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Negócios Sociais. Como é o modelo que dá lucro e ajuda a sociedade?

Solidarium, Sementes de Paz e Banco Pérola são exemplos de empreendedorismo com foco no auxílio social e na rentabilidade

“Negócios sociais são empresas que têm como foco principal servir a base da pirâmide”, explica Renato Kiyama, Gerente da Aceleradora de Impacto da Artemisia.  (Wikimedia Commons)

“Negócios sociais são empresas que têm como foco principal servir a base da pirâmide”, explica Renato Kiyama, Gerente da Aceleradora de Impacto da Artemisia. (Wikimedia Commons)

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Da Redação

Publicado em 16 de novembro de 2011 às 12h07.

Rio de Janeiro - Um novo modelo de empresa está ganhando forma. Chamados de negócios sociais, vem aumentando o número de empreendimentos que buscam ser sustentáveis e melhorar as condições socioeconômicas das populações menos favorecidas. Existem atualmente cerca de 140 negócios do gênero no Brasil, segundo um levantamento coordenado por três instituições ligadas ao setor, Potencia Venture, Fundação Avina e Ande Polo Brasil. A Solidarium faz parte deste grupo de empresas que nascem com o objetivo de ajudar a sociedade, além de obter uma rentabilidade financeira.

De um lado, pequenos produtores que não sabiam como vender e, do outro, grandes varejistas atrás de novidades para as suas prateleiras. Este foi o campo de visão de Tiago Dalvi, fundador da Solidarium, que esse ano faturará R$ 700 mil. A missão da Solidarium é levar os produtos artesanais de 44 cooperativas e produtores para o comércio, por meio do Walmart, das Lojas Renner, da Tok&Stok e de mais 300 lojas por todo o país. O desafio da empresa foi tirar dois milhões de trabalhadores de debaixo da linha de pobreza e lhes conceder meios próprios de sustento.

“Negócios sociais são empresas que têm como foco principal servir a base da pirâmide. O impacto social é o foco central do trabalho, mas para isto elas utilizam mecanismos de mercado, como a venda de produtos. Pode ser uma empresa que visa o lucro, no entanto, que tenha como sua atividade principal resolver um problema social”, explica Renato Kiyama, Gerente da Aceleradora de Impacto da Artemisia.

A formação do conceito

A principal questão por trás do modelo de empreendimento é como transformar problemas sociais em oportunidades de negócios que promovam o desenvolvimento humano. A ideia da iniciativa é juntar o melhor do segundo setor e do terceiro setor, ou seja, unir o processo de gestão das empresas capitalistas às iniciativas sociais realizadas por ONGs e outras associações civis.


“Caracterizamos essas empresas como o setor ‘dois e meio’, porque seria um nível intermediário em que as companhias visam lucros, mas sempre relacionados a serviços sociais específicos. Não é, por exemplo, como a Natura, uma empresa capitalista que realiza projetos voltados para a sociedade”, destaca Maurício Turra, Professor de Responsabilidade Social, em entrevista ao portal.

As categorias de atuação dos negócios sociais mais visadas pelos investidores, segundo um mapeamento realizado pela Ande Polo Brasil, são as de serviços financeiros, com 62 empreendimentos voltados ao assunto. Em seguida, aparecem saúde, educação e cultura, com 14 negócios, e ainda 13 ligados ao artesanato. Nesta lista também entram moda e decoração, agricultura e alimentos, tecnologia e energia, além de canais de distribuição, turismo e moradia.

Desenvolvimento pelo país

O movimento solidário é antigo no Brasil, mas os negócios sociais começaram por volta dos anos 2000. A primeira iniciativa no mundo foi de Muhammad Yunus, vencedor do Nobel da Paz em 2006, ao criar em 1976 o banco Grameen, em Bangladesh, para emprestar dinheiro a populações carentes. Nascia assim o microcrédito, que por meio do banco do bengalês já liberou US$ 11 bilhões para mais de oito milhões de pessoas.

Seguindo os mesmos ideais, Alessandra França fundou o Banco Pérola, em outubro de 2009, na cidade de Sorocaba, no interior de São Paulo. O objetivo do banco é dar crédito a jovens empreendedores, entre 18 e 25 anos, para que possam realizar seus sonhos de montar um negócio rentável. O trabalho de Alessandra, no entanto, apenas se realizou por meio da Artemísia, uma aceleradora de negócios sociais criada em 2004 pela Potencia Ventures, com a finalidade de explorar o mercado social no Brasil.


Com o aporte da empresa, o Banco Pérola começou a funcionar e, além do investimento, a aceleradora elaborou um plano de ação para implementar o negócio. Atualmente, o banco de Alessandra conta com o Agente de Oportunidades, que instrui todos os clientes durante o processo de desenvolvimento do empreendimento. O programa já ajudou mais de 130 negócios em Sorocaba e a perspectiva para o próximo ano é expandi-lo para todos os bairros do município e cidades vizinhas.

“O maior desafio de construir um negócio social é lidar, exatamente, tanto com o social quanto com a economia e ser bom nas duas coisas. Nosso tipo de negócio requer bastantes investimentos e investidores para crescer. Ainda não pagamos a operação do banco, apenas 30%, os 70% restantes estão dentro do nosso plano de cinco anos. Temos que trabalhar muito nos próximos três”, comenta Alessandra.

Crescimento dos negócios

O negócio social é o meio mais esperado para o desenvolvimento da economia e da sociedade neste século. As empresas cada vez mais usam termos como sustentabilidade e responsabilidade social na estratégia de marketing e assumem que estão em busca de alternativas de funcionamento com maior relevância para a sociedade. O mercado, portanto, está propício para projetos que fortaleçam os trabalhos das ONGs e da filantropia, mas que consigam caminhar com as próprias pernas.

“O setor está crescendo muito e nos próximos anos será uma opção viável para os universitários ao sair da faculdade, ao invés de se tornar empregado ou fazer concurso público. É apenas uma questão de tempo para o setor se tornar um produto social valorizado, as ONGs já são um movimento falido”, ressalta Tiago Dalvi, fundador da Solidarium, do Paraná, em entrevista ao portal.


O aumento das atividades, entretanto, está concentrado ainda na região sudeste, com 55 empresas, seguido pela região sul (36) e nordeste (33), de acordo com o estudo da Potencia Ventures. Entre os 50 empreendedores entrevistados no levantamento, 64% são micro empresários com faturamento anual entre R$ 200 mil e R$ 1 milhão. Outros 10% se encontram na categoria de pequenas empresas, sendo que 2% faturam mais de R$ 10 milhões por ano.

Os investidores sociais

A Artemísia, criada pela investidora Potencia Ventures, ajuda a fomentar negócios sociais no Brasil por meio de programas de aceleramento com startups. São selecionados para o programa empreendedores de todo o país, que passam por um processo de nove meses desde a remodelação do projeto à assistência de gestão dos negócios. Após o processo, a aceleradora faz a ligação entre a empresa e possíveis investidores, tanto nacionais quanto estrangeiros, que buscam aplicar em negócios que geram impactos sociais.

“Trabalhamos também com a atração de talentos, buscando no mercado profissionais que tenham perfil empreendedor para estruturar equipes de trabalho. Com a categoria de inspiração, trabalhamos ainda dentro das universidades, levando o conceito aos alunos que também tenham o perfil característico, por meio do programa Choice”, conta Kiyama, da Artemísia.

Em sete anos, a Artemísia já auxiliou cerca de 80 empreendimentos dos mais variados segmentos. De acordo com o estudo da Potencia Ventures, a educação está entre os negócios mais apoiados (75%). Em segundo lugar aparecem atividades de artesanato e meio ambiente, ambas com 63%, seguidas de cultura (60%), agricultura e tecnologia da informação (50% cada) e saúde (48%).


A prestação de serviços é uma das formas de suporte aos empreendimentos sociais, em 93% dos casos são realizadas palestras, cursos e treinamentos como meio de apoio. Com 73%, aparecem as atividades de orientação, consultoria estratégica e gestão, além de inclusão de redes de contato. O suporte tecnológico representa 60% dos serviços oferecidos, além de assessoria em marketing (55%) e financeira (53%).

Sustentabilidade garantida

Com o objetivo de fortalecer a cadeia produtiva da agricultura ecológica, em abril de 2008 surgiu a Sementes de Paz. A empresa social, criada por Omar Haddad, funciona como ponte entre os pequenos produtores e os consumidores. O negócio por meio do boca a boca e das redes sociais conseguiu conquistar mil cadastrados e possui hoje uma base de 200 clientes regulares.

Atualmente, a companhia utiliza o Facebook como ferramenta para aumentar seu público, por meio de conteúdos explicativos que mostram os benefícios ao meio ambiente e valorizam o trabalho dos produtores agrícolas de alimentos orgânicos. A Sementes de Paz busca construir uma relação de confiança e transparência com o consumidor, apresentando uma tabela de quanto custa cada processo da negociação. Os cerca de 40 trabalhadores recebem pagamentos mensais, sem a incerteza de se venderão ou não seus produtos.

A previsão da empresa é dobrar o faturamento até o fim de 2011 e para 2012 o projeto é ainda mais ambicioso. “Estamos em um mercado em expansão. Com a conscientização maior da população sobre os alimentos orgânicos, mais consumidores surgirão e assim poderemos diminuir os custos de produção e logística. É uma tendência muito forte do mercado, porque realizar um trabalho que depende do dinheiro dos outros não é garantido. Queremos que o nosso negócio cause impacto na sociedade e ao mesmo tempo seja sustentável”, declara Rebeca Rocha, coordenadora de marketing do Sementes de Paz.


Os principais impactos sociais atingidos são o aumento de renda e produtividade (36%) e de acesso à educação (16%). O movimento cresce, mais ainda precisa do auxílio inicial de grandes investidores. De acordo com a pesquisa da Potencia Ventures, 74% dos empreendimentos buscam algum aconselhamento externo ou recebem orientações de outras instituições no dia a dia. Nos próximos três anos, entretanto, pelo menos 15 empresas ligadas ao setor pretendem faturar mais de R$ 12 milhões.

Ser ou não ser um negócio social

Existe ainda uma discussão forte no setor sobre a intenção do negócio de desenvolver um projeto que auxilie no desenvolvimento social. Para Artemísia, qualquer negócio social precisa começar com o objetivo de ajudar a base da pirâmide, no entanto, esta questão não é um consenso no campo internacional. “Muitos colaboradores acreditam que apenas levar o acesso a algum serviço, que anteriormente as pessoas não tinham, já é um negócio social”, justifica Kiyama.

Casos como o das Casas Bahia e da Sinaf Seguros são polêmicos, pois uma das características principais do setor “dois e meio” é a inclusão da base da pirâmide ou de grupos desfavorecidos. “O fato das companhias venderem produtos para pessoas mais carentes não as tornam sustentáveis. Várias empresas criam projetos específicos para atuar neste segmento. A Phillips, por exemplo, tem vários programas para este público, mas isto não significa que ela mudou o foco de trabalho”, argumenta o professor Turra.

A procura para entrar no setor é alta. No último processo seletivo de empreendimentos da Artemísia foram recebidas 150 propostas para participar do programa de aceleramento de negócios sociais. A região sudeste representou 60% dos candidatos a uma vaga e apenas 11 projetos foram escolhidos para seguir o cronograma de desenvolvimento da companhia. “Percebemos um crescimento de empreendedorismo em negócios sociais na região nordeste. É um local que a gente olha com bastante atenção. Hoje, dos 11 projetos escolhidos, dois são da região”, pontua Kiyama.

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