Bolsa derretendo: com virada na maré do mercado, fundos de ações perdem investidores em 2022 (Germano Lüders/Exame)
Bianca Alvarenga
Publicado em 27 de junho de 2022 às 06h04.
A palavra de ordem para a maioria dos investidores em 2022 é: segurança. Com inflação e juros consumindo o poder de compra, os brasileiros buscam alternativas para, ao menos, proteger o patrimônio do momento da crise. E com a bolsa de valores perdendo cerca de 4% ao ano e a Selic na casa dos 13%, a renda fixa tem sido a escolha mais óbvia do momento.
Além da queda do Ibovespa, outro retrato da dificuldade enfrentada pelos investimentos de renda variável é o desempenho dos fundos de ações. No ano, os ativos da classe perderam mais de R$ 38 bilhões, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Para se ter uma ideia do tamanho do rombo, os fundos de ações perderam R$ 14 bilhões ao longo de todo o ano de 2021, ano em que a bolsa recuou quase 12%.
Embora a classe, como um todo, esteja no seu pior momento desde 2015, alguns gestores conseguiram manter o investidor por perto. A EXAME pediu à consultoria de dados ComDinheiro um levantamento dos fundos de ações que continuam captando recursos em 2022. O recorte levou em conta ativos com mais de 1.000 investidores, para excluir fundos exclusivos, destinados a um ou a um pequeno grupo de investidores.
O levantamento mostrou que apenas 40 fundos seguiam com saldo positivo no dia 9 de junho. Veja abaixo quais são eles:
As captações mais volumosas ficaram, em boa parte, com as gestoras de bancos de varejo. É natural que seja assim, uma vez que a carteira de clientes dessas instituições também é maior, o que abre espaço para a "pesca" de investidores em um mar bem mais amplo. Além disso, fundos de dimâmicas mais simples (como os que replicam o Ibovespa ou os que trabalham com ações de uma única empresa) também aparecem em posições destacadas da lista.
O número um da lista, gerido pelo Banco do Brasil, captou cerca de R$ 270 milhões com a estratégia simples de replicar o Ibovespa.
"Os bancos de varejo trabalham com instrumentos simples de bolsa, como os fundos de ação indexados, apenas para dar ao investidor que conhece pouco o mercado um 'gostinho' de diversificação", pontua Filipe Ferreira, diretor da ComDinheiro e responsável pelo levantamento dos dados.
Outro fundo do BB, com captação de R$ 46 milhões, é o que investe apenas em ações da Vale (VALE3). É a mesma dinâmica de mais um fundo mono-ação da casa, que captou R$ 6 milhões com a estratégia de investimento em Cielo (CIEL3). Também teve saldo positivo o fundo do Itaú que aplica em papeis da Petrobras (PETR3 ; PETR4), com R$ 42 milhões.
Ferreira diz que os fundos mono-ação ainda são uma importante avenida de captação dos bancos, pois acabam chamando a atenção de investidores que são seduzidos apenas pelo rendimento passado.
As três empresas citadas (Vale, Petrobras e Cielo) tiveram uma boa janela de crescimento nos últimos meses. Embora as duas primeiras estejam em um momento desfavorável, em razão da queda dos preços das commodities, a Cielo ainda é a ação de maior valorização em 2022 no Ibovespa.
A questão é o custo de se investir em uma única empresa por meio de um fundo de ação. Os fundos citados cobram taxa de administração entre 0,8% e 1,5%. A maioria das corretoras não cobra taxa de administração para quem aplica diretamente em uma ação.
"Faz sentido pagar um gestor para comprar ações de uma única empresa? Ele pode até montar posições de long e short entre classes diferentes de ações, mas usualmente estamos falando de uma alocação passiva, em que o investidor está pagando taxa de administração para ficar exposto a um papel só", alertou o diretor da ComDinheiro.
Apesar de os bancos abocanharem boa parte das captações dos fundos de ações no ano, gestoras independentes também estão conseguindo conquistar o investidor. No caso da Absolute, cujo fundo ocupa a terceira posição da lista, a estratégia de análise fundamentalista da casa atrai os investidores que veem na crise uma oportunidade de montar posições vendidas e compradas.
"Nosso modelo é o que eu chamo de análise microfundamentalista. Fazemos uma boa avaliação da empresa, dos seus múltiplos e desempenho, e depois usamos o cenário macro para validar a tese. Por exemplo: as projeções do câmbio, que fazem parte do macro, mudam completamente o valuation de um ativo", explicou Christian Faricelli, sócio da Absolute e gestor do fundo de ações da casa.
As principais apostas da casa no último ano foram no setor de commodities, especialmente em celulose e petróleo, estratégia que se mostrou acertada durante o ciclo de alta dos preços. Além disso, a Absolute montou posição vendida em empresas de tecnologia.
"Ganhamos bastante dinheiro fazendo short de empresas com preços assimétricos e com linhas de negócios que precificavam um futuro muito mais favorável do que o que teremos", disse Faricell.
No segundo semestre, a gestora está se preparando para um cenário mais defensivo. O sócio da Absolute lembrou que os próximos três anos não serão nada parecidos com a última década, quando as bolsas se beneficiaram de uma liquidez global abundante.
Por outro lado, ele acredita que as cotações atuais já refletem a precificação de um cenário ruim, e que a queda generalizada de ativos já abriu oportunidades para comprar algumas empresas por preços atrativos.
"As principais apostas da carteira são empresas de petróleo e energia elétrica. Energia é um setor que repassa a inflação, por isso sobrevive melhor a crises. Também temos alguma exposição aos bancos, mas sabemos que a piora da economia pode pressionar a inadimplência. Por fim, começamos a olhar para o setor de saúde, que caiu bastante e tem potencial de retomada no longo prazo", sintetizou o gestor da Absolute.