Minhas Finanças

Surge um mercado bilionário

Esta é a melhor fase do setor de seguros no Brasil. As companhias se preparam para dar um salto garantindo obras gigantescas, como as da Copa e do PAC, e atraindo milhões de brasileiros que nunca tiveram seguro

Campo de Tupi, da Petrobras: os projetos do pré-sal não saem do papel sem seguro (.)

Campo de Tupi, da Petrobras: os projetos do pré-sal não saem do papel sem seguro (.)

DR

Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h48.

A usina hidrelétrica Santo Antônio, em construção em Rondônia, tem hoje o maior seguro do país. Somados todos os riscos do projeto, que prevê investimentos de 14 bilhões de reais até 2012, a apólice custou cerca de 180 milhões de reais às empresas envolvidas na obra - entre elas a construtora Norberto Odebrecht e a estatal de energia Furnas. Em pouco tempo, porém, é provável que a hidrelétrica do rio Madeira perca a primeira posição no ranking. No pacote de obras ligadas à Copa do Mundo, à Olimpíada, ao PAC e à exploração da camada do pré-sal, já existem quatro projetos maiores do que o de Santo Antônio - os de duas refinarias, o da usina Belo Monte e o do trem-bala Rio-São Paulo - e a expectativa é de novos anúncios gigantescos daqui para a frente. Ao todo, estimativas conservadoras indicam que haverá investimentos de 300 bilhões de reais em infraestrutura no Brasil nos próximos seis anos. "Jamais vimos tanta coisa para acontecer em tão pouco tempo no país", diz Antonio Trindade, diretor de produtos empresariais da seguradora Itaú Unibanco, que lidera o segmento de apólices para grandes obras.
  
Espera-se que os novos projetos gerem uma receita extra de cerca de 8 bilhões de reais em seis anos para as seguradoras - o que faria o segmento das apólices para empresas quase triplicar de tamanho. Nenhuma construção do porte de uma fábrica, uma ferrovia ou um estádio de futebol sai do papel se não estiver amparada por uma série de seguros. São apólices que indenizam empreiteiras, bancos, governo e pessoas caso haja problemas nas obras - como atrasos, acidentes, desastres ambientais e processos contra executivos. Um exemplo de como isso funciona ocorreu em 2007, em São Paulo, quando um canteiro de obras da Linha 4 do metrô paulistano desabou. Sete pessoas morreram, moradores de casas próximas foram desalojados, carros foram danificados, a construção atrasou e estima-se que o Unibanco, que tinha o seguro do projeto, tenha pago cerca de 40 milhões de reais em indenizações.

Os estrangeiros investem

O fato é que o setor vive hoje a melhor fase de sua história no país. Em 2008, enquanto o mercado mundial de seguros sofreu queda de 3% em termos reais, o brasileiro cresceu 7%. Neste ano, estima-se que o crescimento por aqui chegue a 10%. Uma pesquisa exclusiva da consultoria Accenture feita com 104 seguradoras em 16 países mostra que 62% delas planejam crescer fora de seus mercados-sede - e que os países do Bric estão no topo da lista de prioridades. "Os executivos dessas seguradoras sabem que as chances reais de crescimento estão fora dos países desenvolvidos", diz Silas Devai, responsável pela área de finanças da Accenture. É provável que isso explique a recente agressividade das seguradoras estrangeiras no Brasil. A americana Liberty contratou nove executivos no país e no exterior para montar uma divisão de apólices empresariais. A japonesa Tokio Marine tem quase 700 milhões de reais para aplicar na operação brasileira. A alemã Allianz, uma das líderes do mundo, colocou como meta dobrar a carteira de seguros para grandes obras - comenta-se que a empresa estaria estudando uma parceria com o Itaú Unibanco, que encerrou recentemente um acordo com a XL Capital (as companhias negam).


Embora envolvam somas brutais, não são apenas as obras de infraestrutura que devem movimentar o mercado nos próximos anos. Espera-se um salto no ramo de pessoas físicas -- que ainda compram poucos seguros no Brasil. Uma pesquisa do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas mostra que menos da metade dos consumidores das classes A e B, que têm renda familiar superior a 4 800 reais por mês, possui seguro. A presença é ainda menor na baixa renda - na classe C, só 16% das famílias têm alguma apólice; na classe D, o percentual é de apenas 4%. "Vender para esse público é uma de nossas prioridades, é um ramo que deve estar entre os de maior crescimento nos próximos anos", diz Marco Antônio Rossi, presidente da Bradesco Seguros. De forma geral, as seguradoras descobriram o potencial da baixa renda bem depois dos bancos - as apólices populares, como os seguros de vida que custam 5 reais por mês, só começaram a ser vendidas em larga escala nos últimos três anos. Hoje, esse é um mercado que cresce cerca de 50% ao ano e vem atraindo cada vez mais investimentos.

A pesquisa da FGV também mostrou que o seguro mais contratado por consumidores de todas as faixas de renda é o de saúde - representa mais da metade dos gastos com seguros das famílias entrevistadas. Hoje, esse setor está na mira de fundos de private equity. Em setembro, a Tempo, holding controlada pela GP Investimentos, comprou a seguradora de saúde do Unibanco por 55 milhões de reais - fora outros 45 milhões de reais que podem ser pagos em até 12 meses de acordo com o desempenho da empresa. "Esse é um setor pouco afetado por crises, porque a demanda por planos de saúde é gigantesca no Brasil", diz Luiz Eugenio Figueiredo, sócio da gestora Rio Bravo e presidente da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital. A Rio Bravo investiu na Exopro, empresa de implantes odontológicos, e tem outras empresas do setor sendo avaliadas, segundo Figueiredo. Espera-se que o setor de seguros de saúde passe por um processo de consolidação semelhante ao que ocorreu nos últimos anos nos demais ramos do mercado, como o de automóveis - atualmente, há mais de 1 000 operadoras de planos de saúde no país. Em novembro, já houve um movimento nessa direção: a Amil comprou a Medial por 612 milhões de reais. "É possível que muitas não tenham capital suficiente para continuar e nós procuramos oportunidades de compra", diz Patrick de Larragoiti, presidente da SulAmérica, uma das líderes do setor.

O fato é que o mercado está se concentrando, até por razões macroeconômicas. Parte das receitas das seguradoras vem da aplicação financeira dos recursos reservados para pagar indenizações. Com a queda dos juros no Brasil, o retorno desses investimentos diminuiu, e isso aumentou a pressão sobre os executivos para gerar resultados operacionais. "Ter escala é fundamental agora, porque ajuda a reduzir custos", diz José Rubens Alonso, sócio da consultoria KPMG. Isso explica o movimento de consolidação que ocorreu de 2004 para cá, quando a participação das cinco maiores seguradoras nas receitas totais do setor aumentou de 47% para 60% - hoje, as cinco primeiras do ranking são Bradesco, Itaú Unibanco, SulAmérica, Porto Seguro e Banco do Brasil. Nos últimos meses, seguradoras locais, como Marítima, Mongeral, Indiana e Minas Brasil, foram compradas por estrangeiros. Banqueiros de investimento dizem que as sondagens entre empresas para fusões, aquisições ou parcerias nunca foram tão frequentes. "Faço todo ano um mapa do mercado brasileiro de seguros para a matriz, com um relatório das 20 maiores companhias, indicando qual poderia agregar valor a nosso negócio", diz Max Thiermann, presidente no Brasil da Allianz. "Mas a decisão é tomada lá fora. O que está claro para a matriz é que o potencial aqui é enorme."


O otimismo atrapalha?

Hoje, a penetração dos seguros na economia brasileira é baixíssima. O setor representa 3% do PIB, um dos menores percentuais entre os países emergentes. No passado, o que brecou o desenvolvimento dos seguros foi a mão pesada do governo. Uma estatal, o IRB, deteve até 2008 o monopólio da engrenagem que faz esse setor funcionar, o resseguro -- que, de forma simplificada, é o seguro do seguro. Quando uma seguradora faz uma apólice em que o risco de perda é alto demais (o que inclui praticamente todas as grandes obras), ela repassa parte do contrato para uma resseguradora. Nos tempos de monopólio, só o IRB podia trabalhar com resseguros - e sua capacidade era limitada. "Numa obra de 10 bilhões de reais, conseguíamos segurar 2 bilhões", diz Marcos Lima, diretor da Odebrecht Corretora de Seguros, que administra as apólices do grupo. O setor, agora, está numa fase de adaptação - por enquanto, o IRB ainda faz 80% das apólices. Espera-se que, aos poucos, o setor privado assuma o papel que foi do governo. "Entramos no mundo real depois de décadas de mercado fechado. Ainda vivemos a transição", diz Octávio Luiz Bromatti, diretor de riscos industriais da Mapfre.

Apesar de a expectativa de crescimento nunca ter sido tão alta, ainda há obstáculos para que os seguros se tornem realmente populares. "O brasileiro, em geral, é um otimista e isso pode fazer com que ele ache que não precisa de seguro", diz Marcelo Neri, economista da FGV. Neri estuda o setor de seguros e coordenou um levantamento sobre as perspectivas dos jovens em relação ao futuro, comparando seus resultados com os de 131 países. Embora tenham uma visão apenas parcialmente favorável do presente, os brasileiros são os que esperam um futuro mais róseo. Há, além disso, uma barreira cultural - a maioria dos brasileiros nunca fez um seguro na vida. A julgar pelo apetite das seguradoras, a aposta é que, em pouco tempo, essa cultura de certo descaso com o futuro vá mudar.
 


A corrida para o Nordeste e o Centro-Oeste

Em meados desta década, quando começaram a operar em mercados fora do eixo Rio-São Paulo, as grandes incorporadoras de imóveis descobriram que todo apartamento em Porto Alegre precisa ter uma churrasqueira e que a orientação solar em Salvador é determinante para o sucesso de qualquer obra. Hoje, quem passa por um processo de aprendizagem semelhante são as seguradoras. A carioca SulAmérica, terceira maior do país, descobriu recentemente que a cobertura de vendavais para os seguros residenciais, item comum nas apólices vendidas no Sul e no Sudeste, não faz o menor sentido em Goiânia simplesmente porque não há histórico desse tipo de fenômeno na região. Enquanto em São Paulo e no Rio de Janeiro o papel do corretor é cada dia menor, nos mercados menos maduros ele é fundamental. Nesses lugares, quando há um acidente, é comum o segurado ligar primeiro para o corretor - geralmente, um conhecido.

Motivadas pelo aumento da renda da população e pelo crescimento econômico, hoje todas as grandes seguradoras estão empenhadas na corrida para o Centro-Oeste e o Nordeste. "Precisamos aumentar nossa presença em todo o país para aproveitar o enriquecimento das novas fronteiras agrícolas e o crescimento regional", diz Fernando Pereira, vice-presidente executivo da Aon, que tem 50% de seu faturamento na matriz, em São Paulo. Atraída pelas oportunidades criadas pelo porto de Suape, na costa de Pernambuco, e pelo desenvolvimento do sertão nordestino, a Allianz já tem clientes de seguro agrícola no interior do Maranhão, no sul do Piauí e no interior da Bahia.

Fortaleza é uma das cidades que já entraram no mapa de todas as grandes seguradoras. O motivo? O Ceará tem atualmente uma das economias mais dinâmicas do Nordeste. Para 2010, a previsão é que seu mercado de seguros cresça 30% - o dobro da média nacional. O primeiro centro automotivo da SulAmérica no Nordeste foi aberto em Fortaleza no ano passado. "Decidimos começar com o seguro de automóveis porque geralmente é o primeiro que as famílias fazem", diz Marcus Martins, vice-presidente de vendas da SulAmérica, que em razão da expansão regional passa um terço do ano em viagens. A Porto Seguro, uma das principais seguradoras de automóveis do país, montou no Nordeste uma estrutura de atendimento com guinchos e motos de socorro.

Embora o estado de São Paulo represente cerca de 35% do PIB brasileiro, a maior parte das grandes seguradoras sempre teve pelo menos metade de seus negócios na região, que historicamente concentrou a população afluente do país. Com o aumento da competição no mercado paulista e com o desenvolvimento de outras regiões do país, o alvo das seguradoras foi ampliado. Hoje, a opção de ficar restrito ao Sudeste parece ter sido descartada. "Nos mercados maduros, os produtos viram commodities e a disputa acaba virando uma guerra de preços", diz Rodolfo Nóbrega, vice-presidente da agência de rating Moody's e especialista na área de seguros.
 


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