Robôs humanoides da startup chinesa Unitree se apresentam ao público durante o Web Summit Lisboa, simbolizando o avanço da China em robótica e inteligência artificial (Marc Tawil)
Estrategista de Comunicação
Publicado em 17 de novembro de 2025 às 19h32.
Última atualização em 17 de novembro de 2025 às 19h34.
Ao final de três dias intensos em Lisboa, ficou evidente que o Web Summit 2025 serviu como termômetro emocional e estratégico do nosso tempo.
A edição, que terminou na semana passada, reuniu oficialmente 71.386 participantes de 157 países, o maior número da história.
Segundo a organização, o evento acolheu 2.725 startups de 108 países, com destaque para IA e machine learning, e 40% delas fundadas por mulheres — outro recorde; 1.857 investidores acompanharam a conferência, e as startups que passaram pela edição anterior captaram US$ 715,5 milhões após o evento.
Pelos pavilhões, corredores e palcos, emergiu um paradoxo que, no meu entendimento, moldará 2026: quanto mais a tecnologia acelera, mais aumenta a demanda por sentido, por vínculo e por skills essencialmente humanas, como criatividade, comunicação, inventividade e escuta.
Nos palcos, a “IA agêntica” apareceu como a nova camada operacional do mundo digital: veloz, autônoma, eficiente.
Ao mesmo tempo, mobilizaram as conversas temas como criatividade, confiança, pertencimento, narrativa e emoção.
Em essência, o Web Summit 2025 discutiu o que nós ainda queremos com a tecnologia — e não apenas o que ela é capaz de fazer.
É dessa fricção entre “máquinas que executam sem hesitar” e “pessoas que buscam significar aquilo que fazem” que decidi trazer as 7 tendências que anunciam 2026:
A IA tornou produção, iteração e refinamento quase instantâneos. Isso nivelou o campo técnico. O resultado foi o oposto do esperado: criatividade deixou de ser “toque final e virou a parte mais estratégica de qualquer processo, único espaço onde ainda existe assimetria humana. Os palcos de Lisboa repetiram a mesma ideia, com designers e líderes de produto concordando: não existe vantagem tecnológica se não existir vantagem criativa.
Dezenas de talks nesses três dias mostraram o salto da IA “reacional” para a IA “operacional”. Já não é mais sobre “escrever ótimos prompts”, mas sobre orquestrar agentes que tomam decisões, aprendem sozinhos e executam tarefas inteiras com supervisão mínima.
Esse movimento inaugura uma nova camada de produtividade e obriga profissionais e empresas a revisitar seus modelos de competência. Agentes farão o trabalho repetitivo. Humanos farão o trabalho interpretativo.
A virada filosófica mais forte do evento emergiu de uma palavra simples: relacionamento. De ROI, passamos a falar de ROR (Return on Relationship) e ROT (Return on Trust): indicadores que reconhecem que, sem vínculo e confiança, qualquer crescimento é frágil. Essa mudança recoloca humanidade, credibilidade e autenticidade no centro da estratégia.
Se antes o conteúdo seguia um fluxo pré-definido, agora ele se comporta como algo vivo. Sistemas reorganizam narrativas em tempo real; feeds reagendem a jornada; plataformas aprendem com cada toque, pausa ou recusa. O post isolado perde valor. A lógica passa a ser sistêmica. Marcas deixam de publicar e começam a cultivar presença.
Não por nostalgia, mas porque ficou claro que o processo (e não o resultado) é a parte mais humana do trabalho. Diversos palestrantes reforçaram que grandes ideias surgem da troca, do ruído, do erro, do debate. Sim, a IA acelera e corrige as entregas, porém, ainda não substitui a fricção intelectual que produz originalidade. O mundo está cheio de outputs. O que lhe falta são percursos.
Em um mundo hiperconectado e acelerado por automação e IA física, cresce em valor as experiências que criam vínculo, pertencimento, comunidade. As mídias, marcas e creators que entenderem isso vão operar menos como anunciantes e mais como hubs sociais, com acolhimento, encontro e representação.
Os creators saíram fortalecidos porque nasceram num intervalo raro: cedo demais para serem moldados por IA; tarde demais para dependerem de manuais. O que os levou ao topo foi autenticidade — a mesma autenticidade reivindicada por Khaby Lame, ítalo-senegalês com 250 milhões de seguidores, na abertura do palco principal.
Criadores têm ritmo próprio, narrativa contínua e comunidade real. As marcas, do seu lado, perceberam que não adianta “parecerem” creators; elas precisam entender sua própria verdade antes de tentar performar verdade alheia. Quem tem comunidade, vence. Quem tem audiência, sobrevive.
Se 2025 mostrou a fusão entre tecnologia e humanidade, o novo ano será aquele em que isso se traduzirá em prática.
Saio de Lisboa vendo três movimentos como inevitáveis:
1. Agentes de IA vão assumir funções inteiras em operações, marketing, vendas e produto.
2. Significado se torna produto: marcas serão avaliadas não apenas pelo que entregam, mas pelo que representam.
3. A criatividade torna-se competência transversal. Em um cenário em que a IA automatiza e replica, o valor reside naquilo que só humanos produzem: interpretação, nuance e sentido.
Em síntese, 2026 não será a disputa entre empresas rápidas e lentas. Será entre empresas que “fazem sucesso” e empresas que “fazem sentido”.
As primeiras podem até crescer. Mas as segundas é que permanecerão.