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O primeiro passo para a tal prosperidade

Os objetivos de prosperidade são pessoais e dificilmente têm a ver com dinheiro em si mesmo

Sigrid Guimarães: a ideia da riqueza absoluta, de poder ter o que lhe der na veneta a qualquer hora, é muito atraente (Leo Aversa/Alocc/Divulgação)

Sigrid Guimarães: a ideia da riqueza absoluta, de poder ter o que lhe der na veneta a qualquer hora, é muito atraente (Leo Aversa/Alocc/Divulgação)

Sigrid Guimarães
Sigrid Guimarães

CEO da Alocc Gestão Patrimonial

Publicado em 11 de março de 2024 às 11h13.

Por Sigrid Guimarães*

Enquanto os fogos espocavam, a gente olhou para o céu e desejou saúde, amor, paz e prosperidade. Eram desejos sinceros, embora um tanto vagos. Natural, a noite de Réveillon não é lá o melhor momento para grandes esforços de objetividade. Agora, passado o Carnaval, já é tempo de perguntar: qual é mesmo a vida que você deseja?

Como todo mundo, tenho ideias sobre saúde, amor e paz, mas não creio que importem ao leitor. O assunto que me cabe é a tal prosperidade, que, curiosamente, permeia tudo mais. - Não é que dinheiro compre qualquer coisa, até amor verdadeiro. É que tudo, até amor verdadeiro, tem implicações financeiras, e, por isso mesmo, definir objetivos não é simples nem automático. Dá trabalho, mental e emocional.

O cérebro, que tem por hábito poupar energia, fabrica armadilhas para nos desviar da tarefa. Duas das mais bem sucedidas são: o mito da riqueza absoluta, indeterminada e ilimitada, e as metas financeiras arbitrárias, como um milhão de Dólares ou de Reais (por que não de Euros ou Ienes?).

Por mais que se saiba que ela não existe, a ideia da riqueza absoluta, de poder ter o que lhe der na veneta a qualquer hora, é muito atraente, exatamente, porque nos desobriga de objetivar nossos desejos. No entanto, perseguir essa fantasia é contratar a frustração e, ainda pior, pode nos empurrar a correr riscos desmedidos em busca de rendimentos inalcançáveis. Simular objetividade estabelecendo um milhão de qualquer coisa como meta a priori, sem considerar suas próprias condições e expectativas, é só outro modo de continuar evitando o esforço de análise. - É, a propósito, essa dificuldade o que, em boa parte, explica o sucesso dos multi-family offices, que, sendo competentes, partem da compreensão dos vários aspectos intrincados na gestão dos patrimônios, assumem a espinhosa tarefa de traduzi-los em termos financeiros e oferecem parâmetros para que o cliente objetive os seus desejos.

Os objetivos de prosperidade são pessoais e dificilmente têm a ver com dinheiro em si mesmo. São mudanças profissionais, geográficas e familiares traduzidas em anos sabáticos e aposentadorias, programas de estudo, cuidados de saúde, segurança de moradia, e sonhos de prazer que vão de cavalos a bibliotecas, de iates a obras sociais, de uma casinha na praia a uma bela residência na Avenue Montaigne... e mais. O caso é que tudo depende de disponibilidade financeira e do equacionamento de dezenas de variáveis; algumas padronizáveis, como idade, situação civil e profissional, número e faixa etária de filhos; e outras singularíssimas, como acordos formais e informais com cônjuge, ex-cônjuge(s), pais, filhos e agregados, condições de saúde, valores, exigências e gostos pessoais.

Sejam quais forem os objetivos, a única coisa consequente a fazer é olhar para a sua vida, dominar todos os aspectos da situação atual, projetar o futuro que gostaria e, então, planejar; ou seja, identificar as exigências financeiras das mudanças que quer construir, encontrar as fontes de recursos para sustentar os custos e, enfim, ponderar as prioridades.

Nem é preciso fazer contas para saber que, por princípio, qualquer gasto reduz os recursos disponíveis. No primeiro momento, a perda equivale ao valor despendido, mas, quando se consideram os rendimentos alcançados caso aquela soma estivesse investida, o desperdício se expande geometricamente no correr do tempo. Por outro lado, é obvio também que as pessoas precisam viver, e viver tem custos.

A missão do planejamento é, justamente, negociar entre a satisfação das demandas de hoje e os objetivos futuros, de modo que as receitas sejam maiores do que as despesas e viabilizar o crescimento patrimonial necessário, no melhor ritmo possível, sem impor sacrifícios excessivos ao presente.

Em tese, desde que se poupe o suficiente, tanto faz se é a receita que aumenta ou a despesa que diminui. Claro, o aumento de receita parece uma saída bem mais simpática, mas tem limites. Depende da demanda, da elevação de salários e preços, contidos por empregadores e clientes ou implicam em investimentos mais rentáveis do que a média impõe e com maiores riscos. Além do mais, mesmo que se obtenham ganhos expressivos, eles só se converterão em crescimento patrimonial se as despesas estiverem sob controle.

Por isso, não há como evitar a redução ou, na melhor hipótese, a contenção dos gastos. Incomoda sim, tira da chamada “zona de conforto”, mas não é para desesperar. Frequentemente, o exame das contas permite eliminar ralos de desperdício sem obrigar a grande sacrifício. Não é raro encontrar produtos financeiros inadequados a suas necessidades, como seguros que não correspondem a seus riscos e consórcios ineficientes para seus objetivos. Evitar a ilusão de classificar veículos de luxo e imóveis ociosos como investimentos pode fazer ver que, de fato, eles só dão despesa e atrasam a sua caminhada. E, em última análise, mesmo quando o processo inflija algum desconforto momentâneo, há um grande e duradouro prazer em controlar o leme da sua vida financeira.

Por fim, lembre: a prosperidade é um alvo móvel. As circunstâncias mudam, você muda, e suas necessidades e objetivos, também. É preciso revisitá-los de tempos em tempos e convém contar com alguma margem de manobra para ir mais longe.

*Sigrid Guimarães é sócia e CEO da Alocc Gestão Patrimonial

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