Invest

Setor imobiliário desbanca mineração e frigoríficos e ganha R$ 21 bi em valor de mercado

Número é relativo a 2023 e foi resultado de uma pesquisa exclusiva da Economática à EXAME Invest

Mercado imobiliário: empresas do setor cresceram em valor de mercado em 2023 (Leandro Fonseca/Exame)

Mercado imobiliário: empresas do setor cresceram em valor de mercado em 2023 (Leandro Fonseca/Exame)

Rebecca Crepaldi
Rebecca Crepaldi

Repórter de finanças

Publicado em 27 de setembro de 2023 às 17h31.

Última atualização em 28 de setembro de 2023 às 10h15.

Após dois anos desafiadores, o setor imobiliário brasileiro ganhou fôlego e tem chamado a atenção de investidores em 2023. Incorporadoras e construtoras listadas em bolsa, cresceram, juntas, mais de R$ 21,176 bilhões em valor de mercado neste ano, desbancando outros setores como alimentos (que incluem os frigoríficos) e mineração.

O número foi levantado em um estudo exclusivo da Economática enviado à EXAME Invest, que considerou o período de 31 de dezembro de 2022 até 22 de setembro de 2023, e levou em consideração todas as 37 empresas do segmento imobiliário listadas na B3, entre companhias de construção civil e exploração de imóveis.

Em 31 de dezembro, o setor somava R$ 55,696 bilhões em valor de mercado. Já no fechamento da última sessão, na sexta-feira, 22, o número saltou para R$ 76,872 bilhões, um aumento de R$ 21,176 bilhões, o correspondente a uma valorização de 38,02%.

Não só em valor de mercado, mas em lucro o setor também se destaca. Ao aplicar o recorte do Imob (índice que reúne as 17 empresas do mercado imobiliário listadas na bolsa, com maior liquidez), a pesquisa mostrou que o lucro líquido dessas companhias teve um aumento de 125,98% no primeiro semestre de 2023, frente ao mesmo período do ano anterior. No fechamento da sessão desta terça-feira, 26, o Imob valorizou 26,17% no ano.

Por que o setor imobiliário valorizou?

Queda dos juros

O setor imobiliário, historicamente, tem uma relação inversa com a taxa de juro e sofreu o impacto da Selic, que saltou de 2%, em março de 2021, para 13,75%, em agosto de 2022. Essa elevação, segundo os analistas ouvidos pela reportagem, prejudicaram o setor, visto que ele depende de juros baixos para poder vender seus empreendimentos, por meio de financiamentos, por exemplo.

“Com a elevação das taxas de juro em todo o ano de 2022, ações do setor imobiliário estiveram entre as maiores quedas do período. Já no ano de 2023, a expectativa de quedas mais acentuadas nos juros, mesmo com alguma volatilidade, melhorou a visão do mercado sobre essas empresas. Sendo assim, boa parte das altas deste ano foram uma correção das fortes quedas observadas em 2022”, diz Carlos André Marinho Vieira, analista-chefe do TC/Economática.

A expectativa do início do ciclo de corte da Selic já era vista desde janeiro. Como aponta Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, a curva de juros ou seja, os vencimentos mais longos do começo do ano até o momento apresentou uma queda relevante. “[A queda na curva de juros] barateia o financiamento e é mais promissor para essas empresas do setor de construção”, comenta.

Em agosto, as previsões se concretizaram. No dia 2, o Comitê de Política Monetária (Copom) cortou em 0,50 p.p. (pontos percentuais) a Selic e, nesta última quarta-feira, 20, reduziu novamente em mais 0,50 p.p., levando a taxa básica de juro para 12,75%.

O impulsionador para os cortes foram, principalmente, os avanços políticos-monetários no Congresso, como o arcabouço fiscal e a reforma tributária, é o que explica Caio Nabuco de Araújo, analista da Empiricus Research. “A partir de março, quando a gente teve o princípio do ajuste fiscal, com uma tendência mais favorável para o ambiente macro, nós observamos uma valorização significativa dos ativos imobiliários”, afirma.

Programa ‘Minha Casa Minha Vida’

Alex Carvalho, analista CNPI da CM Capital, relembra que, nos anos anteriores, o setor imobiliário não recebeu tanta atenção do governo. Contudo, em 2023, o cenário mudou. “Incentivos como o novo programa ‘Minha casa Minha Vida' impulsionaram o mercado imobiliário, principalmente as companhias focadas em imóveis de baixa renda”, destaca.

Dentre as novidades, o governo aumentou a renda mensal das famílias que podem se encaixar no programa, o que, consequentemente, aumenta a base de consumidores potenciais. Além disso, também houve um aumento de valor máximo que o imóvel pode custar.

Agora, famílias que residem em áreas urbanas podem ter renda mensal de até R$ 8 mil, enquanto famílias de áreas rurais podem ter renda anual de até R$ 96 mil. Em relação ao valor do imóvel, para famílias da faixa 1 (com renda até R$ 2,64 mil) e famílias da faixa 2 (com renda até R$ 4,4 mil), o limite ficou entre R$ 190 mil e R$ 264 mil, dependendo da localidade.

“As medidas aumentam a oferta potencial das empresas que, às vezes, nem vislumbravam participar do programa. Como elas já tinham imóveis sendo levantados, ajustaram o percentual para se encaixar como ‘Minha Casa Minha Vida’. É benéfico, então, tanto da oferta quanto da demanda”, destaca Cruz.

Redução dos custos dos insumos

A redução dos custos dos insumos, de acordo com os especialistas, também foi outro fator que contribuiu para a alta do setor imobiliário neste ano. Como 2021 e 2022 foram marcados por preços de construção elevados, as margens das empresas, consequentemente, foram pressionadas. Já em 2023, o mercado apresenta preços mais em conta.

Os analistas também citam a revisão do plano diretor, que impulsiona a demanda, especialmente em São Paulo, além dos bons resultados demonstrados em todo o setor, que animaram os investidores e trouxeram uma performance acima da média para o segmento ao longo do ano.

Setor imobiliário à frente de setores destaques

O estudo da Economática levou em consideração empresas com ações negociadas na B3, ativas e com valor de mercado em 31 de dezembro de 2022. Ao todo, foi levantado o valor de mercado de 341 empresas, divididas em 40 setores. Destes, apenas 21 ganharam valor de mercado em 2023. O setor imobiliário, por sua vez, está em quarto lugar, perdendo somente para empresas do setor de petróleo e gás, intermediários financeiros e transporte.

O estudo chama a atenção por mostrar que, em valor de mercado, o setor imobiliário se sobressaiu a setores que normalmente são destaques para o mercado, como o de alimentação, que engloba os frigoríficos como JBS (JBSS3) e Marfrig (MRFG3), e mineração, que inclui a Vale (VALE3).

Para noções de comparação, o setor de mineração, que é composto de cinco empresas, registrava R$ 440,986 bilhões em valor de mercado em 31 de dezembro de 2022. Em 22 de setembro de 2023, esse valor foi para R$ 334,758 bilhões, uma queda de R$ 106,228 bilhões, o que corresponde a uma desvalorização de 24,09%, a colocando como o setor na bolsa que mais perdeu valor de mercado no período.

Já o setor de alimentos, que engloba 11 empresas, em 31 de dezembro de 2022, valia R$ 98,113 bilhões. No último dia do estudo, esse valor caiu para R$ 97,975, uma perda de R$ 137,776 milhões, ou seja, 0,14%.

“A agromineração, por exemplo, acabou caindo justamente porque, no ano passado, tivemos um pico nos preços de commodities internacionais após a guerra na Ucrânia, que foi se dissipando ao longo de 2022 e neste ano também. Ano que vem vai continuar em queda, com a tendência de economias mundiais crescendo menos e os preços de commodities caindo”, explica Cruz, da RB Investimentos.

Carvalho, da CM Capital, destaca a dependência do Brasil em relação à China, que é o maior comprador de minério de ferro, além de se destacar na aquisição de grãos e carne bovina. Como o país asiático não apresentou o crescimento esperado, os ganhos de companhias que exportam para o país recuaram. Além de tudo, a China vivencia um cenário imobiliário desafiador, com grandes incorporadoras em recuperação judicial.

Já Vieira, do TC, ressalta a forte queda do dólar, o que significa menores receitas de exportadores, sobretudo empresas de mineração, do agronegócio e de alimentação, como os frigoríficos. No dia 31 de julho, a divisa americana fechou a sessão em R$ 4,72, a menor cotação desde 20 de abril de 2022, quando fechou em R$ 4,61.

Quais são as queridinhas dentro do setor?

Para a Empiricus Research, a casa está bem posicionada em Cyrela (CYRE3). Apesar de ter registrado uma alta acumulada de aproximadamente 62% em 2023, o analista Araújo ainda vê espaço para subir, já que a companhia tem demonstrado resultados acima da média dos pares.

“Cyrela também tem um volume de lançamentos muito interessante, com projetos específicos que levam a marca dela, e uma diversificação entre negócios que, na nossa visão, é bem construtiva para a operação. Nós acreditamos que seja um momento atrativo, dado esse contexto de queda de juros, aliado a melhorias operacionais. [Para nós], Cyrela é o maior nome entre as companhias de média e alta renda”, pontua.

Em relatório recente, o Santander enfatizou o papel CYRE3 como o queridinho entre as incorporadoras de média e alta renda. Por conta disso, elevaram o preço-alvo de R$ 22,50 para R$ 28 para 2024, o que representa um upside aproximado de 40% em relação à cotação das 11h desta quarta-feira, 27, de R$ 22,05.

“Reiteramos nossa classificação outperform da Cyrela, baseada em sua impressionante execução impulsionada pelo lançamento de projetos icônicos com níveis de acessibilidade decentes; o sólido impulso de lucros; a expansão potencialmente consistente do ROE nos próximos anos; e o balanço robusto, com dívida líquida/capital próprio em 2023 de 9%”, informa o relatório, que ainda enfatiza que a Cyrela está descontada.

Já para a RB Investimentos, a top pick do setor, também pensando em alta renda, é Eztec (EZTC3). Já na faixa de menor renda é Plano & Plano (PLPL3). “A gente entende que a Eztec tem executado positivamente em regiões da grande São Paulo, conseguindo ir para bairros que, às vezes, não parecem tão óbvios - e vender muito bem”, comenta Cruz.

Ainda segundo o analista da RB, a Plano & Plano tem apresentado um crescimento consistente, de forma ordenada e com o endividamento controlado. À EXAME Invest, Carvalho, da CM Capital, também destacou a companhia como top pick.

“Na nossa visão, resultados trimestrais sólidos e acima do esperado, e expectativa de bom desempenho para o 3T23, são fatores que podem impulsionar o papel de Plano & Plano, que ainda é considerado com preço descontado”, comenta Carvalho, acrescentando que a casa tem preço-alvo de R$ 13,30, um upside de mais de 53% em relação ao preço do fechamento desta quarta-feira, 27, de R$ 8,82.

Acompanhe tudo sobre:Fundos de investimento

Mais de Invest

Qual a diferença entre herdeiros necessários e testamentários?

Mercado pressiona Fed por novo corte de 50 na próxima reunião

Quais são os documentos necessários para fazer um inventário extrajudicial?

Petrobras bate recorde de investidores, mesmo com queda de CPFs na B3