Marketing

O desafio das marcas na nova era da descoberta digital

Como a combinação entre conteúdo, avaliações e influência molda a tomada de decisão do consumidor em tempos de agentes de inteligência artificial

Influenciadores: tamanho não significa retorno (FreePik / Inteligência artificial/Reprodução)

Influenciadores: tamanho não significa retorno (FreePik / Inteligência artificial/Reprodução)

Da Redação
Da Redação

Redação Exame

Publicado em 6 de setembro de 2025 às 12h35.

*Por Raphael Pinho

Descobrir e comprar se fundiram no mundo digital. O crescimento das plataformas e redes sociais transformou o “ver” em “confiar” e, na sequência, em “comprar”. O conteúdo virou prateleira, o feed virou vitrine e o checkout acontece sem sair da tela.

Agora, uma segunda camada se sobrepõe a essa lógica: a dos agentes autônomos de IA. Em vez de apenas buscar, o usuário define a tarefa e recebe a solução executada de ponta a ponta. Tudo isso com comandos simples, como “encontre”, “compare”, “reserve”.

Os modelos de busca não se anularam. Pelo contrário, eles coexistem e se potencializam. E o que não mudou ficou ainda mais preponderante: conteúdos de qualidade e avaliações robustas viraram ativo estratégico que impactam a escolha de um produto ou serviço, seja por pessoas ou por máquinas.

Multimodal, social e comprável

A busca nunca foi tão multimodal. O Google segue central, mas divide a atenção com plataformas sociais e marketplaces.

Entre os mais jovens, vídeo curto virou linguagem nativa para “pesquisar” restaurantes, produtos e ideias. Nas plataformas sociais, o conteúdo já nasce comprável: o usuário é impactado por um creator, aprende algo em segundos e finaliza a compra sem sair do conteúdo. O que antes era “topo de funil” virou ponto de decisão.

Esse rearranjo consolidou o social/discovery commerce: a descoberta acontece no entretenimento; a consideração, nas provas sociais; e a conversão, no clique nativo. Para as marcas, isso significa tratar conteúdos com olhares que não se encaixam mais nas caixas antigas de awareness/consideração/conversão.

No Brasil, mais da metade (52%) das pessoas usou ChatGPT ou outros assistentes de inteligência artificial para auxiliar nas compras nos últimos 12 meses. Os dados são de um estudo da Adyen, empresa global de tecnologia financeira.

Papel estratégico dos influenciadores

Conteúdo interessante, avaliações confiáveis e a experiência do consumidor se tornaram ativos centrais. Nesse cenário, influenciadores assumem um papel estratégico ao gerar provas sociais reais e relevantes.

Eles deixam de ser somente criadores de conteúdo e se tornam agentes de validação. Seus testemunhos e demonstrações passam a ser lidos por sistemas automatizados de recomendação. Além de afetar a decisão de seguidores, eles passam também a reforçar a credibilidade de marcas tanto diante de chatbots de IA generativa quanto agentes de IA.

Para deixar mais clara a diferença entre ambos, enquanto um chatbot de IA generativa pode criar um roteiro de viagem personalizado com dicas e sugestões criativas, os agentes de IA são capazes de automatizar todo o processo, desde buscar passagens, reservar hotel, alugar carro, até agendar atividades.

Na prática, ele toma decisões e resolve problemas para concluir a compra com menor intervenção humana. Ou seja, o papel da máquina passa a ser ainda mais relevante na jornada de compra.

Seja qual for a busca, os influenciadores têm o poder de reforçar aspectos positivos ou levantar questionamentos sobre produtos e marcas. Essa influência é fundamental na formação da percepção do consumidor. E, por isso, não se pode separar o discurso das experiências reais.

Um exemplo recente reforça essa nova dinâmica. A Samsung lançou o smartphone dobrável Galaxy Z Fold 7, prometendo resistência para dobrar 500 mil vezes sem danos. Um youtuber coreano do canal Tech·it decidiu testar na prática. Ele dobrou o aparelho manualmente ao vivo, no YouTube, até atingir a meta de 200 mil dobras. O dispositivo passou no teste de resistência da tela, confirmando a promessa de durabilidade. Tudo isso vira insumo de busca e recomendação, seja para humanos ou agentes de IA.

A próxima curva: da consulta à execução

Como provocou Amy Webb, “o futuro da internet será sem busca” na era dos sistemas multiagentes de IA. Parece futurista, mas já é realidade: no lançamento do GPT-5 e do Agent Mode, a OpenAI demonstrou jornadas de viagem “do inspirar ao reservar” dentro da mesma conversa.

E a Expedia, que já vinha lançando experiências conversacionais, anunciou integrações com o OpenAI Operator e o Microsoft Copilot. A marca criou um agente de IA que promete atender o cliente de “ponta a ponta”, encurtando o caminho entre recomendação e compra.

O Expedia Trip Matching foi lançado no início de junho no Instagram. Nele, os viajantes podem compartilhar qualquer vídeo de viagens do Reel, nas mensagens do perfil da marca, e receber itinerários personalizados, ideias de destinos e dicas de viagem com base no recurso.

O Walmart também tem um projeto similar em andamento, como confessou recentemente Hari Vasudev, diretor de tecnologia da empresa nos Estados Unidos. Em entrevista ao Wall Street Journal, ele afirmou que, em vez de focar em anúncios que atraem somente humanos, o desafio das marcas será conquistar os algoritmos desses agentes virtuais.

O que muda para o marketing?

Agentes não “veem anúncios”; agentes leem e interpretam conteúdo e reputação. Diante do pedido “encontre o melhor smartphone até R$ 2.000 para fotos noturnas”, um agente varre comparativos, fichas técnicas, vídeos de teste, análise de consumidores e avaliações para justificar a recomendação. Se sua marca não tem massa crítica de reviews confiáveis, FAQs claras, demonstrações objetivas e dados legíveis por máquinas, você fica fora do shortlist algorítmico, mesmo com mídia paga.

As provas sociais já são onipresentes para pessoas e serão insumos primários para agentes. Não basta ter “algumas estrelas”: é preciso volume, frequência, contexto e respostas públicas que mostrem como a marca aprende e melhora.

Em paralelo, conteúdo estruturado (comparativos com atributos padronizados, perguntas e respostas, prós e contras, critérios de testes) aumenta a legibilidade por IA e diminui a ambiguidade na decisão automatizada.

O Google não saiu de cena. Ele incorporou IA generativa à busca e o Gemini já disputa atenção com o ChatGPT. O que muda não é o Google, é o monopólio da intenção: a descoberta se espalhou e os agentes ganharam papel de relevância. Nesse tabuleiro, vence quem tiver conteúdo profundo e avaliações confiáveis, legíveis por gente e por máquina.

No final das contas, o desafio das marcas é cada vez mais complexo: serem cada vez mais humanas e tocarem no coração das pessoas para gerar relevância num ambiente saturado de conteúdo, ao mesmo tempo que precisam cair nas graças dos agentes de IA e seus algoritmos.

Isso exige não somente autenticidade e storytelling poderoso, mas também dados estruturados, transparência e experiências consistentes que tornem a marca facilmente identificável e recomendável por algoritmos.

  • *Por Raphael Pinho, coCEO da Spark
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