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A Vale quer ser desejada pelos jovens — e Mariah Carey é parte do plano

Com a COP30 no Brasil como pano de fundo, Leandro Modé, diretor de comunicação da mineradora, detalha estratégia que combina sustentabilidade, cultura e novos pontos de contato com o público

A mineradora Vale aposta em festivais de música como The Town e Amazonia Live para se aproximar das novas gerações e ampliar pontos de contato com o público (Ricardo Teles)

A mineradora Vale aposta em festivais de música como The Town e Amazonia Live para se aproximar das novas gerações e ampliar pontos de contato com o público (Ricardo Teles)

Juliana Pio
Juliana Pio

Editora-assistente de Marketing e Projetos Especiais

Publicado em 17 de setembro de 2025 às 13h34.

Última atualização em 17 de setembro de 2025 às 16h05.

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A Vale estruturou sua estratégia de comunicação para 2025 tendo a COP30, que será realizada no Brasil em novembro, como pano de fundo. A conferência é vista pela mineradora como uma oportunidade para dar visibilidade às operações na Amazônia, região responsável por 60% da produção, e reforçar iniciativas de preservação ambiental e apoio à bioeconomia.

À EXAME, Leandro Modé, diretor de comunicação da companhia, explica que a narrativa envolve a preservação de 800 mil hectares de floresta em parceria com o ICMBio, dos quais 3% são destinados à mineração. A proposta, no entanto, vai além da sustentabilidade: trata-se de aproximar a marca do consumidor final, movimento que o executivo considera essencial para garantir a chamada “licença social para operar”.

Além de ampliar os investimentos em cultura e esporte, por meio do Instituto Cultural Vale e da Fundação Vale, a estratégia inclui a presença em grandes eventos. Recentemente, a mineradora marcou presença pela primeira vez em um festival de música, o The Town, em São Paulo, e agora promove o Amazonia Live, nesta quarta-feira, 17, em Belém. O show, realizado em parceria com a Rock World, terá Mariah Carey e artistas paraenses no palco, com transmissão pela TV. Acompanhe a entrevista.

Em que medida a COP30 no Brasil orienta as escolhas de comunicação da Vale?

No ano passado, começamos a discutir a estratégia de comunicação para 2025 e chegamos a uma conclusão óbvia: a COP30 no Brasil vai atrair enorme atenção para a Amazônia e para o tema da sustentabilidade. A Vale tem uma atuação na região que nenhuma outra empresa brasileira possui. Sessenta por cento da nossa produção está no Pará, em área amazônica protegida. Entendemos que a conferência seria o pano de fundo ideal para contar a nossa história: a preservação de 800 mil hectares de floresta em parceria com o ICMBio (o equivalente a cinco vezes a cidade de São Paulo), o uso de apenas 3% desse território para mineração e o apoio a ações de bioeconomia que reúnem milhares de iniciativas locais. O minério de ferro extraído ali é o de maior teor do mundo, o que simboliza a combinação entre atividade econômica e preservação.

Quais são as principais ações previstas dentro dessa estratégia de comunicação e como o Amazonia Live se insere nesse calendário?

Essa narrativa foi desdobrada em várias frentes: publicidade, redes sociais, press trips e debates sobre a COP30 e sustentabilidade. Também foram lançadas campanhas com nomes como o fotógrafo Bob Wolfensohn e a cantora paraense Gaby Amarantos, destacando iniciativas ligadas à bioeconomia. O ápice será o Amazonia Live, em Belém: um show de Mariah Carey e de artistas paraenses, em um palco em formato de vitória-régia sobre a água, para convidados, com transmissão pela TV. A proposta é sensibilizar a comunidade internacional e, ao mesmo tempo, valorizar a cultura local.

Para incluir a população da região, haverá ainda um show gratuito no estádio Mangueirão, em 20 de setembro, com Ivete Sangalo e artistas paraenses. Os 50 mil ingressos distribuídos para a apresentação se esgotaram em apenas três horas.

Palco em formato de vitória-régia montado em Belém para o Amazonia Live, show que reunirá Mariah Carey e artistas paraenses com transmissão pela TV. Foto: Cau Oliveira | Rock World (Divulgação)

Isso se conecta ao The Town? Foi a primeira vez que a Vale marcou presença em um festival de música?

Quando a Rock World, organizadora do The Town, apresentou a proposta por meio da Artplan (agência de publicidade), a Vale decidiu apoiar. A ideia era aproveitar a realização do festival em São Paulo para levar uma das atrações internacionais também ao Amazonia Live. A parceria permitiu à mineradora vincular sua marca ao Rock in Rio e ao The Town. Montamos um estande no Autódromo de Interlagos, com experiência imersiva que reproduzia a Amazônia em sons, aromas e vegetação. O objetivo era levar esse ambiente ao público urbano e reforçar a narrativa que vem construindo.

Essa foi a primeira participação da Vale em um festival de música. Estamos experimentando novos pontos de contato com as gerações mais jovens, o que é relevante porque a empresa, sendo B2B, não está presente no dia a dia das pessoas. Ainda assim, sempre figuramos entre as marcas mais valiosas do Brasil. Hoje, a Vale é a única marca B2B no top 10 da Brand Finance. Para sustentar essa relevância, buscamos formas de aproximar a marca do público jovem, e os festivais de música cumprem esse papel. A presença no The Town foi um teste para avaliar a receptividade e os resultados, que serão monitorados nas próximas semanas.

O edital de 2 milhões para projetos sociais e ambientais em Belém também faz parte desses investimentos?

Esse edital foi criado como parte de um acordo com a agência Artplan e a Rockworld. A ideia era que, além do Amazônia Live, tivéssemos também uma forma de retribuir e estimular a cultura local de maneira efetiva. Encontramos no edital o caminho para fazer isso, apoiando diretamente iniciativas da região. Portanto, ele se insere dentro do projeto Amazônia Para Sempre e complementa a estratégia do Amazônia Live. É um investimento adicional, que reforça o compromisso de deixar um legado cultural para além do espetáculo musical.

Qual o volume destinado a essas iniciativas?

Não divulgamos valores. Como somos uma empresa de capital aberto, não temos autorização do time de relações com investidores para abrir esse tipo de informação.

Desde o ano passado, a Vale vem aproximando sua comunicação do consumidor final. Quais resultados esse movimento trouxe até agora?

É importante entender por que fazemos esse movimento. Embora a Vale não venda minério para pessoa física, dependemos da opinião pública para garantir licença social, que no nosso caso se traduz em licença real para operar. Se as comunidades se colocam contra, não conseguimos novas autorizações e perdemos legitimidade para dialogar com as autoridades. Por isso, tratamos a marca de forma próxima a uma B2C. Nosso objetivo não é vender produto, mas reforçar a relevância da Vale, mostrando que a mineração é fundamental para o país e para o mundo, inclusive no processo de descarbonização e na transição energética.

Os resultados já aparecem. Este ano entramos no top 3 do LinkedIn Top Companies. Dois anos atrás nem figurávamos entre as 20 primeiras. Os indicadores de marca mostram aumento da familiaridade e queda na rejeição. Nas redes sociais também houve avanço: o Instagram tem quase 500 mil seguidores e cresceu mais de 10% apenas com as ações ligadas ao Amazônia Live; o TikTok já soma cerca de 150 mil seguidores. Grande parte desse engajamento acontece de forma orgânica. O CEO da Vale (Gustavo Pimenta) tornou-se top voice no LinkedIn, e as parcerias com influenciadores têm dado bons resultados.

Nosso dashboard de comunicação, que acompanha marca, reputação, imprensa e redes sociais, mostra evolução consistente. Isso se reflete na atratividade: a Vale está entre as três empresas mais desejadas para trabalhar no Brasil.

O desafio agora é conquistar espaço no imaginário dos jovens em um mercado dominado por empresas de tecnologia. Esse trabalho de comunicação tem ajudado a transformar a Vale em um objeto de desejo profissional e confirma o acerto da estratégia.

Leandro Modé, diretor de comunicação da Vale: “A COP30 é o pano de fundo para contar a nossa história na Amazônia”. Foto: José Palma (Divulgação/Vale)

A Vale ainda lida com processos judiciais de Mariana e Brumadinho e, mais recentemente, com acusação de contaminação de rio no Pará. Como o marketing trabalha diante de um cenário em que novas denúncias ambientais e sociais continuam surgindo?

Pela própria natureza da atividade da Vale, com frequência surgem questionamentos levantados pelo Ministério Público, por prefeituras ou por diferentes órgãos do poder público. A mineração é uma atividade de impacto, e a empresa reconhece esse papel. No caso específico que você mencionou, envolvendo os Xikrin, fomos claros desde o início e divulgamos posicionamento (veja ao fim da reportagem). Temos segurança em afirmar que não houve contaminação. A Vale realiza medições constantes e contrata empresas independentes para verificar os resultados e orientar nossas ações.

Uma empresa que passou pelo que a Vale viveu nos últimos anos, com Brumadinho e Mariana — este último um acidente da Samarco, da qual a Vale é sócia com 50% — aprendeu de forma definitiva que não existe outro caminho senão fazer tudo certo, buscar o melhor e se transformar. Esses episódios deixaram claro que as coisas aqui precisam ser tratadas com a máxima seriedade. Isso não significa que não haja contenciosos eventuais com diferentes entes do poder público, mas temos segurança de que hoje nossas operações, a forma como arrecadamos tributos e conduzimos a atividade são feitas no mais alto nível possível, sempre seguindo padrões de segurança e respeito ao meio ambiente e às comunidades. Esse tipo de questionamento é frequente pela própria natureza da mineração e pelo número de pontos de contato que a Vale tem com a sociedade, mas já faz parte da rotina da empresa.

Mas como é para você, responsável pela comunicação, lidar com essa dualidade?

A estratégia de comunicação da Vale tem como essência levar conhecimento às pessoas. Nossas pesquisas mostram que, quanto mais próximas elas estão da empresa, melhor é a percepção. O Reptrak, plataforma de gestão da experiência do cliente, mede essa diferença: quem já teve contato com alguma atividade cultural apoiada pela Vale avalia a companhia de forma muito mais positiva do que quem não teve. Esse é o ponto central da nossa comunicação: tornar a Vale e suas iniciativas mais conhecidas.

Com frequência ouço comentários como “eu não sabia que a Vale fazia tudo isso” ou “eu não sabia que a Vale operava na Amazônia”. O desafio é reduzir esse desconhecimento. Isso não elimina os contenciosos, que continuarão existindo, mas nos permite mostrar com clareza quem somos e o que fazemos. Hoje não importa apenas o que a empresa entrega, mas também como faz. A sociedade cobra cada vez mais esse “como”. Isso vale para a mineração e para qualquer setor. Não se trata apenas do resultado, mas do processo que leva até ele.

No nosso caso, significa mostrar que a Vale extrai minérios essenciais para setores como o aço, as baterias de carros elétricos e até a infraestrutura energética da inteligência artificial, mas faz isso seguindo padrões de segurança, respeito ao meio ambiente e às comunidades. O objetivo é que, quando surja um questionamento, as pessoas pelo menos nos concedam o benefício da dúvida a partir do conhecimento prévio que já têm sobre a empresa.

Como a Vale divide os investimentos entre mídia e experiências? Quais canais são mais estratégicos para a marca?

A experiência ganhou muito peso. Costumo dizer que ainda sentimos os reflexos da pandemia e da digitalização, mas também é uma tendência de mercado. Hoje, qualquer estratégia de comunicação tem a experiência no centro, e aqui não é diferente. É uma das áreas que mais crescem e mais recebem demanda, seja para eventos internos ou externos.

Um exemplo foi o estande da Vale no Web Summit Rio. Levamos elementos da Amazônia, como aromas, vegetação e até uma experiência digital em que o visitante podia tirar foto ao lado de uma onça do bioparque mantido em Carajás. A ideia era materializar a presença da Vale na região para um público que, em um evento de tecnologia, esperava encontrar Google, Nvidia, Amazon ou bancos, mas não uma mineradora.

Esse tipo de iniciativa aproxima a empresa das pessoas de forma concreta. E faz parte do mesmo movimento que nos levou ao The Town e agora ao Amazonia Live. São experiências que reforçam a narrativa que queremos contar e ajudam a tornar a Vale mais conhecida e presente na vida das pessoas.

Parte das críticas às agendas ligadas à COP aponta risco de greenwashing ou de ações de ocasião. Como você responde a isso?

A resposta é consistência e legitimidade. Tudo o que comunicamos está ancorado naquilo que a Vale é e faz. A empresa opera na Amazônia há 40 anos, preserva 800 mil hectares de floresta e, só nos últimos três ou quatro anos, evitou quase 700 invasões nessas áreas. Apoia 60 mil iniciativas de bioeconomia e gera milhares de empregos diretos e indiretos em Belém e em toda a região. Temos ainda a meta voluntária de preservar 500 mil hectares adicionais até 2030. Já cumprimos 218 mil, e hoje o total preservado chega a 1,1 milhão de hectares, com a previsão de alcançar 1,4 milhão até o fim da década.

Esses não são números soltos, mas evidências, proof points que mostram a prática. Nas redes sociais, recebemos críticas e acusações de greenwashing, mas elas não se sustentam diante de dados concretos. Tudo o que fazemos é cuidadoso e conectado com a realidade local. A trilha sonora das campanhas com Bob Wolfensohn e Gaby Amarantos, por exemplo, foi gravada por artistas paraenses. Não há outra empresa que conheça o Pará e a Amazônia como a Vale, algo reconhecido pelas próprias autoridades locais.

Uma empresa que passou pelo que a Vale passou só fala daquilo que faz e daquilo que é, efetivamente

Só comunicamos o que é verdadeiro. Além disso, a COP não é novidade para nós: participamos de todas as edições recentes, inclusive a 28 e a 29, sempre com delegação própria. No campo da descarbonização, temos resultados concretos: antecipamos metas e, desde o ano passado, 100% da energia usada no Brasil já é renovável. Também fomos a primeira empresa do país a publicar o relatório de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade do ISSB. E contamos com produtos como o briquete de minério de ferro, essencial para descarbonizar a siderurgia. Esses são exemplos de como estamos contribuindo, na prática, para a transição energética. Por isso, não temos receio de críticas de greenwashing. O que comunicamos reflete a realidade da empresa, com consistência, legitimidade e resultados que podem ser comprovados.

O Instituto Cultural Vale investiu cerca de R$ 1,2 bilhão em projetos entre 2020 e 2024. O que esse número representa e como esses recursos têm sido aplicados?

O Instituto Cultural Vale apoia projetos em todo o Brasil com recursos incentivados e atua em duas frentes: cultura, pelo próprio Instituto, e esporte, pela Fundação Vale. Em 2024, foram destinados cerca de R$ 198 milhões à cultura, com 208 projetos apoiados. As iniciativas se concentram principalmente nos estados onde a Vale opera, como Pará, Minas Gerais, Espírito Santo e Maranhão, mas também alcançam outras regiões.

No esporte, a Fundação Vale investiu quase R$ 89 milhões em 93 projetos. Esses valores, apurados no fim de 2024, estão sendo aplicados ao longo de 2025. A empresa é hoje o maior apoiador da cultura e do esporte no Brasil via recursos incentivados, reconhecimento que já lhe rendeu premiações no Congresso Nacional por três ou quatro anos consecutivos.

A lógica é clara: quanto mais próxima a Vale está das comunidades, mais precisa se fazer presente. Como mineradora, a companhia tem impacto direto sobre os territórios onde atua e vê no apoio a projetos culturais e esportivos uma forma de reverter parte desse impacto e fortalecer vínculos locais. Essa tem sido a estratégia consolidada nos últimos anos.

Esses investimentos em cultura e esporte estão vinculados às ações na Amazônia e na COP30? O orçamento da área de comunicação aumentou em relação ao ano passado?

Os investimentos em cultura e esporte não têm relação com as ações na Amazônia e na COP30. São frentes distintas. O projeto que estamos realizando nesse contexto é financiado pelo orçamento de comunicação, enquanto os investimentos em cultura e esporte utilizam recursos de leis de incentivo.

Esse orçamento de comunicação tem se mantido estável e é fechado em dólar. Dependendo da variação cambial, pode oscilar um pouco para cima ou para baixo, mas, em essência, não mudou. O que mudou foi a forma de alocar. No período da reparação, grande parte precisava ser destinada a esse tema. Com a redução dessas obrigações, hoje temos mais flexibilidade para financiar iniciativas como o Amazonia Live.

Não posso abrir valores, mas é evidente que trazer uma artista como Mariah Carey, montar um palco no meio do rio e fechar pacotes de transmissão na TV exige um investimento alto. Esse tipo de ação talvez não fosse possível alguns anos atrás. Agora conseguimos direcionar melhor os recursos, sempre com o pano de fundo de tornar a Vale e suas ações mais conhecidas.


Posicionamento da Vale sobre o Rio Cateté

A Vale nega que haja qualquer relação de suas operações com eventual contaminação do Rio Cateté. Esse assunto já foi amplamente analisado pela Vara Federal de Redenção, no Pará. Estudos conduzidos por peritos judiciais independentes concluíram que as operações da Vale não são a fonte de contaminação do Cateté.

Os documentos são públicos e estão disponíveis para consulta. Além disso, a Vale monitora regularmente as condições da água no entorno dos seus empreendimentos para resguardar as comunidades locais. Por fim, a companhia lembra que há inúmeras atividades de garimpo ilegal na região.

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