'Não tente, em absoluto, fazer tudo ao mesmo tempo e por conta própria' (./Divulgação)
Da Redação
Publicado em 29 de janeiro de 2022 às 07h50.
"Especialista em tudo". Era o que, a certa altura da pré-adolescência, eu dizia querer ser quando crescesse. Não sei ao certo o porquê de ter mudado de ideia em relação à aspiração anterior -- antes eu pretendia ser motorista de caminhão de lixo --, mas o fato é que o ideal do polímata me acompanhou por muitos anos.
Ao longo do tempo, dediquei meu interesse a diversos temas, sobre os quais acabei adquirindo bases bastante razoáveis. Mas, por algum motivo -- do qual eu não fazia a menor ideia --, não conseguia atingir meus próprios critérios de excelência em qualquer das empreitadas.
Enfrentei muita frustração por causa disso.
Mas eis que o tempo é o melhor professor. E foi com ele -- somente ele, pois a arrogância juvenil me impedia de dar ouvidos a qualquer outro tutor que porventura tentasse transmitir a mesma mensagem -- que aprendi, enfim, que minha frustração era fruto de um objetivo irrazoável: quando me dei conta de que a ideia de ser "especialista em tudo" era absurda contraditória, enfim compreendi.
Parece óbvio, não?
Pois bem:
Um dos erros mais comuns nos quais vejo incorrerem pequenos investidores é, justamente, perseguir a mesma ilusão que me acompanhou na primeira fase da vida: o sujeito quer fazer de tudo -- e, obviamente, ser bom (em que ser bom, aqui, é entendido por ganhar dinheiro) em tudo.
A história é sempre a mesma: você pergunta que estratégia o cara emprega e ele diz que faz "de tudo um pouco", e então começa a listar 46 ações (um lote de cada) que carrega em uma carteira "para o longo prazo" -- uma parte é de trades nos quais ele não quis realizar a perda; a outra é um mix de recomendações que, juntas, compõem uma verdadeira salada russa --, setups de análise técnica que emprega para operações de diferentes prazos, um punhado de opções... e por aí vai.
Não há coerência interna nenhuma. É uma profusão de energia para todos os lados, sem foco algum -- que parece dar certo nos momentos de bull market (em que mais ou menos tudo acaba dando certo), mas volta e meia traz o sujeito de volta a uma realidade incômoda.
Esse é um perfil assustadoramente comum. É o sujeito que, inevitavelmente, mais dia menos dia pedirá ajuda porque "está meio perdido" com sua carteira.
Veja bem: eu já fui radical a ponto de advogar que somente estratégia A, B ou C funciona e o resto é bobagem. Muito embora eu continue tendo, cá comigo, minhas convicções sobre quais maneiras de investir produzem melhores resultados, sou obrigado a reconhecer que disso depende muito o perfil do sujeito: talvez o fato de eu ser melhor em A do que em B diga mais sobre mim do que sobre A ou B.
E, francamente, já vi ganharem dinheiro com tudo que você imaginar. A questão é a frequência; o número de investidores de dividendos é, no longo prazo, muito maior do que o de day traders alavancados.
Em tese, você pode ganhar dinheiro fazendo trading de curto prazo. Você pode ganhar dinheiro com análise fundamentalista, micro ou macro. Você pode ser um ás dos derivativos ou um mago da renda fixa.
Mas se convença: se você tentar ser especialista em tudo, muito provavelmente você vai se estrepar. O ornitorrinco parece super versátil, mas na verdade não consegue fazer nada direito.
Cada maneira de olhar o mercado exige aptidões diferentes; não raro personalidades diferentes, e cobra tempo e dedicação para ser dominada. Se, por um lado, já vi casos de sucesso em cada uma das especialidades que listei acima, por outro, jamais soube de alguém que tenha prosperado em todas elas ao mesmo tempo.
Descubra quem você é. Encontre o tipo de estratégia na qual você está disposto(a) a investir tempo e energia para efetivamente dominar, e foque-se nisso. A depender do caso, recorra a fundos para complementar seu portfólio com investimentos em outros ativos ou empregando outras estratégias. Mas não tente, em absoluto, fazer tudo ao mesmo tempo e por conta própria.
A não ser que você também ache razoável querer ser Da Vinci... aí minha melhor sugestão é terapia.
*Ricardo Schweitzer é analista CNPI, consultor CVM e investidor profissional. Escreve quinzenalmente na EXAME Invest.