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Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h33.
Mohamed El-Erian, diretor da empresa de gestão de recursos PIMCO, é um entusiasta do Brasil. Os fundos de sua empresa têm mais de 10 bilhões de dólares em títulos da dívida externa brasileira, o que a torna a maior credora do país. O egípcio naturalizado americano El-Erian quer mais: o Brasil, diz ele, está entrando em um círculo virtuoso e seus títulos são os mais atraentes entre os papéis de países emergentes. Por telefone de seu escritório com vista para o Pacífico em Newport Beach, na Califórnia, a 80 quilômetros de Los Angeles, este economista que passou 15 anos no Fundo Monetário Internacional e está prestes a assumir a gestão dos investimentos da Universidade Harvard falou a EXAME:
EXAME Os preços dos papéis brasileiros triplicaram nos últimos meses. O Brasil está caro?
Mohamed El-Erian Não. Ainda há espaço para se ganhar dinheiro. Não será tão fácil como tem sido nos últimos anos, mas ainda há boas oportunidades com os ativos brasileiros. O país hoje está em uma situação muito melhor do que em 2002, pois ergueu uma estrutura de proteção financeira muito sólida contra alguma eventual turbulência internacional. A combinação entre a contínua entrada de dinheiro no mercado de ações, uma sólida oferta de recursos para financiar investimentos e uma crescente tendência das pessoas a olhar com bons olhos as boas notícias no front comercial blinda o Brasil contra os solavancos vindos de fora.
EXAME Como assim? Uma crise internacional não ameaça o Brasil?
El-Erian Sempre ameaça, mas muito menos do que em 2002, por exemplo. O governo aumentou os ativos em moeda forte e reduziu suas dívidas, pagando o Fundo Monetário Internacional e o Clube de Paris.
EXAME Por que isso deixa os investidores mais tranqüilos?
El-Erian Vamos traçar um paralelo com a Califórnia, onde está nossa empresa. Todos sabem que aqui há terremotos e que, mais dia menos dia, a terra vai tremer e poderemos ver nossas casas desabar. Esse é o risco. Se achássemos que haveria terremotos todos os dias, nós mudaríamos daqui. Mas como isso não acontece, nós encaramos o risco de outra maneira. Ele não nos faz mudar da Califórnia para outro estado livre de terremotos, mas nos faz comprar seguros para nos defender das perdas de um terremoto eventual. O caso brasileiro é semelhante. Esses pagamentos brasileiros e o alto nível das reservas em moeda forte funcionam como se o Brasil melhorasse sua apólice de seguros contra crises financeiras. Ou seja, há muito mais capacidade de enfrentar uma eventual turbulência externa. É o melhor a fazer, pois as coisas estão meio incertas nos Estados Unidos.
EXAME Como assim? Que tipo de turbulência pode ocorrer?
El-Erian Há duas ameaças à economia americana. A principal é o fim da bolha imobiliária. Hoje, os americanos usam os imóveis como garantia para tomar dinheiro emprestado. Se os imóveis perderem valor, as pessoas vão poder emprestar menos e terão menos dinheiro para gastar. Isso vai reduzir o ritmo de crescimento em todo o mundo e diminuir também o dinheiro disponível para investir em países emergentes. No entanto, nós consideramos que esse risco é baixo; a chance dessa crise ocorrer é de menos de 20%
EXAME Qual a segunda ameaça?
El-Erian Uma mudança nos fluxos financeiros internacionais, provocada pela alta dos preços do petróleo. Hoje, os grandes compradores de títulos públicos americanos são os bancos centrais de países asiáticos, como China e Japão. Esses países são grandes importadores de petróleo, e estão gastando cada vez mais porque as cotações estão sobrevalorizadas. O dinheiro acumulado está sendo transferido para os países produtores de petróleo do Oriente Médio. Por razões históricas e políticas, eles pode ser menos inclinados a comprar títulos americanos. A conseqüência disso seria uma dificuldade de rolar a dívida americana e a necessidade de apertar a política monetária nos Estados Unidos, o que esfriaria os negócios em todo o mundo. Mas, também nesse caso, a probabilidade é pequena, cerca de 20%
EXAME E quanto às turbulências internas? A eleição presidencial brasileira não assusta o mercado?
El-Erian Não. Hoje os investidores estão convencidos de duas coisas. Uma é a solidez da política econômica. O país cresce, as contas públicas estão equilibradas. Além disso, há uma vantagem em relação a 2002: essa política não está em discussão. Na eleição passada, o mercado temia uma guinada à esquerda, com a adoção de uma política de gastos pelo então candidato Lula. Mas, depois de eleito, ele mostrou ser sensato e prudente, o que não deve mudar. Ou seja, hoje o risco é de uma guinada à direita.
EXAME A situação não é parecida? Hoje, o que mais se discute no Brasil é a necessidade de baixar os juros.
El-Erian Sim, mas discutem-se alguns aspectos da política econômica, não a política econômica em si. Não há nenhum candidato viável que fale em ruptura de contratos. Em termos relativos, o Brasil está desfrutando da maior solidez institucional de toda a sua história. O que vemos no Brasil é o que vimos no México e no Chile: uma compreensão de que não devemos politizar os fundamentos da política econômica.
EXAME E no caso pouco provável da vitória de um candidato populista, não ligado nem ao atual governo nem à oposição?
El-Erian Haveria uma desconfiança inicial, até que esse candidato provasse a que veio. É mais ou menos como o passageiro que entra em um carro dirigido por um motorista que ele não conhece. O carro é o país: algumas de suas características são imutáveis. Já o motorista é o responsável pela condução do veículo, pode ser ou o ministro da Fazenda ou o próprio presidente. Haveria uma turbulência passageira enquanto os investidores não se acostumassem com a pessoa, mas o mercado se acalmaria assim que o recém-chegado mostrasse a que veio.
EXAME Os investidores internacionais estão conscientes disso?
El-Erian Sim, cada vez mais. Há três anos, quando dizíamos que investir no Brasil era bom negócio, as pessoas riam. Como ganhamos dinheiro durante todo esse tempo, elas começam a nos levar a sério (risos).
EXAME O que deixa os investidores otimistas?
El-Erian O fato de que o país mudou de patamar. Sua economia está mais firme e são grandes as chances de o Brasil ser classificado como grau de investimento em dois ou três anos, o que indicaria um risco baixo para os investidores e colocaria trilhões de dólares em fundos à disposição do Brasil, especialmente para o setor real da economia.
EXAME Quem pode ambicionar esses investimentos?
El-Erian Boas empresas. Antes, os investidores só queriam títulos da dívida, que eram fáceis de vender se algo desse errado. Agora, eles analisam a sério colocar dinheiro na economia real, seja investindo na infra-estrutura, seja fazendo alianças estratégicas com companhias brasileiras.