A Embraer traduz engenharia brasileira em narrativas compreensíveis em mais de 100 países, reforçando credibilidade e inovação no cenário global (Leandro Fonseca /Exame)
Estrategista de Comunicação
Publicado em 25 de setembro de 2025 às 16h03.
Última atualização em 25 de setembro de 2025 às 16h03.
Nunca fomos tantos. Oito bilhões de pessoas, sete mil idiomas, dezenas de milhares de culturas. Nunca falamos tanto. Só que falar não basta. O que separa ruído de reputação hoje é credibilidade. E credibilidade depende da nossa capacidade de traduzir.
Por muito tempo, o marketing acreditou que trocar slogan, adaptar idioma ou ajustar imagem era suficiente. Preguiça disfarçada de estratégia. Em 2025, esse truque não cola mais. A PwC mostra que 70% das falhas em negócios internacionais nascem de comunicação malfeita.
A Deloitte aponta que seis em cada dez líderes já perderam negócios por ruídos culturais em negociações globais. O Edelman Trust Barometer 2024 revelou que 88% dos colaboradores associam a reputação do líder à imagem da empresa.
O Boardroom Barometer da Deloitte vai além: 43% dos investidores já consideram o comportamento público de executivos como critério de risco reputacional. O público percebe, e os investidores também. Não adianta engajar em massa se a mensagem não atravessa culturas. Credibilidade se mede pela capacidade de uma marca se fazer entender em mundos diferentes.
A comunicação global deixou de ser sobre volume. É sobre clareza. E exemplos não faltam. A Amazônia, ao usar sua própria IA — a Inteligência Ancestral — dobrou conexão e chegou a aumentar a conversão em duas vezes. A Embraer traduz engenharia brasileira em narrativas compreensíveis em mais de 100 países. Da precisão alemã ao calor latino, adapta tom e contexto sem perder essência. Resultado: é percebida como confiável e inovadora.
A Starbucks reinventou o conceito de cafeteria na China, um país moldado pelo chá há milênios. Desde 1999, são mais de sete mil lojas, que oferecem mooncakes no Festival do Meio Outono e espaços pensados para socializar. O KFC, fundado por Harland Sanders em Kentucky, transformou o fast food em comida de casa na Ásia. Incluiu no cardápio congee, bao e youtiao, clássicos da comida de rua chinesa. São cases que comprovam: traduzir é estratégia.
Por trás desses exemplos existe uma mudança mais profunda. A globalização deixou de ser fluxo de produtos e passou a ser fluxo de símbolos. Uma campanha hoje precisa atravessar gerações, plataformas e códigos culturais sem se perder no caminho. Quem traduz identidade, em vez de apenas mensagem, cria conexão real. Quem traduz só palavra vira ruído.
É por isso que comunicar multiculturalmente se tornou disciplina estratégica. Não é acessório de branding. É o núcleo de confiança de qualquer marca. Líderes que sabem traduzir ampliam espaço de negociação, evitam crises, aceleram inovação e consolidam reputação. Os que ignoram esse jogo correm o risco de falar sozinhos.
1. Mapeie identidades flexíveis
Toda marca tem um núcleo inegociável (propósito, valores, promessas) e uma borda adaptável (tom, estética, rituais). Saiba o que pode dobrar culturalmente sem quebrar essência.
2. Invista em co-criação local
Não faça campanha “para”. Faça campanha “com”. Incluir criadores, artistas e vozes do território traz legitimidade e ressonância que nenhuma tradução literal alcança.
3. Troque CTR por índice de ressonância
Alcance e clique importam, mas confiança mora em outros números: sentimento positivo, apropriação simbólica, engajamento orgânico de comunidades.
4. Escute antes de escalar
Teste mensagens em grupos locais, observe códigos não verbais, entenda o silêncio. O que não é dito pode valer mais do que a copy.
5. Use IA como braço, não como cérebro
Algoritmos aceleram variações e entregam escala. A curadoria humana é quem evita ruído cultural e dá nuance às interpretações.
6. Treine lideranças em sensibilidade cultural
Em negociações internacionais, o ruído não está só no inglês mal falado. Está na falta de leitura do contexto. Treinamento em comunicação multicultural virou ferramenta de gestão.
7. Transforme diversidade em inovação
Times diversos não são apenas justos. São mais lucrativos: companhias com diversidade acima da média têm 19 pontos percentuais a mais de receita em inovação, segundo a BCG.
Líderes e marcas que traduzem sua identidade em múltiplos códigos culturais atravessam fronteiras com credibilidade, constroem confiança e abrem mercados. Quem continua preso à tradução literal e ao marketing copiado e colado se condena à irrelevância. O futuro já está dado: quem não traduz, não lidera.