citada como motivo para consumirem salgados ou alimentos pouco nutritivos. Já em São Paulo, a preocupação parece não existir. Muitos afirmaram que não acreditavam que o que estava sendo consumido não fosse saudável”.

Sentir-se bem é agora

O consumo de alimentos pouco saudáveis, de acordo com a pesquisa, faz com que os brasileiros tentem equilibrar a refeição com bebidas naturais ou diet. A oitava verdade, “Lei da compensação: uma balança ‘nutritiva’”, serve como desculpa e grande parte dos consumidores faz confusão de componentes das fórmulas dos produtos, gerando a verdade “Excesso de informação, pouca compreensão”. “Há muita referência, mas pouca compreensão sobre o que faz bem e o que faz mal à saúde”, diz Pinto.

Por outro lado, ainda que haja culpabilidade por se alimentar na rua, para os brasileiros das classes C e D, o “Bem estar é sentir-se bem agora”. A 10ª verdade traz o conceito de que felicidade e satisfação não precisam, necessariamente, ter relação com alimentos saudáveis e nutritivos. Questionados sobre marcas que trazem bem estar e saúde, muitos incluíram McDonald’s, Coca-Cola, cervejas e até certas marcas de cachaça como exemplos.

O conceito de comida de rua tem relação direta com felicidade e apesar de grandes marcas aparecerem como referências, ações com esses brasileiros são inconsistentes. “Comida saudável é que dá sossego e prazer instantâneo. A lógica da rua é outra e esse setor vai continuar crescendo. O brasileiro tem saído mais, seja por lazer ou a trabalho. A oportunidade está aqui e agora e o estudo serve para que as marcas acordem e não fiquem cegas perante um mercado que já apresenta números tão significativos”, indica o executivo da WMcCann.

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