Dos R$ 1,972 trilhão gastos anualmente com bens e serviços no Brasil, R$ 1,3 trilhão são decididos por elas (Stock.Xchange)
Da Redação
Publicado em 1 de dezembro de 2011 às 09h28.
Rio de Janeiro - Cada vez mais importantes nas decisões de compra e na movimentação do mercado, as mulheres brasileiras também são mais exigentes em relação aos serviços no varejo. Filas nos supermercados - por que só alguns caixas funcionam? Vendedores que trazem dezenas de produtos que elas não pediram?
Em um mundo ideal feminino, nada disso existiria. Detalhistas, elas desejam mudanças significativas em como são atendidas nos estabelecimentos, o que atualmente está muito aquém do que consideram adequado.
As mulheres hoje são responsáveis, em média, por 66% das decisões de compra nos domicílios brasileiros, segundo um estudo da Sophia Mind. Dos R$ 1,972 trilhão gastos anualmente com bens e serviços no Brasil, R$ 1,3 trilhão são decididos por elas, valor que transforma o país em um dos maiores mercados femininos do mundo.
O poder de consumo das mulheres é uma realidade, mas as empresas estão sabendo satisfazê-las? A Shopper Experience buscou esta resposta - e o que as companhias devem fazer - em uma pesquisa qualitativa, por meio de um focus group composto por paulistanas das classes A e B, com idades entre 25 anos e 42 anos.
Em uma segunda etapa, foram entrevistadas sete profissionais das empresas Fiat, General Motors, Grupo Fleury, Pão de Açúcar, Mercedes Benz, Porto Seguro e Anhanguera, que geraram insights de como as companhias podem satisfazê-las.
“Percebemos com o estudo que as empresas ainda não estão focando no relacionamento com as mulheres e os principais problemas são o atendimento no varejo e o pós-venda. Muitas companhias se atrelaram a padrões que não têm mais vigência nas demandas das consumidoras”, diz Stella Kochen Susskind (foto), presidente da Shopper Experience e especialista em atendimento ao cliente.
Compras feitas com sentimento
Algumas características naturais das consumidoras femininas as tornam mais exigentes no momento de compra. A insatisfação com produtos e serviços tende a ser maior entre as mulheres, pois também influenciam nas escolhas dos maridos e filhos. Com a internet, elas ganham o costume de propagar efeitos negativos e se preocupam mais com seus direitos de consumidoras.
Outro ponto é o valor sentimental que dão à compra. “Não existe mais isso de entregar qualquer serviço seguindo o pensamento de que as mulheres são consumistas e comprarão de qualquer maneira.
Elas têm um componente sentimental muito mais forte do que os homens, também em relação ao consumo”, diz Stella. “Quando vão pesquisar uma pulseira, por exemplo, demoram mais procurando, avaliam o que as amigas têm e gastam mais tempo na hora da decisão. É uma questão de personalidade”, completa.
As consumidoras também são mais detalhistas no ponto de venda, geralmente criando um ritual maior ao observar as vitrines. A pesquisa constatou que elas desejam amostras com os preços bem visíveis, produtos à vista e separados organizadamente por tamanhos e cores.
Dentro da loja, o ideal seria um ambiente confortável e acolhedor, com decoração moderna e ar condicionado em temperatura amena. Um detalhe que as agradaria seria um provador com tamanho suficiente para acomodar a cliente e uma amiga.
Elas querem exclusividade
Uma das palavras que define o mundo de consumo ideal para as mulheres é a “paparicagem”. As empresas que desejam se manter fiéis ao seu público feminino devem saber agradá-las, principalmente com vendedores que as tratem como se fossem únicas, usando uma linguagem simples.
As mulheres valorizam brindes e acessórios extras nas compras, cadeiras e mesas com revistas femininas, cafezinho e querem até uma quick massage. É claro que nem toda loja deve ter toda essa estrutura, mas pode oferecer o básico, como um tratamento de exclusividade. “O essencial é que a empresa a trate com personalidade, transparência e esteja próxima, sem ser evasiva”, diz Stella.
A pesquisa também mostrou que faltam produtos pensados diretamente para o uso das mulheres. Uma sugestão unânime das entrevistadas aos fabricantes de refrigerantes é criar uma lata que não quebre as unhas.
Entre os itens de beleza, elas dizem priorizar potes que não desperdicem à estética da embalagem. Já no âmbito de serviços, uma reclamação foi a falta de banheiros exclusivamente femininos nos aviões.
Por um atendimento melhor
O principal problema relatado pelas mulheres é a questão do atendimento. Elas exigem personalização e uma atitude premium para todos. O vendedor dos sonhos sabe identificar seu perfil e, principalmente, não pode empurrar produtos e serviços desnecessários. O comportamento desejado é de um orientador-consultor, bem longe da cena antiga do vendedor que desce do estoque com dezenas de caixas de produtos.
“Não adianta mais as empresas apresentarem calçado 44 para pé 32/33. A maioria das companhias ainda entrega tratamento pasteurizado, com funcionários que tratam da mesma maneira uma criança de 12 anos e uma mulher de 40, ou de classes diferentes”, diz Stella. No momento da compra, as mulheres querem ser tratadas como únicas.
Ainda há muito a avançar no quesito de personalização do atendimento no Brasil, mas as entrevistadas citaram algumas marcas que têm sucesso neste ponto. Uma delas é a C&A, pelo auto-serviço assistido e a prontidão em auxiliar.
Entre os bancos, foi citado o Bradesco, que, segundo elas, têm funcionários dedicados, desde o segurança. Em relação aos supermercados e às concessionárias, as consultadas não mencionaram uma empresa de destaque. “É mentira quando todas as companhias dizem que têm o foco no cliente. A realidade é que a maioria ainda pensa no lucro rápido antes de tudo”, comenta Stella.
Supermercados mais inteligentes
Os supermercados são pontos de venda que as mulheres visitam constantemente, talvez por isso elas tenham tantas ideias de mudanças para melhorar seu ambiente.
O estudo revelou os maiores problemas que elas encontram nos estabelecimentos e o pior são as filas quando apenas poucos caixas estão funcionando. Outras questões são a disponibilidade na loja do produto anunciado no folheto e preços iguais na gôndola e no caixa.
Como a ida às compras nos supermercados demanda diversas operações e algum tempo, elas também sonham com um local mais agradável e eficiente. Um desejo é que houvesse um funcionário designado a passar as compras no caixa, enquanto as consumidoras desfrutassem de serviços oferecidos no próprio local, como parque para crianças, café e degustação de produtos e salão de beleza.
Ainda estamos longe desta realidade no Brasil, mas talvez não por muito tempo. Na França, Espanha e Bélgica, o Carrefour já inaugurou alguns hipermercados com o conceito Planet, que traz uma repaginação do local. As lojas (foto) têm workshops, especialistas em cada setor e áreas de lazer.
Mães e filhos
Muitas empresas têm focado no poder de compra da mulher no papel de mãe. Principalmente com o conceito de responsabilidade social de não fazer propaganda para crianças, as marcas redirecionam suas ações para elas. “Houve uma época em que o eixo dos casamentos era o marido. Agora, o filho é o elemento central”, diz Stella.
Ao mesmo tempo, a pesquisa chegou à conclusão de que as mães modernas querem um mundo menos consumista para suas crianças. Como resolver este aparente paradigma? A resposta e o caminho para atrair as consumidoras é a sustentabilidade.
“Uma das maiores preocupações é com a durabilidade do produto. A Mac, por exemplo, faz uma ação em que a cliente que levar seu pote de cosmético vazio à loja ganha um desconto na compra de um novo. É necessário que também haja este tipo de iniciativa para produtos infantis”, diz Stella.
Outro ponto imprescindível é a responsabilidade social. As mulheres estão cada vez mais preocupadas e querem passar este pensamento a seus filhos. Por isso, empresas que oferecerem produtos com alguma parte da renda revertida para instituições de caridade serão priorizadas.
Não rejeitem os homens
Com o foco no poder de compra da mulher nos lares brasileiros, há o risco de tentar atingir este público alvo rejeitando os homens. Uma campanha da Bombril, de março deste ano, por exemplo, foi alvo de críticas em relação a esta atitude.
Em uma série de comerciais de TV e na internet, as apresentadoras e atrizes Marisa Orth, Dani Calabresa e Monica Iozzi, vestidas de terno e gravata, faziam piadas como comparar os homens a cachorros, o que abriu uma discussão.
“É preciso chegar a um equilíbrio. O ideal para as empresas é mostrar o homem e a mulher em funções equivalentes, e não ela como seu apêndice, ou vice e versa. Os dois são parceiros”, argumenta Stella.
É difícil, e até não recomendado hoje em dia, realizar uma comunicação de massa que atinja a todos os públicos. Porém, a rejeição de uma parte dos consumidores, que não é seu alvo, pode acabar afetando negativamente o próprio target para o qual as ações de marketing são realizadas.
Principalmente no caso do homem e da mulher. “Apesar do movimento de independência da mulher, elas querem a valorização do companheiro, não há como rejeitar o homem”, diz Stella.