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'Segredo da rentabilidade é liquidez, e não risco', diz gestor da Valora

Para Daniel Pegorini, CEO da gestora Valora, a recomendação para investir pensando no longo prazo não deve servir somente para as ações, mas também para a renda fixa

Daniel Pegorini, CEO da gestora Valora: "O principal ponto para ter melhor rentabilidade não é o risco, e sim a liquidez". (Divulgação/Divulgação)

Daniel Pegorini, CEO da gestora Valora: "O principal ponto para ter melhor rentabilidade não é o risco, e sim a liquidez". (Divulgação/Divulgação)

BA

Bianca Alvarenga

Publicado em 19 de janeiro de 2021 às 07h33.

Última atualização em 19 de janeiro de 2021 às 12h12.

Tem sido parte do manual do investidor a recomendação de aumentar o risco da carteira para buscar um rendimento melhor. Mas para Daniel Pegorini, CEO da gestora Valora, o risco não é determinante para quem quer fugir do retorno pífio do CDI, que tem perdido inclusive para a inflação. O investidor deve se habituar a uma liquidez menor.

"A todo tempo o investidor é orientado a comprar ações pensando no longo prazo. Por que para a renda fixa a palavra de ordem é liquidez?", questiona Pegorini. Ele diz que a disponibilidade imediata dos recursos é importante para a composição de reserva de emergência, mas que o restante do patrimônio do investidor deve ser planejado com um prazo de resgate de no mínimo 6 meses. Isso porque, quanto maior o D+ (o número de dias para o resgate a partir da solicitação para fazê-lo), mais flexibilidade têm os gestores e maior o retorno possível para os fundos.

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Veja abaixo a entrevista completa do gestor da Valora para a EXAME Invest:

Como o investidor deve encarar o cenário de juros baixos?

Nos últimos três anos, a Selic caiu de 10% para 2% ao ano e o mercado de crédito amadureceu. O mesmo aconteceu nos Estados Unidos na década de 1980, quando a queda dos juros e da inflação possibilitou o surgimento de títulos high yields. Desde então, o mercado só evoluiu.

Realmente acreditamos que esse tipo de dinâmica veio para ficar também no Brasil. Não vamos voltar a ter juros reais altíssimos, como antes, mas isso não quer dizer que Selic não vá subir. Não somos um país para ter juros de 2% ao ano, mas também não somos o país de juros reais de 8%. Provavelmente vamos voltar para um patamar de Selic de 6% a 8%, mas dentro de uma inflação de 3% a 4%, o que dará um juro real de 3% a 4% ao ano, o que é bastante razoável.

O que isso significará para o segmento de renda fixa?

A Valora é uma gestora especializada em produtos de crédito estruturado. Quando os juros estavam altos, esse era um negócio inexistente. Quem conseguia emitir títulos de crédito eram apenas as blue chips. Quando falo de crédito estruturado estou falando de ativos imobiliários e de infraestrutura, Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) e outras transações com garantia e fluxo de recebíveis.

O Brasil é carente nesse tipo de estrutura -- tanto para o funding quanto para os investimentos. O mercado de crédito estruturado tem crescido em paralelo com os avanços de tecnologia. Todas as operações têm garantias adicionais, e sem um ambiente digital seria impossível controlar tudo isso.

A B3 tem investido em sistemas para digitalizar as operações de renda fixa. Qual sua visão sobre as mudanças?

É muito importante ter telas para a negociação de crédito privado, assim como já temos para a renda variável. Quem precisa fazer a compra ou a venda de ações faz isso diretamente pelo home broker, e o único papel da corretora é liquidar. Na renda fixa é diferente. De certa forma, os investidores acabam ficando reféns da tesouraria das corretoras, porque cabe a elas a intermediação das operações de compra e venda. Obviamente isso significa que parte da rentabilidade fica na mão dos distribuidores.

Qual o risco de aumentar o acesso direto do investidor a esses ativos?

Eu, como gestor de crédito, realmente não acho que o investidor pessoa física deveria comprar diretamente investimentos de todas as naturezas. Acho "ok" ele comprar uma debênture da Vale ou de qualquer empresa blue chip, cujo risco de crédito é classificado como um triple A (a nota mais alta). O problema é que o mundo do crédito é mais complexo -- embora o de ações também esteja ficando assim, em razão dos IPOs.

É razoavelmente difícil para o investidor ficar sabendo de um FIDC de uma empresa média. O ponto é que esse tipo de ativo paga mais taxa para as corretoras, por ser um ativo de maior risco. Ou seja: pode haver um incentivo perverso para a distribuição desse produto. A ânsia de liberar o acesso ao mercado pode colocar os pequenos investidores em fria, em operações que eles não entendem bem o tipo de risco que estão correndo. Nem tudo o que está disponível é um bom ativo de crédito, e muitas vezes o investidor olha só para a taxa da operação. Isso não é suficiente.

Como buscar melhor rentabilidade na renda fixa?

É possível ter um tipo melhor de remuneração no crédito privado. O investidor não precisa abrir mão da qualidade dos ativos para ter um rendimento maior. O principal ponto para ter melhor rentabilidade não é o risco, e sim o prazo. No crédito privado, a condição de resgate de D+0 ou D+1 (no mesmo dia ou no dia seguinte) não existe.

Na Valora temos um fundo com D+15, outro com D+90 e o último com D+180. O primeiro tem 20% de crédito estruturado, o segundo tem 60% e o terceiro tem 80%. É importante dizer que quando falamos em crédito estruturado isso não significa necessariamente mais risco de crédito. Uma debênture de uma empresa afetada pela pandemia pode ter um rating melhor, mas não tem o mesmo fluxo de pagamento de um FDIC de uma empresa do setor de energia. Quando o ativo tem boas garantias, acaba reduzindo muito o risco.

Por que o prazo está ligado à rentabilidade?

Quando o fundo tem um prazo maior prazo de resgate, ele permite que o gestor tenha mais operações estruturadas com um retorno melhor. Não necessariamente serão ativos com um risco maior. Nesse sentido, é importante que o investidor entenda o peso da liquidez na rentabilidade. É comum vermos pessoas sendo ensinadas que o prazo maior de resgate significa maior risco, e isso não é verdade. Um papel de vencimento mais longo não é necessariamente pior.

Por exemplo: no nosso fundo D+15, eu tenho que ter 40% do patrimônio aplicado em ativos com liquidez de até 15 dias. Isso prejudica a rentabilidade. Já no fundo D+180 a necessidade de caixa é menor, porque se o investidor quiser resgatar, eu só vou pagar em 6 meses. Se eu pego uma janela de liquidez ruim no mercado, dá para tentar contornar. Prazos menores de resgate tornam o fundo menos eficiente, porque o gestor precisa ficar alocado em títulos com muita liquidez.

A todo tempo o investidor é orientado a comprar ações pensando no longo prazo. Por que para a renda fixa a palavra de ordem é liquidez? Investimento de resgate imediato em renda fixa é Tesouro Direto e fundo DI para compor reserva de emergência. Para o restante da carteira, o investidor precisa de um planejamento de no mínimo 6 meses.

Espera-se que os juros voltem a subir já em 2021. Como o investidor pode se preparar?

A melhor forma de se proteger é não tentar adivinhar o que vai acontecer com os juros e inflação. O ideal a se fazer é escolher bons ativos. O investidor deve comparar os fundos disponíveis no mercado e ver quais gestores foram melhores nas crises recentes. Nos últimos cinco anos tivemos movimentos importantes: o impeachment (da ex-presidente Dilma Rousseff), o Joesley Day, a greve dos caminhoneiros e, mais recentemente, a pandemia do coronavírus. É muito melhor ele escolher um gestor que lidou bem com esses solavancos do que ficar tentando adivinhar a política monetária.

Quais setores devem ser destaque em 2021 no segmento de crédito privado?

Estamos vendo operações interessantes de empresas de infraestrutura, energia solar e saneamento. Já segmentos como os de construção civil e logística devem crescer, alavancados pela taxa de juros baixa. Outro destaque são as empresas vinculadas à exportação, como as do agronegócio, minério e petróleo. Eu fugiria um pouco dos segmentos industrais, onde tem competição forte, como a siderurgia, por exemplo. Setores financeiros são bons de crédito, mas vão continuar pagando pouco. Por outro lado, eu seria mais cauteloso com setores como o varejo. O fim do auxílio emergencial deve criar um ambiente mais complexo para essas empresas.

Veja também: Taxa Selic: o que é e como ela te afeta?

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