Marketing

Nem branca, nem verde: por que a Heinz decidiu lançar uma maionese preta no Brasil

Novidade faz parte da agenda consumer-centric da companhia, que busca ampliar penetração e dobrar a operação no país em cinco anos; marketing ficou 30% mais robusto em 2025

Thiago Lopes, CMO da Heinz Brasil, destaca que a estratégia consumer-centric guia lançamentos como a Mayo Halloween (Divulgação)

Thiago Lopes, CMO da Heinz Brasil, destaca que a estratégia consumer-centric guia lançamentos como a Mayo Halloween (Divulgação)

Juliana Pio
Juliana Pio

Editora-assistente de Marketing e Projetos Especiais

Publicado em 17 de setembro de 2025 às 11h38.

Esqueça a maionese branca ou verde. A Heinz agora aposta em uma versão preta do seu clássico condimento. A marca, que faz parte da gigante norte-americana Kraft Heinz, quer aproveitar o Halloween, celebrado em 31 de outubro, para se conectar com os consumidores brasileiros de forma lúdica (e vender mais).

A iniciativa vai além do apelo sazonal e integra uma estratégia mais ampla da companhia no país, que vem reforçando a centralidade do consumidor como eixo de suas decisões de marketing, um movimento geralmente pensado para diferenciar a marca em mercados maduros e altamente disputados. No cenário global, a Kraft Heinz enfrenta concorrentes como Nestlé, Unilever, Pepsico, General Mills e Danone.

Batizada de Mayo Halloween, a nova maionese tem sabor de alho negro e edição limitada. O rótulo é fosforescente e, após ser exposto à luz, brilha no escuro. O produto chega em duas versões de embalagem, com ilustrações de abóbora e caveira, e já está disponível nos principais pontos de venda do país enquanto durarem os estoques, com preço sugerido a partir de R$ 13,59.

Segundo Thiago Lopes, CMO da Heinz Brasil, embora não seja uma tradição nacional, o Halloween vem ganhando espaço no país com a influência da cultura pop e das redes sociais, sobretudo entre crianças e jovens. “Mais do que um produto inusitado, o lançamento reforça o olhar da marca para inovação e sua capacidade de criar conversas culturais.”

Antes mais restrito ao público infantil, o também chamado Dia das Bruxas tornou-se uma oportunidade de negócios, movimentando o varejo e atraindo marcas interessadas em se conectar também com jovens adultos por meio de experiências personalizadas e itens temáticos, assim como o Carnaval e o Natal.

Pesquisa da YPulse realizada em 2024 mostra que 91% dos jovens entre 12 e 26 anos afirmaram que pretendem celebrar a data, muitos deles investindo em fantasias e decoração. No Brasil, o comércio online acompanha essa tendência. Levantamento da Nuvemshop mostrou que, em outubro do ano passado, as vendas de produtos relacionados ao Halloween cresceram 34% em comparação ao ano anterior, alcançando um faturamento de R$ 948 mil.

Inovação guiada pelo consumidor

O sabor de alho negro já havia sido testado pela Heinz em mercados como Austrália e Nova Zelândia, onde, segundo Lopes, esgotou rapidamente. No Brasil, a fórmula foi adaptada ao paladar local.

“Tivemos a oportunidade de lançar não apenas uma embalagem diferente, mas também um produto criado especialmente para o mercado nacional, com o apoio do time de pesquisa e desenvolvimento. A produção concluída em apenas dois meses”, afirma o CMO.

Além de P&D, Lopes também lidera campanhas, inteligência de consumidor e inovação. A integração, segundo ele, evita projetos “no vácuo”. “O desejo da gente colocar essas áreas juntas tem muito a ver com garantir que a inovação beba de verdade do consumidor. Inseri-lo no início da equação garante que o que sai no final do desenvolvimento esteja conectado diretamente com a demanda que ouvimos dele.”

Essa lógica tem levado a Heinz a acelerar ciclos de lançamento e a apostar em ofertas sazonais de tempo limitado, os LTOs (Limited Time Offer). “A gente pensa em sabores fixos, que refletem desejos mais estáveis do consumidor, somados a LTOs, que ficam dois ou três meses no mercado e aproveitam momentos culturais. A Mayo Halloween é um exemplo disso, e já estamos procurando o próximo”, diz Lopes.

A Mayo Halloween, maionese preta de alho negro, chega em edição limitada para o Halloween com embalagens temáticas de abóbora e caveira (Divulgação)

Novas frentes de expansão

O modelo dialoga com a gestão do CEO Ariel Grunkraut. Um dos fundadores do Burger King no Brasil, ele ajudou a consolidar a imagem da rede como principal rival do McDonald’s. Assumiu a Zamp em 2022 e, em 2024, passou a comandar a Kraft Heinz, em meio à entrada do fundo Mubadala na operadora do BK.

Desde então, aposta em uma receita semelhante: comunicação estratégica para destacar diferenciais das marcas, como a origem dos tomates usados no ketchup Heinz, tema de campanha recente. A operação no país, que também reúne Quero, Hemmer e BR Spices, completa dez anos com a meta de dobrar de tamanho em cinco anos e transformar o Brasil na maior unidade da companhia fora dos Estados Unidos.

Nos últimos cinco anos, a Kraft Heinz investiu R$ 1 bilhão em estrutura no Brasil e agora mira expansão em marketing, distribuição e portfólio, incluindo a entrada em novas categorias. Segundo o CMO, o movimento reforça a prioridade de entender e atender o consumidor.

“Temos uma cultura pautada no consumidor e estamos acelerando esse movimento. É um processo de transformação importante para a companhia”, diz Lopes, que chegou em fevereiro para reforçar a estratégia. Publicitário de formação, passou por agências como Talent e WMcCann, atuou na Netflix e foi CEO do Porta dos Fundos. A trajetória reforçou sua visão de que o 'novo marketing' deve integrar criatividade, estratégia e conhecimento aprofundado de consumidor e negócio.

Marketing mais robusto

O Brasil está entre os cinco mercados prioritários da Kraft Heinz no mundo e é considerado motor de crescimento. “Isso faz com que recursos e a atenção da companhia estejam muito ligados aqui. Estamos nesse grupo seleto de países de onde se espera que venha a maior parte do crescimento nos próximos anos”, afirma Lopes.

A estratégia consumer-centric busca ampliar a penetração da marca e definir a agenda de inovação em molhos e condimentos. Em categorias nas quais qualidade é pré-requisito, a diferenciação depende também de experiências culturais, novos sabores e relevância no cotidiano. No caso da Heinz, embora amplamente reconhecida em ketchup, a marca tem apenas 20% de penetração no país, sinal de que há espaço para crescer.

Para o CMO, contudo, o desafio é ampliar o consumo em diferentes regiões, respeitando preferências locais e fortalecendo a distribuição. Nesse processo, o produto é o ponto de partida. “A marca se posiciona muito por meio do produto no Brasil. A superioridade percebida está ligada à experiência em primeira mão. Quando alguém prova, pensa: este é um ketchup muito bem feito, esta maionese é muito boa.”

Esse movimento ganhou reforço com o aumento de 30% no investimento em marketing em 2025, aplicado principalmente em campanhas e visibilidade. Boa parte desse aporte foi concentrada em Heinz, que tem mais potencial de crescimento. Desenvolvimento de produto e inovação têm verbas próprias.

Parte dos recursos, segundo o executivo, foi destinada à campanha que destacou a origem do tomate usado no ketchup e nos molhos. “Repetir que era bom e saboroso não era suficiente. O consumidor queria saber o por quê. Contamos nossa história de origem, da semente ao processamento.” A comunicação também buscou refletir diversidade regional e cultural, com sotaques e perfis variados.

“Queríamos nos reapresentar como uma marca nacional que entende o Brasil, indo além da 'perspectiva sudestina' da publicidade.”

Construção de marca e relevância local

O reforço criativo veio com a entrada das agências David e Jotacom no início do ano. Reconhecidas por trabalhos ousados para marcas como Burger King e Duolingo, elas passaram a integrar a estratégia da Kraft Heinz, que busca equilibrar grandes campanhas de marca com movimentos conectados ao momento cultural.

Além das ações estruturadas, a companhia aposta em iniciativas de oportunidade, como no Oscar, e em ativações sazonais, a exemplo do Dia das Mães. “Construir fundamento de marca, mas também calor de marca com as coisas que estão acontecendo no cotidiano”, resume o CMO.

Essa lógica aparece em campanhas que mostraram novos contextos de consumo, como ketchup em coxinha e pastel, e agora no lançamento da maionese preta para o Halloween. “Ou a gente tem uma campanha grande, ou um produto, ou ambos, para garantir que, se entramos em um momento importante, a experiência seja única”, explica.

O executivo projeta continuidade nessa agenda. “Sempre que tivermos a oportunidade de trazer um produto novo, mesmo que seja efeméride, vamos tentar fazer isso porque queremos participar de momentos relevantes de conversa e de conexão emocional com o consumidor”, finaliza.

Divisão em duas empresas até 2026

Como mostrou a EXAME, a Kraft Heinz anunciou no início do mês que vai se dividir em duas empresas independentes e listadas em bolsa, em uma cisão isenta de impostos prevista para o segundo semestre de 2026. A medida busca “reduzir complexidade e destravar valor” após anos de vendas fracas.

Segundo Bloomberg e Reuters, os negócios de molhos, pastas e temperos ficarão na Global Taste Elevation Co, dona de Heinz, Philadelphia e Kraft Mac & Cheese, com US$ 15,4 bilhões em vendas anuais. Já a North American Grocery Co reunirá Oscar Mayer, Kraft Singles e Lunchables, com cerca de US$ 10,4 bilhões em receitas.

“As marcas da Kraft Heinz são icônicas e queridas, mas a complexidade da estrutura atual dificulta alocar capital de forma eficaz, priorizar iniciativas e gerar escala nas áreas mais promissoras”, disse Miguel Patricio, chairman do conselho, à Reuters.

A companhia tem enfrentado queda na demanda por itens como Lunchables, Capri Sun, macarrão com queijo e maionese. Para acompanhar mudanças no consumo, vem reformulando o portfólio. A gestão reconhece ainda que a dimensão do negócio — quase 200 marcas em 55 categorias e 150 países — dificulta a alocação equilibrada de recursos. A cisão deve abrir espaço para que a unidade de mercearia avance em canais ainda pouco explorados, como lojas de conveniência.

Em julho, a Kraft Heinz registrou prejuízo no segundo trimestre após contabilizar uma baixa de US$ 9,3 bilhões, reflexo da queda prolongada das ações e da capitalização de mercado. A expectativa é que, somadas, as duas novas empresas superem o valor atual, estimado em cerca de US$ 33 bilhões, embora o plano ainda esteja sujeito a ajustes até a conclusão.

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